Como podem ser diferenciadas as artérias de grande calibre das de médio calibre?

Descrição Geral

Epidemiologia

  • Vasculite sistémica idiopática mais comum
  • A idade é o maior fator de risco:
    • Afeta geralmente indivíduos com mais de 50 anos de idade
    • Aumento da incidência nas 8ª e 9ª décadas de vida
  • 3 vezes mais comum nas mulheres
  • Ancestrais do Norte da Europa e Escandinávia
  • Um índice de massa corporal (IMC) baixo está associado a um risco aumentado.

Etiologia

  • A etiologia exata é desconhecida.
  • Fatores genéticos que podem aumentar a suscetibilidade:
    • Variantes genéticas no complexo principal de histocompatibilidade (MHC)
    • Subtipos do sistema antigénio leucocitário humano (HLA)
    • Genes envolvidos nas células T
  • 45%–50% apresentam polimialgia reumática concomitante.

Fisiopatologia

A arterite de células gigantes (ACG) é resultado de uma cascata de inflamação e dano vascular e reparação disfuncional:

  • Não estão identificados eventos desencadeantes.
  • Envolve artérias de grande e médio calibre:
    • Afeta frequentemente a aorta e os seus ramos principais
    • Envolvimento comum dos ramos das artérias carótidas e vertebrais
  • Envolve principalmente a artéria temporal superficial (ATS; ramo da artéria carótida externa)
  • Mecanismo:
    1. Um antigénio é detetado por células detríticas na túnica adventícia → recruta mais células dendríticas, linfócitos e macrófagos.
    2. As células dendríticas apresentam os antigénios → agregado de células T4 diferenciadas e ativadas (CD4+).
    3. As células T CD4+ proliferam → inflamação vascular através da ativação de macrófagos.
    4. A camada média é invadida por células inflamatórias → os macrófagos sofrem organização granulomatosa (células gigantes) → produção de fatores de crescimento e metaloproteinases → perda de células musculares lisas vasculares e destruição da lâmina elástica interna.
    5. As células musculares lisas lesadas respondem ao dano → os miofibroblastos diferenciam-se, migram em direção à camada íntima e produzem proteínas de matriz extracelular → hiperplasia da íntima e oclusão arterial → complicações isquémicas da doença.

Como podem ser diferenciadas as artérias de grande calibre das de médio calibre?

Ramos da ATS, que podem estar envolvidos na ACG

Imagem por BioDigital, editado por Lecturio.

Como podem ser diferenciadas as artérias de grande calibre das de médio calibre?

Amostra histológica de biópsia da artéria temporal do mesmo caso, corada com hematoxilina-eosina, a revelar a fragmentação, distorção descontinuidade da lâmina elástica interna, característica da arterite temporal

Imagem: “Association between human papillomavirus DNA and temporal arteritis” por Mohammadi, A., Pfeifer, J.D., Lewis, J.S. License: CC BY 2.0.
Como podem ser diferenciadas as artérias de grande calibre das de médio calibre?

Fisiopatologia da arterite de células gigantes
Ativação das células T através da apresentação de um antigénio por células dendríticas (APC). Estas recrutam e ativam mais células inflamatórias, incluindo os macrófagos, através de recetores (TLR), citocinas e quimiocinas. Os macrófagos organizam-se em células gigantes e produzem metaloproteinases da matriz (MMPs) e fatores de crescimento (PDGF e VEGF). Isto leva à destruição e hiperplasia e, consequentemente, oclusão dos vasos.

Imagem por Lecturio.

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Apresentação Clínica

Manifestações clínicas

  • Constitucionais:
    • Febre
    • Fadiga
    • Mal-estar
    • Perda de peso
    • Anorexia
  • Cabeça e pescoço:
    • Cefaleia:
      • Ocorre em ⅔ dos pacientes
      • Gravidade e qualidade variáveis
      • Localizada na região temporal e por ser despertada pela palpação
      • Hiperestesia do couro cabeludo associada
    • Claudicação mandibular:
      • Ocorre em cerca de ½ dos pacientes
      • Dor mandibular ou fadiga muscular durante a mastigação, aliviada com o repouso
  • Oftalmológicas:
    • Perda transitória da visão (amaurose fugaz):
      • Resultante da perda de fluxo sanguíneo no olho
      • Tipicamente monocular
      • Indolor, transitória e intermitente
      • Visão turva, diplopia, ou perda de visão
    • Perda de visão permanente:
      • A complicação mais preocupante
      • Devido a neuropatia isquémica ótica anterior ou posterior, oclusão da artéria central da retina ou isquemia cerebral 
      • Perda de visão parcial ou completa que é súbita e indolor
      • Pode afetar um ou ambos os olhos
      • Raramente reversível
  • Musculoesqueléticas:
    • Polimialgia reumática:
      • Dor e rigidez matinal dos músculos e articulações proximais
      • Ombros, ancas, região cervical e tronco afetados

Exame objetivo

  • Cardiovasculares:
    • Pulsos diminuídos
    • Dor e dilatação da artéria temporal
    • Medidas diferentes de pressão arterial entre os membros superiores → envolvimento da artéria subclávia
    • Sopros
    • Sopro cardíaco de regurgitação aórtica → suspeita de um aneurisma da aorta ascendente
  • Fundoscopia:
    • Pode ser normal com sintomas transitórios
    • Isquemia da retina → manchas algodonosas na retina
    • Neuropatia isquémica anterior (perda do fluxo sanguíneo da porção anterior do nervo ótico) → disco ótico pálido e edemaciado e margens da retina distorcidas
  • Musculoesquelético:
    • Limitação dos movimentos dos ombros, região cervical e anca
    • Sinovite do punho e metacarpofalângicas

Como podem ser diferenciadas as artérias de grande calibre das de médio calibre?

Fundoscopia do olho direito a demonstrar as manchas algodonosas ao longo das arteríolas supraemporais e infratemporais (setas). As manchas algodonosas indicam obstrução das arteríolas da retina, levando à isquemia da retina.

Imagem: “Cotton-wool spots” por James Paget University Hospital NHS Foundation Trust, Lowestoft Road, Gorleston, Great Yarmouth NR31 6LA, Norfolk, UK. Licença: CC BY 2.0.

Diagnóstico

Algoritmo de diagnóstico

Como podem ser diferenciadas as artérias de grande calibre das de médio calibre?

O supracitado é um algoritmo simples para ajudar a estabelecer o diagnóstico da ACG. Este determina as etapas básicas no diagnóstico da doença e quando esta deve ser considerada.

Imagem por Lecturio.

Métodos de diagnóstico

  • 1º, verificar estudos laboratoriais:
    • VS e PCR:
      • Quase sempre elevados
      • Não específicos
    • Hemograma completo:
      • Anemia normocrómica
      • Trombocitose reativa
      • Leucócitos normais ou minimamente elevados
    • Perfil hepático:
      • Fosfatase alcalina elevada
      • Diminuição da albumina
  • Etapas seguintes:
    • Biópsia da artéria temporal (“gold standard”):
      • Deve ser realizada em todos os pacientes com suspeita de ACG
      • As lesões são segmentares, portanto o diagnóstico requer uma biópsia de um segmento longo de vaso.
      • Achados histopatológicos:
        • Panarterite
        • Células gigantes
        • Lâmina elástica interna fragmentada
      • Se negativa, deve ser considerada a biópsia da artéria temporal contralateral.
    • Eco-Doppler:
      • Alternativa não invasiva a biópsia da artéria temporal, mas dependente do operador
      • Deve avaliar os vasos da cabeça, pescoço e membros superiores
      • O “sinal do halo” (área escurecida que envolve a luz vascular do edema mural) apresenta uma elevada especificidade.
  • Se a investigação acima não estabelecer o diagnóstico, deve ser considera a avaliação do envolvimento de vasos de grande calibre:
    • Eco-Doppler das artérias axilares e subclávias
    • Tomografia computorizada com angiografia (Angio-TAC)
    • Ressonância magnética (RM) ou angiografia por ressonância magnética (Angio-RM)
    • Tomografia por emissão de positrões (PET)

Como podem ser diferenciadas as artérias de grande calibre das de médio calibre?

Biópsia da artéria temporal a demonstrar infiltrados celulares inflamatórios mistos transmurais com espessamento da íntima, fragmentação e distorção da lâmina elástica interna.

Imagem: “Biopsy of temporal artery” por the Department of Pathology and Laboratory Medicine, University of Florida, College of Medicine, Jacksonville, FL, USA. Licença: CC BY 2.0.

Tratamento

Opções de tratamento

  • Glucocorticoides sistémicos de alta dose:
    • Objetivo principal do tratamento, devendo ser iniciado precocemente, na suspeita de ACG
    • Sem perda de visão: prednisolona
    • Com perda de visão: metilprednisolona
    • Desmame progressivo durante 612 meses
  • Tratamento adjuvante:
    • Quando a terapêutica com glucocorticóides não é tolerada
    • Tocilizumab
    • Metotrexato

Medidas gerais

  • Consulta de reumatologia
  • Seguimento mensal:
    • Monitorização dos sintomas e realização de exames.
    • Reavaliar VS e PCR
  • Rastreio da tuberculose
  • Vacinação para o vírus influenza e pneumonia pneumocócica
  • Terapêutica antiplaquetária em pacientes com aterosclerose: deve ser considerado um inibidor da bomba de protões, dado que o uso de aspirina, glucocorticóides e a idade aumentam o risco de hemorragia gastrointestinal.
  • Prevenção da osteoporose com cálcio e vitamina D
  • Monitorizar a densidade óssea.

Diagnósticos Diferenciais

  • AVC: doença que condiciona uma falha no fluxo sanguíneo para o cérebro, resultando em morte celular. Existem 2 tipos: AVC isquémico por insuficiência de fluxo sanguíneo e AVC hemorrágico devido a hemorragia. Os sintomas incluem fraqueza muscular focal, parestesias, perda de visão, disartria e cefaleia. A TAC e a RM cerebrais são utilizadas para o diagnóstico e permitem diferenciar o AVC da ACG.
  • Enxaqueca: caracterizada por cefaleia pulsátil recorrente, de intensidade moderada a severa, que afeta habitualmente ½ da cabeça. Os sintomas associados incluem náuseas, vómitos e sensibilidade à luz, som ou cheiro. O diagnóstico é clínico, com base na história clínica e no exame objetivo. Os exames laboratoriais e de imagem são inocentes. A história clínica, o exame objetivo e os marcadores inflamatórios baixos ajudam a diferenciar a enxaqueca da ACG.
  • Glaucoma: Aumento da pressão intraocular, com afeção do nervo ótico e que pode levar à perda de visão irreversível. Os sintomas de glaucoma de ângulo fechado incluem visão turva, halos ao redor da luz, dor ocular severa, cefaleia, náuseas e vómitos. O diagnóstico é obtido através de um exame oftalmológico e medição da pressão intraocular, o que permite diferenciar o glaucoma da ACG.
  • Arterite de Takayasu: vasculite granulomatosa de grandes vasos, que afeta principalmente a aorta e os seus ramos principais. Os pacientes são frequentemente mulheres jovens ou de meia-idade. Os sinais e sintomas incluem dor ao toque da artéria carótida, claudicação dos membros e pulsos débeis ou ausentes. Marcadores inflamatórios elevados e angio-TAC da aorta podem auxiliar no diagnóstico. O tratamento inclui glucocorticoides e fármacos poupadores de glucocorticoides. A área demográfica, a história clínica e os achados dos exames do paciente permitem diferenciar a arterite de Takayasu da ACG.
  • Neuropatia ótica isquémica anterior não arterial: lesão idiopática e isquémica do nervo ótico. Os pacientes apresentam perda de visão súbita, indolor e monocular. A fundoscopia releva edema do disco ótico. A arterite de células gigantes deve ser considerada nestes indivíduos e pode ser descartada com marcadores inflamatórios normais. Não existe um tratamento eficaz conhecido, mas os pacientes são geralmente medicados com aspirina.

Referências

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  2. Cid, M.C. (2020). Pathogenesis of giant cell arteritis. In Ramirez Curtis, M. (Ed.), Uptodate. Retrieved October 26, 2020, from https://www.uptodate.com/contents/pathogenesis-of-giant-cell-arteritis
  3. Docken, W.P. (2019). Diagnosis of giant cell arteritis. In Ramirez Curtis, M. (Ed.), Uptodate. Retrieved October 27, 2020, from https://www.uptodate.com/contents/diagnosis-of-giant-cell-arteritis
  4. Docken, W.P. (2020). Treatment of giant cell arteritis. In Ramirez Curtis, M. (Ed.), Uptodate. Retrieved October 27, 2020, from https://www.uptodate.com/contents/treatment-of-giant-cell-arteritis
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  6. Kasper, D.L., Fauci, A.S., Longo, D.L., Bruanwald, E., Hauser, S.L., & Jameson, J.L. (2007). Harrison’s principles of internal medicine (16th edition.). New York: McGraw Hill Education.
  7. Al-Mousawi, A.Z., Gurney, S.P., Lorenzi, A.R. et al. (2019). Reviewing the pathophysiology behind the advances in the management of giant cell arteritis. Ophthalmology and Therapy 8, 177-193. Retrieved October 27, 2020 from https://link.springer.com/article/10.1007%2Fs40123-019-0171-0

Quais as diferenças histológicas entre artérias de grande médio e pequeno calibre?

As artérias musculares de médio e pequeno calibre têm como características importantes: 1 – calibre menor que as grandes artérias musculares. 2 – uma túnica média espessa, mais espessa que a túnica adventícia. 3 – à medida que seus diâmetro diminuem, aumenta a proporção relativa da parede.

O que são artérias de grande calibre?

Artérias de grande calibre ou elásticas: apresentam a túnica interna espessa e rica em fibras elásticas, a túnica média constituída por diversas membranas elásticas e a túnica adventícia pouco desenvolvida.

Como se classifica as artérias?

As artérias podem ser classificadas de acordo com o seu diâmetro em artérias elásticas, artérias musculares e arteríolas.

Quais são as veias de grande calibre?

Veias superficiais: são veias que ficam mais próximas da pele. Apresentam um calibre maior na região dos membros e do pescoço. Por essa proximidade, são as veias utilizadas para a aplicação de injeções endovenosas. Em indivíduos com músculos bem desenvolvidos, elas são facilmente observadas.