Qual é a diferença entre a visão de trabalho das formigas e da cigarra?

Para Dezotti (2003, p. 22), “sempre haverá diferenças quanto ao modo de estruturar o texto ou quanto aos temas e figuras selecionados” em virtude do tempo e dos mais diversos espaços de um povo. Nessa perspectiva, observamos o quanto a fábula clássica A cigarra e as formigas, atribuída a Esopo, passou por várias mãos, geralmente em forma de paródia ou paráfrase, nesse caso, quando são adaptadas ou encaixadas para o público infantil.

A versão esópica, traduzida por Pietro Nassetti (2016), como toda fábula atribuída a Esopo, se organiza em dois parágrafos: no primeiro, está a narrativa e, no segundo, o “epimítio, assim chamado pelos antigos por ser um texto que vem depois da narrativa (mythos)” (DEZOTTI, 2003, p. 23 – destaques da autora). Vejamos a narrativa:

Durante o inverno, as formigas trabalhavam para secar o grão úmido, quando uma cigarra, faminta lhes pediu algo para comer. As formigas lhe perguntaram: “Por que, no verão, não reservaste também o teu alimento?”. E a cigarra respondeu: “Não tinha tempo, pois cantava, alegrando o mundo com minha melodia”. E as formigas, rindo, disseram: “Pois bem, se cantavas no verão, dança agora no inverno”. Moral: Descuidar de certos trabalhos pode trazer tristezas e faltas (NASSETTI, 2016, p. 161 – destaques do autor).

Como é possível observar, na primeira parte da fábula, o autor conta a história, de forma breve, simples e direta, situando “o conflito de duplas antitéticas” (OLIVEIRA, 2011, p. 44), momento em que uma personagem fracassa – a cigarra - e a outra prospera – a formiga. Os conflitos entre as personagens de uma fábula geralmente são visíveis a partir dos diálogos estabelecidos. Essa seria uma lei interna que singulariza a fábula e a diferencia de outras formas narrativas (SANTOS, 2003).

Na segunda parte do texto, observamos o “epimítio”, que, por sua vez, se constitui de dois modos, segundo Dezotti (2003, p. 23-24): “Uma porção que apresenta uma interpretação narrativa” (“Descuidar de certos trabalhos pode trazer tristeza e faltas”). Observamos que o texto interpretativo apresenta o “epimítio”, ou seja, “a moral da fábula” (DEZOTTI, 2003, p. 25). A moral do texto é destacada, pelo autor, em itálico. Santos (2003, p. 46) afirma que na moral da fábula esópica, “o autor desenha com nitidez a sua visão de vida, impondo-a como comportamento a ser seguido ou refutado”

Esse procedimento de dar importância à lição de moral é algo comum aos copistas da Idade Média, os quais escreviam os “epimítios” em destaque “com letras douradas ou vermelhas, enquanto as narrativas eram escritas de preto” (OLIVEIRA, 2011, p. 45). Contudo, nem todas as fábulas esópicas seguem este padrão. Algumas delas se apresentam sem a parte do “epimítio”, sem a moral. Há outras fábulas em que as partes constitutivas podem ser invertidas. Em outras palavras, a moral poderá vir antes da narrativa. “Neste caso, a moral será chamada de “promítio” (OLIVEIRA, 2011, p. 43).

Salientamos que o conceito de moral ao qual nos referimos, nesse momento, está relacionado com a estrutura da fábula esópica e não no seu sentido primeiro, de “morale”, o qual Oliveira (2011, p. 42) conceituou da seguinte maneira: “sistema de normas de conduta que prescrevem como o sujeito deve conduzir-se em determinadas circunstância”. Ainda sobre a moral, a autora assinala que:

Apesar da importância visível da moral, não podemos dizer que seja mais importante do que a narrativa. Ambas – narrativa e moral – são faces da mesma moeda. Na construção dos sentidos do enunciado fabulístico, narrativa e moral se combinam, aliam-se estabelecendo sua função enunciativa que será recuperada consoante uma dada época, um dado contexto sócio-histórico- ideológico, por um leitor também ideologicamente marcado (OLIVEIRA, 2011, p. 46).

Em linhas gerais, destacamos que o narrador da referida fábula não se prende em descrições, ao contrário, narra uma ação em tempo e espaço únicos, reforçando o conceito de retenção da fábula canônica apontado por Santos (2003, p. 44), ao assinalar que “O espaço ficcional raramente é descrito”. Quanto ao tempo, passado e futuro são irrelevantes.

Em relação aos discursos das personagens, observamos duas características: a presença simbólica de animais e o diálogo de enfrentamento por eles desenvolvidos, já

que, para o autor, a essência da fábula é a personificação, ou seja, animais com caracteres apropriados às virtudes e aos defeitos humanos. Nesse caso, a força que fala na fábula é a formiga, a partir de estereótipos do imaginário popular, que possam estar expressos como simbologia de labor, previdência, enquanto que a cigarra estaria ligada à negligência e imprevidência.

Ao passar à leitura do texto adaptado por La Fontaine (Anexo A), traduzido por Bocage (2012), observamos alguns acréscimos e deslocamentos. O narrador do fabulista francês preserva as características de enredo simples e linear, mantendo-se fiel à narrativa esópica. Nessa composição, não encontramos o formato tradicional cuja organização é apresentada em dois parágrafos, em que no primeiro está a narrativa e, no segundo, o “epimítio”, mas uma estrutura textual em versos:

Tendo a cigarra em cantigas Folgado todo o verão

Achou-se em penúria extrema Na tormentosa estação. (BOCAGE, 2012, p. 13).

No entanto, embora o “epimítio” não apareça explícito no texto, a moral está diluída no mesmo por meio da fala do narrador, sobretudo, pela voz da formiga:

[...]

“No verão em que lidavas? ” À pedinte ela pergunta: Responde a outra: “Eu cantava Noite e dia, a toda hora. - Oh! Bravo! Tornava a formiga; Cantavas? Pois dança agora.” (BOCAGE, 2012, p. 14 – destaques do autor).

Percebemos, a partir do diálogo entre os personagens, que implicitamente La Fontaine apresenta vícios da natureza humana como: a inércia, a imprudência, a avareza. Esta última é atribuída à formiga, ao passo que à inercia e a imprudência são direcionados à cigarra. Com isso, o narrador constrói uma imagem depreciada da cigarra, vista como pedinte e imprudente, o que pode revelar uma postura valorativa do trabalho e depreciativa da arte. Em análise da presente fábula, Oliveira (2011) aponta que a cigarra representa os artistas da época de La Fontaine, que:

Diferentemente daqueles de nosso contexto sócio-histórico, quando não tinham recursos, como o próprio fabulista, careciam da proteção dos nobres – as formigas -. Muitos desses nobres, avaros que eram, apesar de terem o suficiente, nem sempre estavam dispostos a ajudar os artistas – as cigarras -, condenando- os à miséria, à penúria. Partindo desse contexto, esta fábula de La Fontaine pode

ser lida como uma crítica ao descaso dos nobres à arte, denúncia que faz a fábula transitar do caráter moralizador ao caráter crítico político, revelando sua natureza revolucionária (OLIVEIRA, 2011, p. 51).

Nessa perspectiva, observamos que, o caráter da narrativa construída por La Fontaine, parece estar mais ligado às questões sociais e políticas, deixando a moral para segundo plano.

No tocante à leitura da narrativa, encaixada por Monteiro Lobato (Anexo B), o primeiro aspecto que nos chama a atenção está relacionado ao seguinte fato: A cigarra e as formigas é a primeira fábula apresentada no livro Fábulas (2010). Essa escolha não está relacionada ao simples fato da narrativa ser bastante conhecida dos leitores das mais variadas idades, mas talvez devido à estratégia do escritor em tentar prender a atenção dos leitores, haja vista que, ao término da história, Emília faz o seguinte pedido à narradora Dona Benta: “Conte outra” (LOBATO, 2010, p. 14).

O segundo elemento que destacamos trata-se da apresentação do título, o qual é dividido em duas partes: I – A formiga boa e, a II – A formiga má. Esse detalhe já evidencia ao leitor a necessidade de uma atualização quanto ao seu horizonte de expectativas em relação a versões clássicas escritas anteriormente e, ao mesmo tempo, sinaliza que a intertextualidade se faz presente no texto. A transposição intertextual realizada por Lobato se constitui numa possibilidade para que os textos canônicos sejam reelaborados. Sobre a questão dos horizontes de expectativas dos leitores, Compagnon (2006), em O demônio da teoria. Literatura e senso comum, ressalta que:

O horizonte de expectativa, como o repertório de Iser, mas novamente como uma tonalidade mais histórica, é o conjunto de hipóteses compartilhadas que se pode atribuir a uma geração de leitores: ‘O texto novo evoca para o leitor todo um conjunto de expectativas e de regras do jogo com as quais o familiarizaram os textos anteriores e que, ao fio da leitura, podem ser moduladas, corrigidas, modificadas ou simplesmente reproduzidas.’ O horizonte de expectativa, transobjetivo, modelado pela tradição, e identificável através das estratégias textuais características de uma época (as estratégias genéricas, temática, poética, intertextual), é confirmado, modificado ou ironizado, e até mesmo subvertido, pela obra nova (COMPAGNON, 2006, p. 212 – 213 – destaques do autor).

A seguir, na Figura 1, encontraremos abaixo do título A cigarra e as formigas, ou seja, antes da primeira parte da versão lobatiana, uma ilustração:

Figura 1 – Ilustração da fábula A cigarra e as formigas (Versão de Lobato)

Fonte: Dados da pesquisa

Percebemos, que esse recurso utilizado pelo escritor demonstra uma visível preocupação com a forma da fábula, não apenas no que tange ao mero papel da ilustração no livro infantil, mas como um importante elemento modificador de sentidos do texto escrito. Retomando os aspectos de leitura levantados por Marly Amarilha, Tavares (2009) comenta que a ilustração contribui para o desenvolvimento de alguns aspectos da formação do leitor infantil, como por exemplo, a capacidade de observação e análise, e promove uma rica experiência de cor, forma, perspectiva e significados porque, como já afirmamos, sugere elementos para a ampliação e modificação da leitura. Além disso, a autora afirma ainda que:

Muito mais do que apenas ornar ou elucidar o texto, a ilustração pode, assim, representar, descrever, narrar, simbolizar, expressar, brincar, persuadir, normatizar, pontuar, além de enfatizar sua própria configuração, chamar atenção para seu suporte ou para a linguagem visual (TAVARES, 2009, p. 35 – destaques da autora).

Por sua vez, Wanderley e Cavalcante (2015, p. 127) defendem que o cuidado com a ilustração representa uma preocupação com um receptor específico – a criança. Além disso, permite “uma fruição dupla da arte, afinal é esta uma das principais funções da ilustração no texto infantil, mesmo que esta já seja a apresentação de uma leitura realizada pelo artista que ilustra”.

Na primeira parte da narrativa, A formiga boa, Lobato inova não apenas ao colocar a cigarra como personagem principal da história: “Houve uma jovem cigarra que tinha o costume de chiar ao pé de um formigueiro” (LOBATO, 2010, p. 12), mas por utilizar uma linguagem extremamente afetiva que se aproxima do leitor infantil, o que talvez explique a presença de diminutivos e onomatopeias: “cansadinha”, “galhinho”, “xalinho”, “amiguinha”, “Pedrinho”, “Narizinho”, “tique, tique, tique”. A reinvenção da linguagem literária empreendida por Lobato é uma característica que marca, não apenas a obra Fábulas, mas toda a sua produção.

Já a segunda parte da narrativa, A formiga má, focaliza as maldades da formiga e remete a um espaço distante: “Já houve, entretanto, uma formiga má que não soube compreender a cigarra...” (LOBATO, 2010, p. 12). O espaço da história é na Europa, o que nos faz deduzir que o espaço da parte anterior seria o Brasil. Nessa versão, os fatos que ocorrem são semelhantes aos da primeira, mas a formiga se recusa a ajudar a cigarra e a deixa morrer diante da sua porta. Nesse momento, o primeiro narrador da história apresenta uma espécie de “lição de moral”, “Os artistas – poetas, pintores, músicos – são as cigarras da humanidade” (LOBATO, 2010, p. 13).

No entanto, logo em seguida, o leitor se surpreende com a continuidade da narrativa, por meio da fala de Narizinho, que discorda da fábula: “- Esta fábula está errada! - Gritou Narizinho.” As discussões, a partir de então, irão girar em torno de uma suposta falsidade científica, já que, segundo Narizinho, as formigas são “os únicos insetos caridosos que existem” (idem). Dona Benta, a segunda narradora e comentarista da história, então explica a diferença entre “lições de História Natural” e “moral”.

Nesse momento, quando a fábula “tradicional” passa a ser debatida pelos personagens do Sítio do Picapau Amarelo, percebemos que a moral, em Lobato, não é uma verdade absoluta, mas algo a ser questionado, discutido e relativizado, confirmando as considerações pontuadas por Ligia Cademartori (1986, p. 52) em O que é literatura infantil, ao afirmar que a moral do escritor “está centrada em uma verdade individual. Suas personagens seguem uma moral de situação na qual a liberdade é o grande valor”. Nesse sentido, concordamos com Souza (2009), quando afirma que: “O comportamento das personagens ouvintes é altamente instigante, quando sugere um olhar crítico para a fábula. Inspirados nelas, os leitores (crianças ou adultos) podem

desenvolver a sua capacidade de criação e de argumentação” (SOUZA, 2009, p. 103- 118).

Em A cigarra e a formiga, reescrita por Manoel Monteiro (2012), o poeta retoma o texto esópico e realiza uma transposição, segundo as regras de composição de folhetos. Sobre esse aspecto, Abreu (2004, p. 202) destaca que: “A alteração mais fundamental é a transposição da prosa para o verso, adaptando-se a narrativa à forma poética dos folhetos”, pois a versificação, além de acomodar esse tipo de texto produzido no interior da cultura escrita da literatura de folhetos, permite sua compreensão e memorização por parte das comunidades nordestinas, podendo ser lidos oralmente ou cantados.

A versão construída por Manoel Monteiro mantém o enredo essencial, procurando promover o seu desembaraçar, por meio de alguns acréscimos e deslocamentos. O enredo curto se desenvolve em apenas oito páginas e em dezessete sextilhas, com estrutura de rimas ABCBDDB, seguindo os padrões dos folhetos nordestinos tradicionais, reforçando, desse modo, o que defendeu Abreu (2004), ao afirmar que o valor do poeta está na habilidade com que maneja essas regras, na destreza com que compõem e recompõe versos e narrativas calcadas em estruturas tradicionais.

O folheto se enquadra no chamado ‘Grande ciclo das histórias fabulosas’, mais precisamente no subgrupo ‘ciclo das histórias fantásticas e lendas’, de Ronald Daus, tendo como base a classificação apontada por Ribeiro (1987), uma vez que a história é constituída por um enredo em que as personagens são bichos que vivem e agem como seres humanos, embora saibamos que é possível encontrar várias fábulas cujas personagens não são animais, já que “qualquer ser pode figurar como personagem de uma fábula” (OLIVEIRA, 2011, p. 39).

Ao iniciarmos a leitura do folheto de Manoel Monteiro (Anexo C), observamos que o mesmo traz na capa o nome do autor, destacando-lhe como membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel, o título da obra A cigarra e a formiga: uma fábula educativa e atual, acompanhado da imagem das duas personagens da história, e outros elementos como cidade, estado, país, edição e a data em que o folheto foi publicado. No verso da capa, há algumas considerações do poeta a respeito da leitura. A certa altura do texto, o poeta afirma que ler se constitui “O calcanhar de Aquiles da escola brasileira ... [e que] o exercício de declamar cordel em sala de aula tem-se mostrado um remédio

eficaz para esse mal coletivo” (MONTEIRO, 2012).

No verso da contracapa, o poeta Manoel Monteiro apresenta um excerto de outra versão da fábula A cigarra e a formiga, de autoria do poeta Carioca Mário Pederneiras, em seguida, tece algumas críticas em relação ao desfecho da sua adaptação. Assim, a partir da primeira estrofe do folheto, já podemos perceber a criatividade e desembaraço do poeta Manoel Monteiro, quanto à transposição da prosa para o verso, a partir do momento que o narrador começa a contar a história, dirigindo-se a seu público leitor- ouvinte, como se estivesse frente a frente:

Meu Senhor! Minha Senhora! Meu amigo! Minha amiga! Sentem ao meu lado, escutem uma historieta antiga Cheia de belas imagens que tem como personagens A cigarra e a formiga.

(MONTEIRO, 2012, p. 01)

É interessante destacar que este recurso empregado pelo poeta, de falar diretamente com seu leitor, numa forma próxima de contar a história, reforça a coloquialidade, e, consequentemente, a proximidade da narrativa com o destinatário, além de buscar prender e conquistar a atenção do leitor. Esse aspecto está relacionado ao fato do folheto de cordel estabelecer uma forte relação com a oralidade. Segundo Ribeiro (1987), essa marca evidencia o sucesso dessa literatura. Para a autora, diferentemente do que ocorre com a literatura culta, que se dirige a um leitor solitário, a literatura popular não pode perder de vista o auditório, diante do qual será recitada ou cantada.

Em seguida, após a introdução da narrativa, o poeta começa a apresentar a cigarra. Percebemos que ele dá asas à sua imaginação e recorre a atualização de uma linguagem poética acionada a vários elementos da natureza: sol, chuva, primavera, outono, inverno, tarde e aurora. Vejamos:

A CIGARRA é um inseto De vozinha estridular Tenha sol brilhando alegre Ou chuva a se derramar, Seja primavera, ou seja, outono A CIGARRA adeja

Estridulante a cantar. (MONTEIRO, 2012, p. 01)

CIGARRA canta no inverno Quando a chuva cai mansinha Canta ao romper da aurora E quando a tarde definha, Com cigarra não tem choro Canta se está de namoro E canta se está sozinha. (MONTEIRO, 2012, p. 02).

Dando continuidade à construção da imagem da cigarra, de forma simples, singela e desembaraçada, na oitava estrofe, o poeta apresenta ao leitor a beleza dos seus versos, demonstrando senso de observação e reconhecimento do valor do canto daquele animal:

CIGARRA canta e, cantando, Deixa a vida caminhar

Foi assim que uma delas Estava alegre a cantar Quando uma formiguinha Conduzindo uma folhinha Parou para a saudar. (MONTEIRO, 2012, p. 03).

Ao retomar o mundo da cigarra, conforme podemos observar nas três últimas estrofes apresentadas, a partir das imagens que foram construídas, fica visível a percepção aguçada do poeta pela natureza.

Tais imagens são apresentadas ao leitor infantil a partir do estímulo dos sentidos. Temos o estímulo da visão em “Tenha sol brilhando alegre” – “Ou chuva a se derramar”; “Quando a chuva cai mansinha” – “Canta ao romper da aurora” – “E quando a tarde definha”; da audição em “cigarra canta e, cantando” – “Deixa a vida caminhar” - “Estava alegre a cantar”, fazendo com que o poema se torne real para a criança. O uso desses sentidos no folheto de cordel sugere a proximidade do poeta com o universo da criança. Ao tornar o poema real para a criança, o poeta lhe favorece uma ligação com a natureza e contribui para a ampliação do repertório infantil de convivência com os bichos. Sobre a importância da poesia, no sentido de permitir que a natureza seja recordada, Bosi (2000), no seu texto O ser e o tempo da poesia, ponderou que:

A poesia da natureza não traz em si sinal de retorno à pura animalidade (esse retorno ronda, aliciante, os planos do lazer burguês); a poesia da natureza é saudade, mas liberação. “O que ameaça a práxis dominante e suas alternativas inelutáveis não é, por certo, a natureza, com a qual ela, antes, coincide, mas o fato de que a natureza seja recordada”. Re (cor) dar a natureza, socializando-a no mesmo passo em que o homem se naturaliza. A poesia que busca dizer a

idade de ouro e o paraíso perdido acaba exercendo um papel humanizador das carências primárias do corpo: a comida, o calor, o sono, o amor (BOSI, 2000, 179).

Se na primeira parte do cordel foi revelado ao leitor um elogio ao mundo biológico, de modo especial à cantoria da cigarra, imprimindo o caráter lúdico ao cordel, a partir da oitava estrofe, quando o poeta começa a apresentar, através da voz do narrador e de sua própria voz, a figura da formiga parece estar associada ao caráter pedagógico e moralista, marcado pela valorização do trabalho e da economia:

A formiguinha tomou Da folha verde e pesada E saiu resfolegando, Esbaforida e cansada Mas teria a recompensa De fartura na dispensa Pra boca da filharada. (MONTEIRO, 2012, p. 03). Enquanto a CIGARRA Leva a vida num festival Pensando que todo dia É dia de carnaval

A FORMIGA não se atrapalha Economiza e trabalha

O que para ela é normal. (MONTEIRO, 2012, p. 04). FORMIGA trabalha duro Com alegria e prazer Por isso no formigueiro Jamais falta o de “comer” Diferente da CIGARRA Que leva a vida na farra Depois se dana a sofrer. (MONTEIRO, 2012, p. 05).

Percebemos uma certa referência à visão utilitarista da sociedade capitalista marcada pelo produtivismo, que “castiga todo aquele que se afasta dos padrões estabelecidos, premiando os que seguem os moldes propostos” (OLIVEIRA, 2011, p. 50). Enquanto a formiga é premiada por economizar e trabalhar arduamente, a cigarra, por sua vez, é castigada por “levar a vida num festival”, e se afastar dos padrões estabelecidos pelo sistema. Tendemos a inferir que talvez a cigarra esteja relacionada ao ócio, e como tal, se opõe a ideia de trabalho, haja vista que aquele ou aquela que não está produzindo, de acordo com a lógica e com os padrões preconizados pelo sistema

capitalista, é um ser preguiçoso, inútil.

As estrofes também revelam a presença de valores inerentes à ideologia capitalista presentes, os quais são percebidos, sobretudo, nas falas concedidas à formiga. Diga-se de passagem, muitas, em relação à cigarra. Enquanto a cigarra tem espaço para falar apenas em dois versos do cordel, o narrador concedeu voz para a formiga, por meio do discurso direto, em três estrofes, dando a entender que ela seria a protagonista da história:

Você amiga CIGARRA Levou a vida cantando Enquanto tenho vivido Dia e noite trabalhando, Se hoje falta pão aos teus Para mim e para os meus Em pão na mesa sobrando. Trabalhe e economize,

Qual o objetivo de trabalhar a Cigarra e a Formiga?

OBJETIVOS DA ATIVIDADE: DESENVOLVER A ORALIDADE, CONCENTRAÇÃO E A ATENÇÃO; DESPERTAR O GOSTO PELA LEITURA; OPORTUNIZAR O CONTATO COM NOVOS GÊNEROS TEXTUAIS (FÁBULA); VALORIZAR O TRABALHO E PRATICAR A SOLIDARIEDADE. A CIGARRA PASSOU TODO O VERÃO CANTANDO E TOCANDO, ENQUANTO A FORMIGA JUNTAVA SEUS GRÃOS.

Que moral você pode tirar da fábula da cigarra e da formiga?

A moral dessa história é que todas as ações geram consequências. Enquanto a cigarra se divertia, a formiguinha só trabalhava. Mas, no fim, o esforço da formiga é compensado pela fartura e a cigarra, que não se preparou, ficou sem ter o que comer.

Como trabalhar a história da cigarra e da formiga?

Trabalhe também com música. Apresente para a turma a música da cigarra e da formiga que pode ser encontrada nesse link A Cigarra e a Formiga". Incentive as crianças a cantarem em grupo o refrão. Distribua massa de modelar para as crianças e peça para que cada criança crie uma escultura de seu personagem favorito.

Qual é o conflito da história a Cigarra e a Formiga?

Resumo. Resumo: A fábula A cigarra e a formiga é bastante conhecida por apresentar uma moral que adverte contra a indolência e alerta sobre a necessidade do trabalho.