Qual o princípio do desenho universal não se permite ações inconscientes?

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IntroduçãoTexto derivado das discussões iniciadas na Dissertação de Mestrado de Ana Bandeira.

As novas tecnologias de informação e comunicação trouxeram mudanças significativas nas relações sociais, culturais, políticas e educacionais e configuraram a percepção de um novo lugar antes inexistente. Por vezes chamado de espaço virtual, ou definido por alguns autores como ciberespaço (LEÃO, 2001), tal lugar se caracteriza por uma percepção orientada pelas redes computacionais cujo acesso é dado na interface. Por mais que tal lugar não se configure como um espaço no mundo natural, mas seja tomado, nas palavras do criador do termo, como uma “alucinação consensual” (GIBSON, 2013), pode-se falar do seu acesso e das barreiras existentes às pessoas com deficiência. Quanto mais rico de informações e experiências se torna esse ciberespaço, mais distante ele fica de pessoas que, seja por falta de habilidades específicas no trato das tecnologias ou por possuírem algum tipo de deficiência, almejam encontrar ali um contexto de inclusão tão ou mais rico que no espaço físico. Uma vez que é um espaço ainda relativamente novo, as “peles” (ROCHA, 2014) pelas quais é possível “percorrê-lo” podem ser já desenvolvidas observando as características do usuário em todas as suas possíveis limitações.

A formação de uma cultura digital passa pelo acesso a esses lugares que, se tomados pelos Princípios do Design Universal, podem proporcionar uma verdadeira inclusão das pessoas com deficiência. A implementação de leis e normas, que têm por base tais princípios deveriam, portanto, apontar para o desenvolvimento dessas condições. No entanto, se os caminhos já estão traçados, é um tanto estranho verificar-se como tantas barreiras ainda existem para as pessoas com deficiência.

Para tal questão, duas respostas se configuram de imediato: ou tem-se ignorado tais apontamentos legais e normativos no design das interfaces, ou essas normas e legislações, que dizem se apoiar naqueles princípios, não conduzem de fato à sua realização na prática. Visando entender por quê e como tais embarreiramentos ainda acontecem, faz-se necessária uma análise de suas aplicações, para que seja possível propor soluções que viabilizem o acesso a informações pelo “maior número de pessoas possível”.

A acessibilidade como ponto de partida para a inclusão

Orientações quanto aos modos para o atendimento das pessoas com deficiência podem ser verificadas nas legislações e normas que tratam das questões de acessibilidade, bem como por especialistas que tratam do assunto, particularmente no que concerne à sua aplicação nas interfaces computacionais. Neste sentido, é importante apresentar os diversos conceitos de acessibilidade, para que se verifique os contornos que delineiam o presente trabalho.

Definido pela Legislação brasileira por meio do Decreto 5.296 de dezembro de 2004, o conceito de Acessibilidade é apresentado como a:

condição para utilização, com segurança e autonomia, total ou assistida, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos serviços de transporte e dos dispositivos, sistemas e meios de comunicação e informação, por pessoa portadora de deficiência [sic] ou com mobilidade reduzida. (BRASIL, 2004)

Com a aprovação da Lei 13.146 de julho de 2015, chamada “Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência”, a redação desse conceito foi revisto para:

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Possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida. (BRASIL, 2015)

Aqui ele é ampliado, mudando a ideia de ser apenas “uma condição para a utilização” para uma possibilidade que lhe assegure o caminho para a utilização desses espaços. Quanto ao meio digital, insere tanto a viabilidade dos sistemas quanto as tecnologias que os caracterizam e, do ponto de vista do uso coletivo de instalações, a indicação para o uso público e também para o privado. Apresenta ainda, nesta revisão, uma definição mais atualizada da pessoa com deficiência (e não mais “portadora” de deficiência), considerando que a acessibilidade, tanto em meios físicos quanto digitais, viabilizem a inserção na sociedade de pessoas com deficiência.

O especialista em reabilitação profissional, Romeu Sassaki (2005) apresenta, por sua vez, uma proposição provocativa que vai além dessas questões, afirmando existirem vários outros tipos de barreiras e contextos diferentes enumerando-os em seis possibilidades: arquitetônicas, comunicacionais, metodológicas, instrumentais, programáticas e atitudinais.

Acessibilidade arquitetônica: sem barreiras ambientais físicas, nas residências, nos edifícios, nos espaços urbanos, nos equipamentos urbanos, nos meios de transporte individual ou coletivo.

Acessibilidade comunicacional: sem barreiras na comunicação interpessoal (face-a-face, língua de sinais), escrita (jornal, revista, livro, carta, apostila etc., incluindo textos em braile, uso do computador portátil), virtual (acessibilidade digital).

Acessibilidade metodológica: sem barreiras nos métodos e técnicas de estudo (escolar), de trabalho (profissional), de ação comunitária (social, cultural, artística etc.), de educação dos filhos (familiar).

Acessibilidade instrumental: sem barreiras nos instrumentos, utensílios e ferramentas de estudo (escolar), de trabalho (profissional), de lazer e recreação (comunitária, turística, esportiva etc.).

Acessibilidade programática: sem barreiras invisíveis embutidas em políticas públicas (leis, decretos, portarias etc.), normas e regulamentos (institucionais, empresariais etc.).

Acessibilidade atitudinal: sem preconceitos, estigmas, estereótipos e discriminações, nas pessoas em geral. (SASSAKI, 2005, p.23)

O autor apresenta a acessibilidade como uma possibilidade dinâmica e não relacionada a uma condição que tente inserir o indivíduo na sociedade de forma ainda restrita, o que acaba por “segregar”Os conceitos de “segregação”, “integração” e “inclusão” diferem-se no modo de relacionar-se com a pessoa com deficiência. O primeiro trata de criar soluções específicas e separadas para o acesso de PCD, sem possibilidade de uso por uma pessoa sem deficiência, como privadas acessíveis em sanitários exclusivos, por exemplo. A integração também cria soluções específicas de acesso da PCD, mas de modo que ela possa estar inserida no contexto de pessoas sem deficiência, como assentos de privada para PCD inseridos em sanitários comuns. O terceiro conceito refere-se ao condicionamento para o acesso das PCD por meio de mecanismos universais, que atendam, do mesmo modo, tanto as condições de deficiência quanto às demais, como assentos de privada comuns tanto a PCD quanto a pessoas sem deficiências. ou “integrar” as pessoas com deficiência e não as “incluir” de forma plena na sociedade.

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Tem-se estruturado um painel de definições sobre acessibilidade, a começar pela legislação específica, no que trata das Leis de Acessibilidade, Prioridade e de Inclusão, passando pelas provocações de Sassaki (2008) e a proposta de inclusão de Lidwell et al (2010). Assim, pode-se compreender que o conceito de acessibilidade, ao invés de apontar para um caminho que proporciona acesso da pessoa com deficiência aos seus meios de vida, tomando-a como alguém que demanda algum tipo de cuidado “especial”, deve orientar para que tais meios devem ser comuns a todos, de modo que a acessibilidade não seja vista como uma “adaptação”, mas como uma premissa desde a origem de quaisquer projetos. É justamente nesse sentido que surge, em 1985, o conceito de Design Universal que seria tomado por base para a formulação de leis e normas que orientariam os caminhos futuros em busca de uma inclusividade da pessoa com deficiência.

São os órgãos governamentais e grupos de profissionais da área que devem trazer as orientações que viabilizam este processo de um design acessível, sob essa perspectiva da inclusão. Para isso, é necessário que os profissionais de desenvolvimento conheçam e façam uso das mesmas entendendo que a acessibilidade nas interfaces não é um elemento que impede ou onera sua criação, mas otimiza e abre espaço para todos os usuários, como apontam Zeldman e Marcotte (2010), ao fazerem uma discussão sobre os vários mitos criados acerca da acessibilidade em função da falta de conhecimento dos profissionais:

o cumprimento das diretrizes da acessibilidade não torna apenas o seu site disponível para milhões de pessoas que têm deficiência, mas também te ajuda a conquistar mais milhões, inclusive clientes que usam aparelhos móveis. (ZELDMAN; MARCOT-TE, 2010, p.305)

Entretanto, o conhecimento das normas passa pelo estudo dos princípios que lhes dão origem e inspiração, na medida em que sintetizam os objetivos a serem alcançados nos projetos que almejam se tornar acessíveis.

Design Universal, o que é afinal?

O conceito de Design Universal surge no ano de 1985, com as pesquisas realizadas por Ronald Mace, da Universidade Estadual da Carolina do Norte, e que tem como principal meta “desenvolver produtos e ambientes para serem usáveis por todas as pessoas, no maior número possível, sem a necessidade de adaptação ou design especializado” (MACE, 2008). Tendo como ponto de partida uma série de legislações estadunidenses para acessibilidade, a proposta intencionava ampliar a perspectiva que se tinha para soluções de acesso das pessoas com deficiência. Mace et al (1998) contam que:

Desde cedo, defensores do design sem barreiras e arquitetura acessível reconheceram o poder legal, econômico e social de um conceito direcionado às necessidades comuns das pessoas com e sem deficiências. Assim que os arquitetos começaram a lutar pela implementação de padrões, se tornou evidente que recursos acessíveis segregados eram “especiais”, mais caros e normalmente mais feios. Se tornou também evidente que muitas das mudanças ambientais que precisavam acomodar pessoas com deficiência na verdade beneficiavam a todos. A percepção de que muitos desses recursos poderiam ser normalmente oferecidos e de modo menos caro, sem rótulos, atraentes e ainda vendáveis, embasou a fundação do movimento de design universal. (MACE et al, 1998, p. 10).

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A Lei estadunidense da pessoa com deficiência (Disability Acts), de 2005, propõe uma síntese para o que seria uma definição mais abrangente para o conceito, de modo que Design Universal seria:

1. O projeto e construção de um ambiente tal que possa ser acessado, compreendido e usado por:

  • O maior número de pessoas possível;
  • Da maneira mais independente e natural possível;
  • No espectro possível de situações;
  • Sem a necessidade de adaptação, modificação, dispositivos assistivos ou soluções especializadas, por quaisquer pessoas de qualquer idade, tamanho ou possuindo quaisquer habilidades ou deficiências particulares física, sensorial, mental, intelectual ou de saúde e;

2. Em relação aos sistemas eletrônicos, quaisquer processos de criação, serviços ou sistemas baseados em produtos eletrônicos de modo que possam ser usados por qualquer pessoa. (NATIONAL DISABILITY AUTHORITY, 2012)

Projetos de produtos acessíveis, desenvolvidos especialmente para o atendimento de pessoas com deficiência não era algo novo nesse período. O que se configurava como uma nova proposta era o sua abrangência de implementação. Enquanto as “tecnologias assistivas” e as “engenharias de reabilitação” tinham como foco o atendimento das pessoas com deficiência, os projetos no Design Universal miravam para além destas. Como destacam Mace et al. (1998), alguns projetos de acessibilidade desenvolvidos inicialmente como tecnologias assistivas, acabaram se tornando peças de design comum a todos, como os óculos que têm sua origem ligada à correção de problemas na visão, mas que hoje expandiram seu uso para o conforto (óculos de sol) ou até mesmo para o uso meramente estético (óculos com lentes coloridas). Por outro lado, como exemplificam os autores, projetos desenvolvidos como soluções de performance para todos os usuários, acabaram se tornando ótimas ferramentas para pessoas com deficiência, como os dispositivos com reconhecimento de fala (MACE et al, 1998).

Neste sentido, em relação às categorias de posicionamento social da pessoa com deficiência apresentadas por Silva (2009), a proposta do Design Universal é viabilizar a “inclusão”, em detrimento da integração ou segregação, já alcançados por projetos acessíveis. É importante perceber que, em suas diversas definições, está sempre presente a expressão “quando possível”. Isso é relevante, pois conduz o Design Universal para além de uma proposta conceitual utópica, no sentido em que se posiciona em uma realidade na qual, em determinados contextos, ele pode se tornar inviável. Assim, por mais que se busque uma abrangência de acessos, deve-se reconhecer que existem situações em que isso não irá acontecer. Não se trata de uma tarefa simples reconhecer quando tais situações acontecem, já que parece ser mais simples evitar o Design Universal, uma vez que o caminho para alcançá-lo exige maior esforço, seja na atitude de concepção do projeto quanto nos acessos aos recursos tecnológicos para desenvolvê-lo. Para que essa “brecha” na proposta do Design Universal não sirva de desculpa para contorná-lo, faz-se necessária uma iniciativa do projetista que deve assumir sua responsabilidade frente à sociedade e tomá-lo como fundamental para o processo de inclusão da pessoa com deficiência.

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Estruturado inicialmente como uma filosofia que visava orientar projetos de arquitetura e design de produtos, o Design Universal acabou por seguir uma dimensão mais pragmática quando, em 1997, desenvolve um conjunto de diretrizes que visavam orientar aqueles projetos. Conhecidos como os sete Princípios do Design Universal, eles buscam abranger os aspectos de desenvolvimento de projetos de modo a atender ao maior número de usuários buscando o “1.Uso Igualitário; 2.Flexibilidade no Uso; 3.Uso Simples e Intuitivo; 4.Informação perceptiva; 5.Tolerância ao erro; 6.Baixo Esforço Físico e 7- Tamanho e espaço adequados para acesso e uso.” (THE CENTER FOR UNIVERSAL DESIGN, 1997, p.1, tradução nossa.). Cada princípio é dividido, por sua vez, em um conjunto de diretrizes que apontam os meios de alcançá-los. Esse material acabou por se tornar um guia para muitos projetos de design.

Enquanto um conceito orientado à inclusão, o Design Universal tornou-se uma fonte de referências importante para a elaboração de leis, acordos, diretrizes e normas para acessibilidade. Infelizmente, observa-se que é comum fazer-se confusão entre propostas de acessibilidade e de Design Universal. Embora muitas normas digam se basear nesta, acabam por orientar suas diretrizes naquelas. É claro que propostas de acessibilidade são sempre bem-vindas, principalmente quando o Design Universal não é possível, somente é importante destacar suas especificidades de modo que não se perca o alvo mais amplo proposto por este.

Originado no contexto de projetos arquitetônicos, sua implementação no design de interfaces e demais dispositivos relacionados ainda é um assunto relativamente pouco explorado. Verificar tais possibilidades permite o deslocamento para áreas carentes de projetos de Design Universal, em geral ainda muito restritos a projetos unicamente acessíveis. Como exemplo, as famosas “barras de acessibilidade” (figura 1) são muitas vezes confundidas com soluções universais, ignorando que se tratam de propostas segregacionais na medida em que não somente seu uso é orientado exclusivamente a pessoas com deficiência, como seu posicionamento destacado configura uma solução “exclusiva” para essas pessoas. O projeto de soluções realmente universais, embora cada vez mais viáveis por conta dos avanços tecnológicos, ainda não são comuns, em grande parte por conta dos padrões de acessibilidade propostos que acabam por caracterizarem-se como soluções mais “fáceis” na medida em que já estão desenvolvidas.

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Figura 1 - Barra de acessibilidade. Fonte: Site do Ministério da Educação - www.http://portal.mec.gov.br/ 40

O sete princípios do Design Universal

De modo geral, os princípios do Design Universal são indicativos de ações que visem criar ambientes com soluções para os usuários, sem que estes se sintam discriminados. Tendo como fim uma análise heurística, o grupo de autores da Universidade da Carolina do Norte sugeriu sintetizar tais conceitos, que chamaram de “Sete Princípios do Design Universal” (CENTRO DE DESIGN UNIVERSAL, 1997). Cada princípio, por sua vez, foi dividido em diretrizes que propõem orientar a avaliação e o desenvolvimento dos objetos. Esses princípios auxiliam na compreensão dos fundamentos do DU, ainda que, como em qualquer sintetização, acabam por deixar de fora diversos outros aspectos que podem ser importantes para a análise do produto. Essa parametrização ainda incorre no risco de se afastar da coisa mesma, entendida como a definição fundamental do DU no contexto em que foi concebido, se não for tomada somente como uma referência didática.

Os estudos de DU encontram espaço fértil na literatura acadêmica. Algumas publicações como Goldsmith (2000), Chisholm; May (2008) e Story; Mueller; Mace (1998) apresentam discussões exaustivas sobre o tema e foram importantes referências para a pesquisa. No entanto, para se analisar as interfaces propostas neste trabalho, optou-se aqui por utilizar como referência os “Sete Princípios do Design Universal” (CENTRO DE DESIGN UNIVERSAL, 1997) como apontamentos que auxiliam uma análise mais ampla de seu conceito. Isso se dá primeiramente em função de sua originalidade, pois se trata do documento síntese que deu origem ao conceito. Em segundo lugar, a organização sistematizada e objetiva do texto auxiliam seu uso como referencial. Apesar disso, percebe-se a necessidade de, eventualmente, rever a descrição de alguns de seus fundamentos, assim como adequar determinados tópicos, a fim de manter a essência dos Princípios conquanto permita-se verificá-los na interface devido à relação de uso em contexto específico, e que evidenciam, eventualmente, demandas específicas. Como já dito, esses princípios são tomados como uma bússola, que indica o norte, mas não o destino a que se quer chegar, tampouco o caminho a ser percorrido. A descrição dos princípios segue, portanto, a apresentação original dos autores (CENTRO DE DESIGN UNIVERSAL, 1997), acompanhados de exemplos em soluções de interfaces computacionais.

Princípio 1: “Uso igualitário: O design é eficiente e vendável a pessoas com habilidades diversas” - Este poderia ser entendido como o princípio funda-mental do DU, já que trata a preocupação com o atendimento ao maior número de usuários possível. Este princípio é subdividido em cinco diretrizes específicas, descritas a seguir.

Diretriz 1a: “Forneça as mesmas condições de uso para todos os usuários: idêntico quando possível; equivalente quando não.” No caso da interface, trata-se de oferecer os mesmos acessos aos conteúdos do site a partir dos mesmos recursos. A abertura para trabalhar com propostas idênticas ou equivalentes é muito importante, pois alguns recursos, particularmente quando orientados para pessoas com deficiência visual, terão que ser diferenciados, como, por exemplo, o acesso a uma informação a partir da audiodescrição de uma ação.

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Diretriz 1b: “Evite segregar ou estigmatizar qualquer usuário”. Esta diretriz diz respeito a soluções de interface que restringem ou inviabilizam o acesso ao conteúdo sem respeitar a diversidade de condições físicas, motoras e cognitivas dos usuários. Neste sentido, a sua aplicabilidade insere o usuário ao sistema em condições de igualdade no uso. As barras de acessibilidade, neste caso, embora tenham sua eficácia para pessoas com baixa visão ou até mesmo cegas, caracterizam-se como espaços segregadores, posto que são exclusivas para esses usuários. Uma solução não segregadora resultaria em uma página que dispensasse tal barra, sendo plenamente acessível em sua condição natural.

Diretriz 1c: “Soluções de privacidade, proteção e segurança devem ser igualmente disponíveis para todos os usuários”. Quando estas soluções são elementos obrigatórios em um sistema, as condições de uso devem reconhecer os diferentes perfis de usuário, e assim atendê-los de forma plena. Soluções de viva voz nas chamadas (quando o aparelho celular diz o nome da pessoa que está fazendo a ligação, tendo em vista pessoas cegas) infringem as condições de privacidade do usuário, por exemplo. Soluções que envolvam diferentes toques musicais ou vibrações são soluções mais adequadas nesses casos.

Diretriz 1d: “Faça o design atraente para todos os usuários”. Esta diretriz leva em consideração não só os aspectos do código sintático ou semântico da página, mas também se aproxima da experiência do usuário. Para Zeldman e Marcotte (2010), um dos mitos sobre a acessibilidade é de que para o site ser acessível é necessário que se force a criação de “desenhos primitivos e de baixa qualidade”, o que poderia, de certa forma, afastar o usuário de sites acessíveis por estes serem desinteressantes. Pode-se atender aos requisitos dos padrões e também fazer com que a interface seja atraente a todos os usuários desde que se conheçam os padrões e estes sejam verificados e inseridos no início do projeto.

Princípio 2: “Flexibilidade no uso: O design acomoda uma ampla gama de preferências e habilidades individuais.” De modo geral, é um princípio que visa expandir as possibilidades do objeto para o maior número de usuários possível. Neste caso, devem-se observar as condições de uso, os diferentes suportes e as características dos tipos de usuário. Tal cruzamento de informações deve resultar em uma interface capaz de atender, ainda que de forma adaptativa, a vários usuários distintos. Para tal análise, consideram-se as interfaces em dispositivos fixos (desktopComputadores de mesa, terminais etc.) e em dispositivos móveis (celulares, tabletsDispositivos móveis com telas sensíveis a toque que se diferenciam dos smartphones por não possuírem função de chamadas telefônicas., wearablesDispositivos eletrônicos que adornam o corpo ou funcionam como acessórios de vestuário. etc.). Como usuários, consideram-se as pessoas com deficiência visual, auditiva e motora, além daqueles que possuem condições cognitivas e culturais específicas, como usuários principiantes, pessoas estrangeiras, idosos e crianças, quando aplicável.

Diretriz 2a: “Forneça escolhas nos métodos de uso”. Refere-se às opções que podem ser oferecidas durante o acesso do usuário ao sistema. As opções de acionamento de uma tarefa via mouse, teclado ou voz enquadram-se como exemplo dessa diretriz.

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Diretriz 2b: “Acomode destros e canhotos no acesso e no uso”. No caso de interfaces para dispositivos desktop, essa diretriz está muito mais orientada para as interfaces físicas do que na interface gráfica propriamente dita. No caso de dispositivos móveis, entretanto, o posicionamento de botões de acionamento pode prejudicar os usuários canhotos, como o botão “atender” na interface dos sistemas iOS 8 e Android 4.4. Ambos os sistemas exigem que um botão seja deslizado da esquerda para a direita para que a chamada seja atendida, o que é um movimento mais fácil para o destro do que para o canhoto (figura 2). No entanto, o destravamento de tela do mesmo sistema Android permite que o botão de trava seja levado efetivamente para qualquer direção (figura 3).

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Figura 2 (à esquerda) - Chamada recebida na Interface do Android 4.4. Fonte: imagem do autor.
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Figura 3 (à direita) - Destravamento de tela na interface do Android 4.4. Fonte: imagem do autor.

Diretriz 2c: “Facilite a exatidão e precisão do usuário”. Botões que se movem, campos de busca muito pequenos, clicar e arrastar são exemplos de recursos de interface que dificultam a precisão do usuário. Algumas funções de mouse overPosicionamento do cursor sobre um elemento gráfico da interface que ativa automaticamente alguma função, como a abertura de um menu, por exemplo. sobre menus, por exemplo, exigem que o usuário tenha que localizar o cursor exatamente no percurso dos botões, já que, quando este sai da área sensível, o menu se recolhe.

Diretriz 2d: “Adapte-se ao ritmo do usuário”. Alguns sites ou aplicativos, por questão de segurança, exigem que o usuário preencha informações em um tempo breve, como os sistemas de tokens7. Código de segurança para acesso bancário. Algum tempo depois dessa análise, uma atualização no aplicativo permitiu a identificação via leitura de impressão digital, suprimindo o token. (figura 4) dos bancos. Uma vez que este tempo, em grande parte, não pode ser modificado, o usuário que não tem certa habilidade quanto à interface pode não conseguir preencher os campos ou acionar um comando a tempo. As recomendações indicam que o tempo de acesso possa ser personalizado pelo usuário. No caso de sistemas que exigem segurança, isso pode ser um problema, mas deve ser corrigido por outros meios que não seja o fator tempo.

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Figura 4 - Exemplo de token de banco para celular. Fonte: Imagem do autor.

“Princípio 3: Uso simples e intuitivo. Uso de um design de fácil compreensão, independente da experiência do usuário, repertório, domínio de linguagem ou nível atual de concentração.” Este é um princípio que está orientado para a dimensão cognitiva do uso. Observam-se atentamente os níveis de compreensão do usuário. Toma-se como referência, para isso, as descrições propostas por Lúcia Santaella (2007) sobre os tipos de usuário: novato, leigo e experto, e também o conceito de affordance de Donald Norman (2006).

Diretriz 3a: “Eliminar complexidade desnecessária.” Os conceitos de complexidade se assentam cientificamente nos estudos cibernéticos, que verificam a complexidade na relação entre a quantidade de elementos e as interferências entre si. (MORIN, 2005).

No campo da interface, estudos sobre a complexidade e usabilidade foram propostos por Bonsiepe (1968) e Tullis (1988), que propuseram métricas para avaliar a complexidade nas interfaces, nas quais soluções menos complexas resultariam de produtos com menos objetos, sendo estes ordenados entre si. Tais estudos fundamentariam a premissa de que a relação entre complexidade e usabilidade seria inversamente proporcional, entretanto, Comber e Maltby (1996) apresentam um estudo em que sugerem que interfaces mais complexas são as mais preferidas pelos usuários.

Certamente que essa discussão pode causar algumas confusões, se tomada pelo senso comum. Isso pode ser verificado, por exemplo, na análise de dois mouses diferentes (figura 5): enquanto o primeiro (à esquerda) é constituído de botões por toda a sua superfície, o segundo simplesmente omite qualquer presença destes. À primeira vista, este seria mais complexo, portanto, com menos usabilidade. Considerando-se, quanto às funções da interface, que o primeiro mouse apresenta as funções básicas, como por exemplo, localizar o ponteiro e clicar, deslizar e acionar, embora tenha mais botões, este se torna relativamente simples. Por sua vez, justamente pela total limpeza, o segundo possui maior incerteza das possibilidades de uso, já que qualquer ação é possível, como neste caso, visto que são possíveis outras tarefas além do clique, como arrastar e aumentar, por exemplo, elevando-se assim a dificuldade de compreensão por parte do usuário. Sendo assim, entende-se que o princípio, ao falar em “complexidade desnecessária”, está se aproximando de uma das diretrizes propostas por Nielsen e Molich (1990) na qual sugerem que a interface deve usar:

Diálogo simples e natural: os diálogos nunca devem conter informação irrelevante ou raramente necessária. Cada unidade estranha de informação em um diálogo concorre com unidades relevantes de informação e diminuem sua visibilidade relativa. Todas as informações devem aparecer em uma ordem lógica e natural. (MOLICH; NIELSEN, 1990, p.339)

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Deste modo, a verificação de compatibilidade com esta diretriz será tomada na avaliação da ocorrência de informações desnecessárias à tarefa, sem uma quantificação específica.

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Figura 5 - À esquerda exemplo de mouse para gamers. À direita, mouse da Apple.
http://cougargaming.com; http://www.apple.com

Diretriz 3b: “Seja consistente com as expectativas e intuição do usuário.” Os modelos mentais de realização de tarefa são definidos como “[...] nossos modelos conceituais de como os objetos funcionam, eventos acontecem ou pessoas se comportam, resultam de nossa tendência de formular explicações para as coisas.” (NORMAN, 2006, p.38). Tais modelos são fundamentais para se verificar como se estabelecem tais expectativas dos usuários e como a interface corresponde a elas. Um exemplo negativo ocorre nos terminais de banco onde a tecla verde, normalmente associada à confirmação de uma ação, possui a palavra “FIM” (figura 6). Isso pode levar o usuário a entender que ela encerra uma operação, e não que confirma uma ação específica.

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Figura 6 - Teclado físico do terminal do Banco do Brasil. Fonte: imagem do autor.

Diretriz 3c: “Acomode uma ampla variedade de domínios de leitura e linguagem.” Não somente a interface deve trazer o idioma nativo do usuário foco do conteúdo, como devem ser evitadas linguagens técnicas específicas de usuários avançados. Isso vale ainda para o uso de metáforas nos ícones, que nem sempre são compreendidas por todos, exigindo-se sempre a rotulação das imagens em linguagens mais comuns, ainda que isso possa interferir no uso de espaço da tela.

Diretriz 3d: “Organize informações consistentes com sua importância.” A hierarquia de informação é um fator de extrema relevância para evitar que o usuário trace percursos desnecessários na navegação. Por isso, as informações mais importantes devem estar em maior evidência, seja pelo tamanho, formato ou posição na tela.

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Diretriz 3e: “Ofereça alertas e respostas efetivas durante e após o término da tarefa.” A resposta é um fator importante na medida em que previne que o usuário erre ao executar uma tarefa mais de uma vez. É importante destacar a importância dos avisos de carregamento, muito comuns em arquivos mais pesados, como vídeos, para que o usuário saiba que o acionamento destes foi recebido pelo sistema, mas que está sendo processado.

Princípio 4: “Informação perceptível: O design comunica efetivamente a informação necessária ao usuário, independentemente de condições ambientais ou das habilidades sensoriais do usuário.” Trata-se do uso de diferentes recursos sensórios que permitem que os usuários comuns e com alguma deficiência, em ambientes não adequados, tenham acesso às informações.

Diretriz 4a: “Use modos diferentes (pictórico, verbal, tátil) para redundância de apresentação de informações essenciais.” O clique de um gráfico pode não ser percebido por um usuário cego, a menos que tenha uma resposta sonora. Da mesma forma, um usuário surdo pode não saber que um efeito sonoro que indica erro está acontecendo se não tiver uma resposta visual correspondente. Em dispositivos móveis é relevante ainda considerar as respostas táteis permitidas pelos mecanismos vibratórios dos equipamentos.

Diretriz 4b: “Forneça contraste adequado entre informações essenciais e seus entornos.” Relacionado com o conceito de pregnância da forma nos estudos da Gestalt, essa diretriz orienta tanto para a organização dos elementos quanto para a escolha na sua forma, de modo a permitir sua diferenciação e consequente visibilidade na interface. Esta diretriz dialoga com a diretriz 3d, que trata da hierarquia de informações. Além de determinar quais são as informações mais importantes, deve-se evidenciá-las das demais que estão no entorno. No aspecto da sonoridade, necessita-se evitar que vários sons concorram entre si, dificultando a sua percepção (Ex.: o som de um botão clicando que se mistura com uma música de fundo do site).

Diretriz 4c: “Maximize a “legibilidade” de informações essenciais.” Para que uma informação seja corretamente recebida, ela precisa ser compreendida. Neste caso é importante que se trate dos aspectos de legibilidade e leiturabilidade, não somente no âmbito tipográfico, como também na leitura das imagens, muitas vezes usadas em ícones e figuras descritivas. No aspecto sonoro, isso é um grande desafio quando se trata da audiodescrição. É essencial permitir a alteração de velocidade da voz, assim como sua intensidade e timbre, de modo a facilitar a compreensão pelo usuário.

Diretriz 4d: “Diferencie elementos de modo que possam ser descritos (i.e., torne fácil dar instruções e direções).” A audiodescrição é totalmente dependente do modo como são apresentados os elementos na interface. Assim, recursos de acionamento com muitos detalhes ou elementos de difícil descrição, tendem a dificultar a compreensão. Os posicionamentos precisam ser evidentes e padronizados, de forma a facilitar sua descrição.

Diretriz 4e: “Forneça compatibilidade com uma variedade de tecnologias e dispositivos usados por pessoas com limitações sensoriais.” Todo o sistema deve permitir a entrada de adaptadores, desde um simples fone de ouvido, a câmeras e outros conectores mais específicos de acessibilidade, como os sistemas de audiodescrição.

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Princípio 5: “Tolerância ao erro: O design minimiza perigos e consequências adversas de ações acidentais ou não intencionais.” A interface se apresenta de modo que se evite ao máximo o erro do usuário, e quando este acontecer, deve ajudá-lo a corrigi-lo da forma mais simples possível.

Diretriz 5a: “Organize elementos para minimizar perigos e erros: elementos mais usados, mais acessíveis; elementos perigosos, eliminados, isolados ou protegidos.” Na interface, ações de “apagar” e “enviar” devem ser menos evidentes que “corrigir” ou “cancelar”, por exemplo.

Diretriz 5b: “Forneça avisos de perigos e erros.” Alguns formulários exigem o preenchimento de determinados campos para que sejam enviados. O sistema deve deixar claro quando alguns destes campos não são preenchidos ou preenchidos incorretamente. Isso deve ser bastante evidente, para que o usuário siga o próximo passo. Com a mesma importância devem ser os avisos das ações sem retorno, como “salvar” ou “enviar”, por exemplo. Normalmente, uma legenda com o texto “Esta ação não pode ser desfeita” é uma solução que ajuda nesta diretriz.

Diretriz 5c: “Ofereça recursos que previnem erros.” Ações definitivas (como “enviar”, por exemplo) devem ser antecedidas de avisos que informem as consequências da ação e solicitem a sua confirmação. Botões como “comprar com 1-clique” (figura 7) devem ser rigorosamente evitados ou minimamente ter seu acesso menos evidente.

Ainda nesta diretriz estão as condições de corrigir um erro. Um exemplo é o aviso de que o envio de um formulário ainda pode ser cancelado algum tempo depois, ou que seja apresentado um resumo da tarefa de modo que alguma questão ainda possa ser corrigida.

Qual o princípio do desenho universal não se permite ações inconscientes?
Figura 7 - O botão “comprar com 1-Clique” efetiva uma ação sem passar por uma série de etapas que verificam a certeza da ação. fonte: www.amazon.com.br.

Diretriz 5d: “Desestimule ações inconscientes em tarefas que requerem atenção”. Formulários com auto-preenchimento de campos estimulam ao usuário saltá-los sem verificar o que foi inserido. Embora possam agilizar a tarefa, abrem margem significativa para erros. Do mesmo modo, botões que determinam tarefas definitivas não devem ficar em posições muito evidentes ou padronizadas que exijam do usuário a leitura correta da informação antes de executar tais tarefas. No aplicativo Inbox de gerenciamento de e-mails para Android, a ação de “mover para a lixeira” está reservada dentro do menu de tarefas do gerenciador (figura 8)Após a análise desta interface, o aplicativo fez uma atualização que apresenta o atalho para a lixeira no menu superior, assim que o e-mail é acessado.. Ao contrário das ações de “lembrar”, “ler mais tarde” e “fixar”, que são reversíveis e têm seus ícones evidentes na tela, as ações de “lixeira”, “spam” e “remover das atualizações”, como não podem ser facilmente desfeitas, ficam com acesso mais restrito para que o usuário não as acione acidentalmente.

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Qual o princípio do desenho universal não se permite ações inconscientes?
Figura 8 - Sequência que apresenta a ação de “excluir e-mail” no aplicativo “Inbox”. Fonte: Imagem do autor.

Princípio 6: “Mínimo esforço físico: O design pode ser usado eficientemente e confortavelmente com um mínimo de fadiga.” O esforço físico, além de aumentar a probabilidade de erros, impede que alguns usuários possam acessar adequadamente o conteúdo.

Diretriz 6a: “Permita ao usuário manter uma posição corporal neutra.” Essa diretriz não se restringe à posição de assento do usuário frente a um desktop, mas também à posição de pé diante de um terminal, assim como o movimento das mãos em um dispositivo móvel. Uma interface adequada deve permitir que o usuário com baixa visão mantenha sua postura cervical correta enquanto observa a tela, assim como é preciso que um dispositivo móvel permita o acionamento das teclas sem muito esforço no movimento dos dedos. Um exemplo negativo tem sido alguns mouses para netbooks (figura 9) que, para “economizar espaço”, são muito pequenos e exigem movimentos não naturais das mãos. Para os canhotos, isso é um problema particular, já que boa parte das interfaces não leva em consideração este público.

Diretriz 6b: “Use forças de operação razoáveis” Mouses muito pesados ou celulares muito grandes são exemplos de interfaces que exigem um esforço maior que o necessário. No âmbito da interface gráfica, não foram encontradas situações de esforço.

Diretriz 6c: “Minimize ações repetitivas.” Algumas interfaces exigem do usuário que este repita ações, como, por exemplo, o processo de seleção de várias imagens para exibição. Deve-se, neste caso, habilitar o recurso de seleção em grupo pelo uso de atalhos específicos (lembrando que o acionamento de mais de duas teclas concomitantes é um impedimento para usuários com adaptadores de teclado).

Diretriz 6d: “Minimize o esforço físico continuado”. Algumas ações não acarretam esforço físico quando executadas na primeira vez, mas tornam-se mais pesadas pela exigência de repetição. Teclas muito duras tornam-se cansativas após um período muito longo de uso.

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Figura 9 - Mouse para netbook. Fonte: Geeky Gadgets. http://bit.ly/1MrKKpp .

Princípio 7: “Tamanho e espaço para acesso e uso: Tamanho e espaço apropriados são fornecidos para acesso, busca, manipulação e uso independentemente do tamanho do corpo do usuário, postura ou mobilidade.” Os diversos tamanhos de usuário devem ser respeitados nas interfaces. Alguns comandos de teclados ou de toque na tela exigem que o usuário tenha uma distância maior entre os dedos, dificultando o acesso de pessoas menores.

Diretriz 7a: “Forneça uma faixa clara de visão para elementos importantes para qualquer usuário sentado ou de pé.” Originalmente pensado para incluir usuários cadeirantes, no caso da interface gráfica, verifica-se maior relevância no que trata do tamanho de algumas telas menores, cuja ausência de responsividade do layout resulta em elementos minúsculos na tela, impedindo sua visibilidade.

Diretriz 7b: “Permita o alcance a todos os componentes confortáveis para qualquer usuário sentado ou de pé.” Enquanto telas muito pequenas dificultam a leitura, telas de entrada de toque muito grandes dificultam o acesso com uma única mão, exigindo do usuário o comprometimento das duas mãos, aumentando o esforço no uso da tela. Alguns comandos exigem ainda grande precisão por se apresentarem como campos muito pequenos na interface. Isso se constitui um problema para usuários com limitações motoras.

O acesso a cadeirantes se torna mais relevante no caso dos terminais de acesso, em que a tela tem uma posição fixa de difícil acesso quando se está sentado (figura 10).

Qual o princípio do desenho universal não se permite ações inconscientes?
Figura 10 - Terminal de pagamento de estacionamento. Fonte: http://www.taguatingashopping.com.br/blog/tag/pague-aqui/. 49

Diretriz 7c: “Permita variações de tamanho na pega e no manuseio.” Enquanto mãos muito pequenas não conseguem acessar botões distantes entre si com mínimo esforço, mãos maiores precisam de maior precisão para acionar corretamente alguns comandos. O layout deve garantir uma flexibilidade que permita a adequação aos vários tipos de usuários.

Conclusão

De modo geral, verifica-se que esses “princípios”, quando devidamente discutidos no contexto dos estudos de interface, apresentam desafios bastante específicos. É válido ressaltar, como já dito, que o DU é para produtos universais. Sendo assim, embora as discussões tenham incluído ao máximo as variedades de usuários na análise específica dos sites, é necessário levar em consideração seu contexto de uso e o perfil geral dos usuários, de modo a se tornar mais realista a busca por se aproximar desses princípios.

É interessante observar que, mesmo orientado em princípio para projetos arquitetônicos, os princípios do Design Universal podem ser assimilados por projetos de interfaces computacionais sem maiores esforços epistemológicos.

Outro fator relevante nessa descrição e análise é o fato de perceber que a relação do usuário com as interfaces computacionais não se restringe à sua dimensão cognitiva, mas também deve observar as interfaces físicas e, eventualmente, as cognitivas, segundo a taxionomia apresentada por Cleomar Rocha (2014). Assim, tão importante quanto observar o design de um botão em um site é verificar o mouse que é utilizado ou a iluminação ambiente para o reconhecimento facial de um aplicativo.

Por fim, as orientações do Design Universal podem ainda, como princípio metodológico, colocar a questão da inclusão não somente como uma variável a posteriori no projeto de interfaces, mas considerá-la como ponto de partida do design. Nessa perspectiva, se um produto é desenvolvido de antemão seguindo tais princípios ele pode se tornar uma via rica para a inovação, na medida em que soluções universais orientam para uma outra visada dos objetos. Ainda há um longo caminho a percorrer, mas as indicações já estão postas.

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Quais são os princípios do desenho universal?

Os sete princípios do Desenho Universal IGUALITÁRIO - Uso equiparável (para pessoas com diferentes capacidades); ADAPTÁVEL - Uso flexível (com leque amplo de preferências e habilidades); ÓBVIO - Simples e intuitivo (fácil de entender); CONHECIDO - Informação perceptível (comunica eficazmente a informação necessária) ...

É que o autismo é um distúrbio do comportamento que consiste em uma tríade de dificuldades?

Segundo Mello (2007), o autismo é um distúrbio do comportamento que consiste em uma tríade de dificuldades, são elas: dificuldade de comunicação, dificuldade de sociabilização e dificuldade no uso da imaginação.

Qual a definição do autismo adotada pela AMA Segundo Mello 2007?

Autismo é uma síndrome definida por alterações presentes desde idades muito precoces, tipicamente antes dos três anos de idade, e que se caracteriza sempre por desvios qualitativos na comunicação, na interação social e no uso da imaginação. (MELLO, 2007, p. 16).

O que é o desenho universal para a aprendizagem?

O Desenho Universal para Aprendizagem (DUA) é uma abordagem que procura minimizar as barreiras metodológicas de aprendizagem, tornando o currículo acessível para todos os alunos, pois possibilita a utilização de diversos meios de representação do conteúdo, de execução e de engajamento na tarefa.