Porque as pessoas preferem os medicamentos de referência?

Em 09/10/2018 às 02:53 2 minutos de leitura

Em nossa primeira pesquisa sobre o assunto em 2011, ouvimos a opinião de médicos e pacientes sobre o uso de medicamentos genéricos. O estudo revelou, na época, que a população confiava nesse tipo de remédio, já a classe médica demonstrou um pouco de receio. Dessa vez ouvimos apenas os médicos. E o resultado foi semelhante: eles receitam os genéricos, mas com ressalvas quanto à confiança e eficácia dos mesmos.

91% dos participantes da pesquisa não recebem informações ou comunicados da Anvisa sobre genéricos, e resta aos médicos tirar suas conclusões baseando-se no feedback que os pacientes dão ao longo do tratamento com o medicamento genérico (42%) e na conversa com os colegas de profissão (29%). Ou seja, ainda que a população confie no genérico, o retorno que é dado aos médicos parece não convencê-los de sua eficácia e segurança.

Médicos são favoráveis ao uso

A maioria dos respondentes (58%) receita o medicamento genérico com frequência enquanto apenas 4% nunca o prescrevem. De modo geral, os médicos participantes são favoráveis ao uso desse tipo de remédio. Para 56% deles, os genéricos são tão eficazes quanto seus equivalentes de marca. E 64% não acreditam que eles possuem mais efeitos colaterais do que os de referência.

Mesmo assim, 59% dos entrevistados preferem receitar um medicamento de marca a um genérico. Nos últimos 12 meses, apenas 6% dos respondentes não receitaram medicamentos genéricos contra a maioria esmagadora de 93% que prescreveram.

Os médicos que não costumam receitar, ainda que minoria, não o fazem por quatro principais razões: o paciente não concorda em tomar genéricos, o paciente prefere o medicamento de marca, os de marca são mais fáceis de encontrar e por não ser política da unidade de saúde onde trabalha receitar esse tipo de remédio.

Porque as pessoas preferem os medicamentos de referência?

Há insegurança com genéricos em alguns casos

Constatamos ainda que a maioria dos médicos respondentes receitam os genéricos por conta própria. Mas e se o paciente os solicitar? Nesse caso, 70% acatariam o pedido e receitariam, embora alguns com ressalvas. Entre eles, 30% explicariam que os de marca são mais confiáveis, 26% diriam que os de marca são mais eficazes e 15% receitariam sem restrições.

Contudo, 15% dos participantes não receitariam o genérico, mas explicariam ao paciente que ele pode solicitar na drogaria se desejar. E outros 15% não acatariam o pedido do paciente de modo algum. A insegurança dos médicos em relação aos medicamentos genéricos torna-se ainda mais forte quando o paciente possui algumas doenças específicas.

Antibióticos (80%), antidepressivos (40%), anti-hipertensivos (35%), antidiabéticos (29%) e ansiolíticos (28%) são as classes de medicamentos para as quais os médicos respondentes mais evitam prescrever genéricos. E, para 51% dos entrevistados, o grau de enfermidade do paciente também vai influenciar na decisão de prescrever genéricos. Ao lado, você lê alguns comentários feitos pelos médicos participantes a respeito desse tipo de medicamento.

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Provavelmente, você já foi à farmácia com uma receita médica na mão e, ao entregar o papel ao farmacêutico, ouviu: "Esse remédio custa 'X', mas também temos a versão genérica, que está R$ 30 mais barata. Quer levar?".

Diante de tal oferta, é normal ter dúvidas e ficar com várias pulgas atrás da orelha. Será que o produto é mesmo confiável e realmente funciona? Devo "arriscar" e levar a caixinha mais barata? Se o genérico é tão bom, porque meu médico nunca me receitou essa versão do medicamento?

Pois é, mesmo sendo comercializados no Brasil há cerca de 20 anos e com a garantia de médicos e farmacêuticos de que funcionam exatamente igual ao "produto original", os remédios genéricos ainda levantam suspeitas. A seguir, explicamos o que exatamente são esses medicamentos e respondemos questionamentos que certamente já passaram pela sua mente.

Porque as pessoas preferem os medicamentos de referência?

Os genéricos funcionam? Por que são tão mais baratos?

A primeira coisa que você deve ter em mente é que o preço baixo não é motivo para questionar a eficácia desses remédios. O genéricos contêm o mesmo princípio ativo na mesma dose e forma farmacêutica que as versões com marca (originais). Também apresentam eficácia e segurança equivalentes --tudo comprovado cientificamente junto ao órgão regulador, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

Então, por que os preços são tão mais baratos? Para entender, é preciso voltar no tempo. Antes de 1999, os preços dos remédios subiam rapidamente e, embora já existissem marcas similares, não havia garantia de qualidade. A partir da necessidade de drogas mais acessíveis à população, foi criada a Lei dos Genéricos (9.787/1999), que prevê que as patentes dos remédios de marca durem apenas 20 anos.

Após esse período, de acordo com a regra, qualquer laboratório pode criar medicamentos com a mesma formulação, mas sem precisar investir dinheiro em pesquisas ou testes --o grande motivo dos genéricos serem tão mais baratos.

Os três tipos de medicamentos disponíveis

mermaidb/Istock

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Referência

É o medicamento inovador que teve a primeira patente --para isso, a farmacêutica responsável investiu dinheiro para realizar estudos clínicos e mostrar a eficácia e segurança da droga, comprovada cientificamente junto ao órgão federal competente no qual é registrada. Por conta de todos os gastos, o medicamento costuma ser mais caro.

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Genérico

É a cópia do medicamento referência e só pode ser criado após 20 anos, quando a patente do "original" expira. Para sua comercialização ser aprovada, um genérico precisa comprovar a eficácia e segurança em testes de bioequivalência e biodisponibilidade. Como não há investimentos para pesquisas e propaganda, custa menos.

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Similar

Tem a mesma composição do medicamento referência e do genérico e também precisa comprovar eficácia. A diferença é que, assim como o remédio original, ele leva o nome de uma marca e investe capital em propagandas para melhorar a popularidade do produto, além de aumentar a competitividade com o medicamento referência.

Arte/UOL

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Qualquer médico que não prescreve genéricos é ou ignorante ou extremamente influenciado por propagandas

José Gomes Temporão , médico sanitarista e ex-ministro da Saúde

Porque as pessoas preferem os medicamentos de referência?

Por que muitos médicos não receitam genéricos?

Em 2016, a Câmara aprovou a obrigatoriedade de prescrição de genéricos pelos médicos do SUS (Sistema Público de Saúde) --assim, a receita não é caracterizada como propaganda. No entanto, nos consultórios particulares, isso é uma escolha do profissional.

De acordo com Patricia Moriel, professora do curso de farmácia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), a opção do médico em não recomendar um genérico pode ser influenciada pela falta de confiança de alguns profissionais com determinadas farmacêuticas. "Apesar de já ter melhorado muito em comparação aos últimos anos, ainda existe um problema de qualidade de medicamentos no Brasil. Vemos remédios recolhidos, publicações da Anvisa advertindo sobre o controle de qualidade...", explica.

José Gomes Temporão, médico sanitarista e ex-ministro da saúde acredita que a falta de qualidade não deve ser uma preocupação. "Isso acontece pouco, com a minoria dos medicamentos. Eventuais erros são possíveis em qualquer país, mas o fato de estarmos vendo as notificações da Anvisa significa que a vigilância funciona", comenta. "Com o passar do tempo, a tendência é haver cada vez menos preconceito e cada vez mais prescrições deste tipo de droga", conclui.

Temporão ainda acredita que não há nenhuma justificativa pela qual profissionais da saúde não receitem os remédios genéricos. "Qualquer médico que não prescreva é ou ignorante ou extremamente influenciado por propagandas", aponta.

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Como o lobby da indústria pode influenciar os médicos

Um atendente de farmácia perguntando dados pessoais como CPF e seguro de saúde virou algo comum na hora de fechar uma compra. É assim que os estabelecimentos cadastram seus dados e vendem para indústria farmacêutica.

Com os dados, as empresas de medicamentos sabem que em determinada região médicos possivelmente estão prescrevendo mais produtos da indústria A do que da B. Representantes contratados então abordam os profissionais da saúde para tentar "convencê-los" a recomendar aos pacientes os produtos de sua empresa, aumentando as vendas.

"Amostras grátis, documentos e informações sobre a droga... Muitos profissionais são persuadidos assim e, às vezes, não sabem nem o preço do medicamento que estão passando, que pode ser alto. Por isso, é de extrema importância que os pacientes saibam que o genérico é eficaz", aponta Jorge Bermudez, coordenador do Departamento de Política de Medicamentos e Assistência Farmacêutica da NAF/NSP (Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca)

Apesar de presentes para uso pessoal serem proibidos pelo CFM (Conselho Federal de Medicina), alguns médicos ainda recebem mimos das farmacêuticas se forem fiéis aos seus produtos, como viagens para participarem de congressos de medicina ou cursos de atualização no exterior. Ou seja, no fim das contas, quando a influência da indústria é grande demais, os médicos ganham e as empresas ganham, e quem sai perdendo é a população.

O que fazer para se proteger e acertar na escolha do medicamento

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Converse com seu médico

O momento da consulta é o ideal para solucionar qualquer dúvida que você tenha em relação ao medicamento prescrito. Pergunte ao médico se existem outras opções, em quanto tempo o remédio vai gerar efeito, se há contraindicações... Além de outras questões sobre a segurança e para saber o que esperar da droga.

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Tire suas dúvidas

Se a dúvida bateu na hora de comprar o remédio e você não sabe se pode intercambiar um genérico, quais opções com a mesma fórmula a farmácia têm ou qualquer outra questão sobre medicamentos, fale diretamente com um farmacêutico. Ele é o profissional mais adequado do estabelecimento para responder às suas perguntas.

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Leia e relate

Informações publicadas no site da Anvisa são úteis para entender sobre os critérios de qualidade e descobrir quais remédios foram retirados do mercado. Se os usuários acreditam que o remédio não é eficaz, podem relatar à Agência na área de "notificações em vigilância sanitária" no site, o que contribui para a segurança e qualidade das drogas no país.

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"A farmácia deveria ser um estabelecimento focado em saúde"

Chocolate, isotônico, chiclete, suco, whey protein, desodorante, recarga de celular e até remédio! Hoje em dia, as farmácias comercializam praticamente de tudo um pouco. Os profissionais entrevistados acreditam que isso tende a prejudicar um pouco o que deveria ser o foco desses estabelecimentos: vender medicamentos.

Os especialistas defendem que a farmácia deveria voltar a ser o que era há anos atrás: mais parecida com um estabelecimento de saúde e menos similar a uma loja de artigos diversos. "Um local onde o farmacêutico pegue para si a responsabilidade de pensar na saúde do paciente e que o atenda com imparcialidade", opina Moriel. Assim, as pessoas receberiam maior orientação sobre os medicamentos e teriam confiança de tirar suas dúvidas sobre os genéricos ou qualquer outra droga.

Temporão também defende que um dos problemas do modelo atual é o uso desenfreado e sem necessidade de medicamentos, estimulados por propagandas. Você simplesmente chega, pergunta onde está o remédio X, o pega na prateleira e vai para o caixa. Ninguém questiona sobre o seu problema de saúde ou orienta como usar a droga --mas provavelmente alguém vai querer saber se já tem cadastro na loja e oferecer um cupom de desconto...

"Precisamos de um olhar diferente, ver a farmácia como extensão do sistema de saúde, um local para buscar informação e serviço. É um ponto que precisa ser mais debatido em nosso país", aponta o médico sanitarista.

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Porque os médicos não gostam de genéricos?

Mas a mesma pesquisa mostrou a desconfiança dos médicos em relação aos genéricos. 23% acreditam que os genéricos apresentam mais efeitos colaterais. 30% dizem que eles não são tão eficazes como os de marca. E 45% dos médicos afirmam que o processo de avaliação da qualidade dos genéricos é menos exigente.

O que pode se entender por medicamentos de referência?

Os medicamentos de referência - também conhecidos como “de marca” por terem marca comercial bem conhecida - são aqueles que possuem eficácia e segurança cientificamente comprovadas. Geralmente são produtos inovadores, com registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Qual a diferença entre genérico e medicamento de referência?

O genérico é aquele com a tarja amarela e o G de genérico, e não tem nome de marca, ao contrário dos medicamentos de referência e dos similares. Para garantir que a cópia possa ser usada no lugar do medicamento de referência, é preciso realizar alguns testes que comprovem essa intercambialidade.

É correto afirmar sobre os medicamentos de referência?

É todo medicamento “originador”, cuja eficácia, segurança e qualidade foram comprovadas cientificamente. Todo medicamento referência possui o nome comercial (marca) em suas embalagens. É igual ao medicamento referência, onde exclusivamente se apresenta com o nome da substância ativa.