O que pode se comparar ao patrimonialismo

Patrimonialismo é um conceito desenvolvido pelo sociólogo alemão Max Weber (1864-1920), no fim do século XIX, e aplicável tanto à disciplina de história quanto à sociologia. Esse conceito tem o objetivo de compreender um modo específico de dominação, ou de poder, que atinge as esferas econômica e sociopolítica.

Como o próprio termo indica, patrimonialismo deriva das palavras patrimônio e patrimonial e pode ser definido como uma concepção de poder em que as esferas pública e privada confundem-se e, muitas vezes, tornam-se quase indistintas. Assim sendo, um líder político é qualificado como patrimonialista quando, ao assumir um cargo na esfera pública (o de governador, por exemplo), acaba “instrumentalizando”, isto é, criando mecanismos de controle, a estrutura estatal para satisfazer as suas necessidades pessoais, ou seja, privadas.

  • Nepotismo e personalismo político

Nesse sentido, é frequente no patrimonialismo o aparecimento de fenômenos sociopolíticos como o nepotismo (palavra que vem do latim nepos e que quer dizer descendente). A prática do nepotismo consiste em familiares de um determinado detentor de cargo público (prefeito, deputado, presidente etc.) serem beneficiado por ele, que lhes emprega, valendo-se da influência que tem, em cargos públicos auxiliares: assessoria, secretaria etc. O Estado, nesse sentido, é compreendido como uma extensão do foro privado de quem ocupa um posto político.

O Estado encarado como patrimônio, segundo Weber (e outros autores da mesma linha), é um obstáculo à eficiência da máquina pública, já que a racionalidade impessoal (sem interferência de assuntos privados) que qualifica o Estado nos moldes do liberalismo do século XIX não pode ser exercida. No Estado em que não há impessoalidade, os interesses públicos são sempre prejudicados em favor dos interesses privados. Nesse sentido, é comum que, somado à falta de impessoalidade, esteja o personalismo político. O que isso significa? O personalismo político é uma espécie de rede de relações público-privadas nas quais prevalecem os “arranjos” pessoais, como o “apadrinhamento” e o “conchavo” para se conseguir aprovações de leis em casas legislativas ou, no âmbito econômico, a aprovação de licitações públicas para determinadas empresas etc.

Outro fenômeno sociopolítico relacionado com o patrimonialismo é o paternalismo político, isto é, a adesão da massa de governados à figura carismática de determinado líder político. O líder apresenta-se como “pai” (daí a expressão paternalismo), como chefe e guia da massa. Esse tipo de liderança coloca em risco a legitimidade política do Estado, já que o líder carismático pode valer-se de sua imagem para agir acima da lei ou mesmo transformar o edifício jurídico para que ele seja favorecido. A expressão “salvador da pátria” ajudar a ilustrar bem o paternalismo político.

  • O patrimonialismo no Brasil

No caso do Brasil, o patrimonialismo foi estudado por vários pensadores importantes, como Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Raymundo Faoro, Florestan Fernandes, Victor Nunes Leal, José Oswaldo de Meira Penna e Paulo Mercadante. Destes, aquele que mais se ateve às definições sociológicas de Weber e que procurou aplicá-las à realidade histórica brasileira foi Raymundo Faoro, cuja obra “Os Donos do Poder – Formação do patronato político brasileiro” é um clássico. No geral, Faoro e esses outros autores procuram explicar as raízes históricas, sobretudo herdadas de Portugal, do patrimonialismo no Brasil.

Desde a formação dos primeiros clãs rurais de colonos no século XVI, em terras brasileiras, os domínios privados (latifúndios, sobretudo) formavam também um núcleo de ação política. Grande parte da autoridade local nas vastas províncias do território brasileiro era administrada e até policiada por milícias vinculadas aos senhores das terras (de forma semelhante ao que ocorria no sistema feudal). O poder local e personalista teve grande influência na formação do Brasil e resistiu por muito tempo (e ainda hoje resiste) à centralização política do Estado e à impessoalidade que este exige.

Um dos fenômenos mais explicitamente patrimonialistas da história política brasileira foi o do coronelismo durante a República Velha. O “coronel” era o típico líder paternalista que, ocupando o cargo de governador ou de prefeito, transformava o seu domínio de atuação política em uma extensão de sua casa ou de sua fazenda.


Por Me. Cláudio Fernandes

Nas últimas décadas a Administração Pública, em termos mundiais, tem passado por diferentes fases. Podemos classificar estas fases em três: patrimonialista, burocrática e gerencial.

Acompanhe este artigo e aprenda o que é patrimonialismo, burocracia e gerencialismo.

Patrimonialismo

Este modelo é caracterizado pela não distinção entre o que é patrimônio público e o que é patrimônio privado. Em outros termos, a res publica (coisa do povo) se confundia com a res principis (coisa do príncipe).

Esta forma de administração pública predominou no período pré-capitalismo, quando o monarca exercia o domínio sobre os bens públicos e particulares, sem qualquer necessidade de prestar contas à sociedade.

O patrimonialismo é caracterizado pela forte presença da seguintes características: nepotismo, corrupção, ineficiência, improviso, falta de profissionalismo, ausência de métodos de trabalho, falhas de planejamento, entre outras.

O que pode se comparar ao patrimonialismo

Burocracia

A teoria da burocracia teve como expoente Max Weber e começou a fazer parte da administração empresarial e pública mundial em torno da década de 1940. A burocracia surgiu para coibir os excessos do patrimonialismo.

Apesar de hoje o termo burocracia ser utilizado como sinônimo de muitos papéis, formulários, normas excessivas e exaustivas, no seu surgimento o objetivo era de melhorar a eficiência das organizações.

O que pode se comparar ao patrimonialismo

A organização na burocracia segue o modelo racional-legal, ou seja, deve funcionar com base em normas, leis e regulamentos, independentemente das vontades pessoais dos agentes. Entre as principais características do modelo burocrático estão o profissionalismo, a impessoalidade e o formalismo.

O profissionalismo está ligado com a meritocracia e a instituição de planos de carreira. A impessoalidade significa que o agente não pode utilizar seu entendimento pessoal para exercer suas funções dentro da organização, mas deve seguir as normas e procedimentos. Além disso, as relações organizacionais ocorrem em termos de cargos e funções e não em termos de pessoas envolvidas. O formalismo diz respeito à utilização de formulários, rotinas padronizadas e comunicações por escrito.

O que pode se comparar ao patrimonialismo

Todo este aparato burocrático surgiu com o intuito de aumentar a eficiência organizacional (diferente do que comumente se pensa, a ideia de eficiência foi introduzida na burocracia, não no modelo gerencial). O controle na burocracia era a priori e focado nos procedimentos. Ou seja, sob esta ótica, se uma instituição está seguindo as normas estabelecidas, então a eficiência está garantida.

Atualmente, quando falamos da lentidão presente em alguns procedimentos observados tanto na administração pública quanto privada, nos referimos às disfunções geradas pelo modelo burocrático, não aos seus propósitos iniciais. Seguem alguns exemplos de disfunções burocráticas:

  •  excesso de formalismo;
  • perda da noção básica de servir à sociedade;
  • o controle tranforma-se na razão de ser do Estado;
  • ineficiência e auto-referência;
  • clientelismo e fisiologismo.

Gerencialismo

Como o modelo burocrático possui foco nos procedimentos, a missão básica de servir a sociedade acabou sendo perdida. Com o aparecimento das disfunções da burocracia, surgiu a necessidade de um novo modelo para ser utilizado na Administração Pública. Dessa forma, o gerencialismo emergiu com o foco do controle voltado para os resultados, isto é, a posteriori.

A eficiência faz parte do gerencialismo, embora não seja inovação deste modelo. O gerencialismo inovou ao aumentar a preocupação com os conceitos de eficácia e efetividade. 

Este modelo procura comparar o cliente da administração empresarial com o usuário do serviço público. Ou seja, não basta a Administração Pública executar suas tarefas conforme normas e procedimentos. É necessário saber se a população, usuária dos serviços públicos, está satisfeita com os serviços que estão sendo prestados.

O que pode se comparar ao patrimonialismo

Algumas das características do gerencialismo são:

  • accountability: prestação de contas dos governantes sobre o seu próprio desempenho;
  • transparência: clareza nos procedimentos adotados;
  • participação popular / controle social;
  • criação de regimes temporários de emprego;
  • flexibilização do direito administrativo;
  • competição administrada: esta ideia diz respeito a “simular” um ambiente de competição para que melhores resultados sejam obtidos. Por exemplo: liberar mais recursos para organizações com melhores desempenhos, de acordo com indicadores pré-estabelecidos.

A eficiência faz parte do gerencialismo, embora não seja inovação deste modelo. O gerencialismo inovou ao aumentar a preocupação com os conceitos de eficácia e efetividade. Segue uma breve ideia sobre cada um destes três conceitos:

  • Eficiência: uso adequado dos recursos disponíveis (já vem desde o modelo burocrático);
  • Eficácia: significa o grau de alcance dos resultados;
  • Efetividade: diz respeito aos impactos gerados para a sociedade.

Considerações finais

A Administração Pública no Brasil, em linhas gerais, passou no decorrer dos anos de uma ótica patrimonialista para uma burocracia e, após o surgimento de diversas disfunções burocráticas, para o gerencialismo.

A burocracia surgiu como forma de melhorar a eficiência e combater o patrimonialismo, separando o que é público daquilo que é privado. No entanto, como a burocracia possui seu foco no cumprimento de normas e procedimentos, com o passar do tempo houve a necessidade de uma nova forma de administrar a coisa pública.

Esta nova forma surgiu com o gerencialismo, que traz pontos da administração privada e aplica no contexto da administração pública. Além disso, um dos principais aspectos do gerencialismo diz respeito a considerar o usuário do serviço público como se fosse um cliente da administração privada. Desta forma, sempre que possível a Administração deve buscar alcançar a satisfação dos usuários dos serviços públicos por meio dos serviços prestados.

Referências

Jund, S. (2008). Administração, Orçamento e Contabilidade Pública (3rd ed.). Rio de Janeiro: Elsevier.

Paludo, A. (2013). Administração Pública (3rd ed., p. 608). Rio de Janeiro: Elsevier.