por Prof. Msc. Kelmerson Buck, Doutorando em Fisiologia e Treinamento Desportivo – UNIMEP e treinador da coreesportes.com.br.
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No primeiro artigo desta série, falamos dos benefícios de manter os treinos durante a gravidez. Neste segundo artigo comento os tipos de treinos, intensidades e períodos recomendados para as gestantes continuarem as atividades físicas.
1 Tipos de exercícios
A gestante deve escolher uma atividade que melhor se adapte às suas características e interesses aumentando assim a aderência ao exercício escolhido.
Atividades de alto impacto, com risco de queda ou trauma abdominal e esportes de contato devem ser evitados. Ressalta-se o risco do ciclismo que não seja em bicicleta estacionária.
1.1 Atividades aeróbicas
Citam-se como exemplos: natação, bicicleta estacionária, corrida, ginastica aeróbica de baixo impacto, hidroginástica. Estudos indicam que em gestantes sem complicações clínicas ou obstétricas, o feto saudável é capaz de desenvolver mecanismos compensatórios e não entrar em sofrimento após o exercício, mantendo a homeostase das trocas gasosas sem os efeitos deletérios da hipóxia fetal.
1.2 Trabalho de Força
Através do fortalecimento muscular busca-se melhor adaptação do organismo materno às alterações posturais provenientes da evolução gestacional, auxiliando no tratamento de desconfortos musculoesqueléticos. O fortalecimento deve priorizar a musculatura paravertebral lombar, a cintura escapular e, preferencialmente, envolver grandes grupos musculares. Deve-se preferir, como critério de escolha, utilizar o próprio peso corporal e faixas elásticas no lugar de aparelhos de musculação ou pesos livres. Devem-se também evitar cargas elevadas, exercícios isométricos intensos repetidos e posturas que coloquem a gestante em risco, principalmente aquelas que possam afetar seu equilíbrio.
Uma região importante e por vezes esquecida é o assoalho pélvico, no ciclismo é a região e adjacências que ficam em contato com o selim. Evidências científicas demonstram que o treinamento dos músculos do assoalho pélvico (TMAP) durante a gestação diminui o risco de incontinência urinária no pós-parto. A gestante deve realizar o TMAP com contrações sustentadas, ou seja, contrair e manter durante determinado período, e também com contrações rápidas (contrair e relaxar) em diferentes posturas.
1.3 Alongamento
O alongamento muscular auxiliará na adaptação postural e na prevenção de dores de origem musculoesquelética. Deve ser complementar ao exercício aeróbico e ao treinamento de resistência. Técnicas de alongamento muscular, como o Yoga e o Strecthing Global Ativo, comprovadamente diminuem as queixas de dor pélvica posterior e de dor lombar durante a gestação.
Diante do aumento nos níveis de relaxina e da progesterona durante a gestação, devem-se evitar alongamentos extremos para prevenir lesões ligamentares e articulares.
O ideal é combinar ao longo da semana exercícios aeróbicos, trabalho de força e alongamentos.
1. 2. Intensidade dos exercícios
Os estudos demonstram que exercícios realizados em intensidade leve a moderada não se associam a resultados maternos e fetais adversos. Em termos práticos a intensidade do exercício pode ser medida pela frequência cardíaca máxima (FCM) ou pela sensação subjetiva de esforço (Escala de Borg).
Os parâmetros de frequência cardíaca são controversos na literatura científica, mas ainda assim recomendados por alguns autores. Sugere-se que o exercício seja realizado entre 60 a 80% da FC máxima, sendo que a Sociedade Canadense de Ginecologistas e Obstetras (SCGO) indica as seguintes faixas de treinamentos para gestantes: idade < 20 anos: 140 a 155 batimentos cardíacos por minuto (bpm); 20 – 29 anos: 135 a 150 bpm; 30 – 39 anos: 130 a 145 bpm; >40 anos: 125 a 140 bpm.
Outro critério é a escala de percepção subjetiva de esforço de Borg, que varia de 6 a 20. De maneira geral a intensidade deve ser preferencialmente entre 12 e 14, correspondendo a uma atividade leve a um pouco cansativa, podendo alcançar a pontuação 16 (exercícios cansativos) no 2º trimestre.
Atletas de alto rendimento conseguem manter atividades em intensidade moderada a intensa, sem efeitos adversos, até o segundo trimestre desde que com a precaução da monitoração médica mais frequente.
2. 3. Recomendações por trimestre gestacional
3.1 Primeiro Trimestre
Feita a primeira consulta pré-natal, estabelecida a ausência de risco gestacional e após liberação médica é hora de retomar os treinos; no entanto no primeiro trimestre as alterações hormonais frequentemente causam mal-estar, como náuseas e vômitos, além de sonolência e indisposição, o que pode dificultar a manutenção dos treinamentos. As gestantes fisicamente ativas antes de engravidar podem manter suas atividades inclusive no primeiro trimestre gestacional, porém adaptando sua intensidade e frequência, já para as sedentárias a recomendação atual é iniciá-lo após a 12a semana de gestação.
Os exercícios aeróbicos são recomendados para as que os praticavam antes da gestação, porém com menor intensidade, frequência e duração, os alongamentos podem ser realizados, sem contraindicações. Já os exercícios para o fortalecimento muscular são recomendados, desde que de forma supervisionada.
Recomenda-se preferir sempre exercícios envolvendo grandes grupos musculares, com pouca carga e maior número de repetições, bem como evitar manobra de Valsava durante o treino de resistência muscular. Todas as gestantes, durante toda a gestação devem ser orientadas a realizarem diariamente o treinamento dos músculos do assoalho pélvico afim de minimizarem o risco de incontinência urinária no pós parto, este pode ser realizado através de séries de exercícios de contrações sustentadas e também com contrações rápidas.
3. 3.2 Segundo Trimestre
Geralmente é o melhor período para a prática de exercícios, pois a mulher encontra-se, habitualmente, sem o mal-estar característico do início da gravidez. Mulheres que não praticavam exercício antes da gestação podem iniciar sua prática a partir do segundo trimestre.
A partir de 20 semanas, com o crescimento acelerado do volume uterino, deve-se ter cuidado com a realização de exercícios em posição supina (barriga para cima) por tempo prolongado, a fim de evitar a síndrome da hipotensão supina. Os exercícios aeróbicos continuam recomendados para todas as gestantes, mesmo as que eram sedentárias antes da gestação. Quanto ao alongamento, embora recomendado para esse período, deve levar em conta alguns cuidados a partir da décima semana de gestação, quando ocorre o pico do hormônio relaxina circulante, levando à maior flexibilidade dos tecidos articulares e ligamentares; logo, alongamentos extensos e extremos podem aumentar o risco de lesões dessas estruturas.
Terceiro Trimestre
A gestante naturalmente tende a diminuir a intensidade dos exercícios em função do aumento de peso corporal e outros desconfortos e limitações. No entanto, a prática de exercícios leves deve continuar a ser estimulada. Atividades aeróbicas na água, como natação e hidroginástica, caminhadas e ciclismo estacionário (com adaptação para bicicleta ergométrica horizontal) também são indicados.
4. 4 Precauções e cuidados
Embora não esteja claramente definida a idade gestacional limite para a interrupção da prática de exercícios, deve-se ficar atenta aos sinais e sintomas que indiquem a proximidade e o início do trabalho de parto, bem como os sinais de alerta para interromper a prática:
- Sangramento vaginal
- Dor no abdome ou no peito
- Perda de líquido pela vagina
- Inchaço repentino nas mãos, face ou pés
- Dor de cabeça forte e persistente
- Palpitações
- Tontura
- Redução dos movimentos fetais
- Dor ou sensação de ardência ao urinar
- Febre
- Náuseas ou vômitos persistentes
- Contrações uterinas frequentes
- Sensação de falta de ar
- Torpor ou sensação de luzes piscando
A termo regulação altera-se durante a gestação, aumentando o risco de hipertermia, com possíveis efeitos teratogênicos, devendo-se atentar para a hidratação adequada e permanente, bem como evitar a prática de exercícios em temperaturas altas.
Ainda com relação a temperatura deve-se priorizar o início da manhã e o final da tarde, evitando treinamento ao ar livre quando a umidade do ar estiver muito baixa. Desestimula-se treinar em ambientes fechados e sem ventilação, e, no caso de exercícios aquáticos, como hidroginástica, a temperatura da água não deverá passar de 35ºC.
Diante do aumento do gasto calórico na gravidez e com o exercício, a mulher deve consumir calorias suficientes para garantir uma nutrição adequada.
Importante ressaltar que as observações acima baseiam-se na média da população geral, sendo que a literatura científica aponta para a importância da individualização do plano de treinamento às condições específicas de cada gestante.
Parabéns às mães, sempre avante!
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Prof Msc. Kelmerson Henri Buck – CREF 43042, é Doutorando em Fisiologia e Treinamento Desportivo – UNIMEP e treinador da Core Esportes Assessoria Esportiva – www.coreesportes.com.br
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