Com quem foi realizado o projeto de Vik Muniz

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Lixo Extraordinário é um filme que mostra o estatuto da arte e a questão do lixo na sociedade contemporânea, o árduo trabalho dos catadores e a possibilidade de transformação que a mudança da percepção artística pode proporcionar.

 Mariana dos Santos Reis Souza (*)

O mundo tem muitas coisas boas a oferecer para quem tem a ousadia de buscar” (Vik Muniz)

 Vicente José de Oliveira Muniz, conhecido como Vik Muniz, nasceu em São Paulo, no dia 20 de dezembro de 1961. Formou-se em Publicidade na Fundação Armando Álvares Penteado – FAAP, em São Paulo. Em 1983, mudou-se para Nova Iorque. Hoje é reconhecido mundialmente.

Com quem foi realizado o projeto de Vik Muniz
O artista Vik Muniz já foi pobre e viveu em um bairro de classe média baixa em São Paulo. Começou com trabalhos simples e conseguiu sucesso com suas obras artísticas. É reconhecido por incorporar objetos do cotidiano no processo fotográfico para criar imagens ousadas e geralmente enganosas. Seu processo de trabalho consiste em compor imagens com os materiais, normalmente perecíveis, sobre uma superfície e fotografá-las, resultando no produto final de sua produção. As fotografias de Vik fazem parte de acervos particulares e também de museus de Londres, Los Angeles, São Paulo e Minas Gerais.

Em 2010, produziu um documentário intitulado “Lixo Extraordinário”, com catadores de lixo, rodado no Jardim Gramacho, maior aterro sanitário da América Latina, localizado na cidade de Duque de Caxias, cidade localizada na área metropolitana do Rio de Janeiro. A filmagem recebeu um prêmio no festival de Berlim na categoria Anistia Internacional e no Festival de Sundance. A ideia do documentário surgiu após uma conversa com um diretor de seu estúdio no Rio de Janeiro, pois pensava em fazer um trabalho social em um lixão a fim de ajudar a população de lá.

Foi nesse lixão que Vick descobriu, em conversa com os catadores, que muitos corpos acabavam indo parar no lixão, mas também descobriu que no lixo tem muitas pessoas que tiram o sustento de suas famílias. Infelizmente, os Sobreviventes do Lixão ainda convivem com a violência e insegurança no estado do Rio de Janeiro. Vick fez um trabalho junto com os catadores tirando fotos do dia-a-dia, das pessoas do lixão e com vários catadores montou uma obra de arte usando lixo orgânico na montagem de uma delas.

Com quem foi realizado o projeto de Vik Muniz
Nas palavras do artista: “A ideia de você criar uma construção a partir de um material, cuja estética, pela associação ao significado do lixo, já está muito poluída, já impregna tudo que não é usável. Você pegar aquilo e fazer uma coisa bonita, você já está recarregando o potencial desses materiais com a promessa de reutilização. Quase tudo é reutilizável.”

O lixão de Gramacho recebe lixo de 70% do Estado do Rio de Janeiro e 100% de Duque de Caxias. Abriga também uma população carente residindo naquela região onde muitas vezes são encontrados corpos em meio ao lixo e sem contar o perigo do gás metano que sai do solo devido a decomposição do lixo. Hoje existe uma associação de catadores de material reciclável.

É por isso que um dos temas centrais do filme discorre acerca da questão do lixo nas sociedades contemporâneas. Afinal, vivemos num momento em que a capacidade de produção e consumo de mercadorias foi elevada a níveis altíssimos. Ademais, a duração das mercadorias diminuiu muito, pois a lógica do capitalismo atual pressupõe uma crescente obsolescência dos produtos, fato que contribui para que o lixo seja um dos grandes problemas da atualidade.

Segundo Marques e Senna, o documentário “Lixo Extraordinário” apresenta a vida miserável dos catadores, a pobreza de suas casas, a sujeira do ambiente de trabalho, os quais tomados juntos com o silenciamento de seus anseios e dores e a invisibilidade de seus corpos e gestos, evidenciam o dano que marca esses que não têm parcela na comunidade. De acordo com os autores,

Vik Muniz é um agente que motiva as mudanças nas vidas dos catadores, mas eles próprios revelam-se além daquilo que era ‘esperado’: não foi somente participar da elaboração de uma obra de arte que os fez descobrirem-se como sujeitos políticos, mas também a sua intelectualidade, suas palavras e sonhos, foram determinantes para alterar imaginários, fabricar novas lentes para olharem para si mesmos e para tornar concretas formas de emancipação e de autonomia.”

 Sebastião, Ísis, Valter, Zumbi, Irmã, Magna, Suellem são as personagens que fazem parte da trama do documentário, retratando assim pessoas que vivem numa situação limítrofe, ou seja, que têm de lutar para não se sentirem párias sociais.

Ficha técnica Gênero: Documentário Duração: 90 minutos Lançamento: 2010 Produção: Brasil / Reino Unido

Direção: Lucy Walker / Codireção: João Jardim e Karen Harley

Vik Muniz é um artista plástico brasileiro reconhecido internacionalmente que trabalha com materiais inusitados. Chocolate, feijão, açúcar, manteiga de amendoim, leite condensado, molho de tomate, gel para cabelo, geleia e produtos reaproveitáveis são algumas das suas principais matérias-primas.

Suas criações carregam uma forte preocupação social e com o futuro do meio ambiente. Instalado nos Estados Unidos desde a sua juventude, atualmente os trabalhos de Vik Muniz estão espalhados pelos quatro cantos do planeta.

Conheça agora algumas das suas principais criações.

1. Lampedusa

A instalação criada em 2015 e apresentada na Bienal de Veneza é uma dura crítica feita pelo artista as políticas europeias contra a abertura da fronteira aos refugiados.

O barco, feito simulando uma dobradura infantil e supostamente construído a partir de ampliações de jornais, foi disposto num dos principais canais de Veneza e lembrava os espectadores da morte de refugiados que encontravam-se na costa italiana.

2. John Lennon

O cantor inglês, ícone do pop, membro dos Beatles, ganhou um retrato feito a partir do café. Os grãos são responsáveis por definir o seu contorno e o seu cabelo enquanto os olhos são representados por um par de xícaras cheias.

Vik Muniz consegue criar uma belíssima peça com apenas quatro elementos: o fundo liso, os grãos, as xícaras e o café pronto dentro delas. Após ser criada, a instalação foi fotografada e então exibida em mostras.

3. Double Mona Lisa (Peanut butter and jelly)

Com quem foi realizado o projeto de Vik Muniz
Com quem foi realizado o projeto de Vik Muniz

Nesse trabalho, Vik Muniz recriou a obra clássica de Leonardo da Vinci, a Monalisa. Mas ao dar forma a misteriosa moça escolheu dois elementos particulares e bastante cotidianos: a geleia de uva e a manteiga de amendoim. Apenas com essas duas matérias-primas e um fundo branco liso, o artista foi capaz de dar corpo a pintura. O trabalho foi realizado em 1999 e tem as seguintes dimensões: 119,5 x 155 cm.

O uso de materiais inesperados e efêmeros para a composição das peças é justificado pelo próprio artista:

“A arte é sobretudo a habilidade de olhar para uma coisa e enxergar outra”.

4. Sugar children

A série Crianças de açúcar, criada em 1996, alçou Vik Muniz para a fama. Esse foi o seu primeiro trabalho a ter repercussão e a levá-lo a ser reconhecido internacionalmente. As imagens são de crianças caribenhas oriundas de famílias pobres que cortam canas de açúcar nas plantações em St. Kitts.

Vik fotografou essas crianças e depois reconstituiu os contornos usando somente açúcar, elemento que faz parte do cotidiano desses jovens. O açúcar é uma referência tanto a doçura e a pureza das crianças como ao material que as condena a pobreza.

A respeito da criação, Vik Muniz conta em entrevista os bastidores da ideia:

"O Sugar Children” tem muito a ver com a fotografia, já que o açúcar é um cristal e a fotografia é um cristal prateado exposto à luz. É uma série pontilhista feita com açúcar sobre papel preto e depois fotografada em prata de gelatina. Isso desencadeou algo muito importante. Em 1992, passei as férias na ilha de St. Kitts e brincava com as crianças locais em uma praia de areia preta. Estas eram crianças de plantações de açúcar. No meu último dia eles me levaram para conhecer seus pais e me surpreendeu o quão tristes e cansados eles estavam. Como essas crianças se tornaram esses adultos? Concluí que a vida tirara sua doçura deles. Esses retratos em açúcar agora estão em várias coleções importantes, mas também na pequena biblioteca da escola infantil de St. Kitts. Eu devo muito a essas crianças."

O trabalho acima foi realizado em 2008 no lixão de Gramacho, baixada do Rio de Janeiro. O aterro sanitário escolhido por Vik Muniz como cenário de uma das suas mais importantes criações foi o maior lixão a céu aberto da América Latina.

No local, Vik contou com a ajuda dos catadores de lixo que já habitualmente trabalhavam em Gramacho. Primeiro fotografou-os, depois, com material recolhido no próprio lixão, montou as fotografias em dimensões gigantes num depósito próximo. Todo o projeto foi registrado e deu origem ao consagrado documentário Lixo extraordinário.

6. Track brawl

Criada em 2000, Track brawl atualmente pertence a consagrada coleção The Frick Pittsburgh.

A fotografia, com 61cm x 50,8cm de dimensões, é intitulada de modo literal (a tradução para o português seria "briga de pista") e representa, literalmente, uma disputa entre dois indivíduos em cima dos trilhos de um trem.

7. Paparazzi

A obra Paparazzi faz parte de uma coleção composta a partir de xarope de chocolate da marca Bosco. Esse trabalho foi posterior ao das crianças de açúcar, quando Vik começou a despertar o olhar para materiais inesperados. Vale lembrar que Hitchcock usou xarope de chocolate Bosco para realizar a famosa cena do chuveiro porque o sangue real não era suficientemente sangrento na tela.

Ao contrário da série produzida a partir do açúcar, que podia levar muito tempo para ser confeccionada, nas peças produzidas com chocolate o artista precisava ser rápido, caso contrário, ficaria seco e sem o brilho necessário.

8. Che, à maneira de Alberto Korda

O ícone cubano Che Guevara ganhou contornos bastante peculiares ao ser reproduzido por Vik Muniz a partir de feijão enlatado. O sujeito que ficou marcado como o retrato da revolução cubana foi reinterpretado com feijões porque o alimento é uma comida típica de Cuba.

A peça foi criada no ano 2000 e é grande, trata-se de uma impressão com 150,1 cm por 119,9 cm.

9. Principia

Com quem foi realizado o projeto de Vik Muniz

O objeto criado em 1997 que foi batizado com o nome de Principia possui 18,1 cm por 27,6 cm e é composto por fotografias, vidro estereoscópico, madeira e couro.

Muniz criou uma série com 100 objetos idênticos numerados, um deles encontra-se no MAM do Rio de Janeiro e foi doado pelo Clube de Colecionadores de Gravura MAM de São Paulo.

10. Torre Eiffel

A criação, datada de 2015, faz parte da série Postcards from nowhere. A representação de Paris feita a partir do olhar de Vik Muniz ganha contornos completamente diferentes porque o trabalho é todo realizado a partir de recortes de cartões postais.

Na peça foram utilizados centenas de cartões da cidade luz que, colados, compõem a célebre paisagem da capital francesa.

A capa do CD Tribalistas feita por Vik Muniz

A capa do CD “Tribalistas” (2002) foi feita com calda de chocolate. O artista plástico foi convidado pelo trio para dar a cara do álbum que se tornou icônico na música brasileira.

Com quem foi realizado o projeto de Vik Muniz

Vik Muniz conta sobre os bastidores da criação e sobre a encomenda feita pelos por Arnaldo Antunes, Marisa Monte e Brown:

Com quem foi realizado o projeto de Vik Muniz

Afinal, quem é Vik Muniz?

Vicente José de Oliveira Muniz, conhecido no meio artístico apenas como Vik Muniz, nasceu em São Paulo no dia 20 de dezembro de 1961. De origem humilde, o pai do artista era garçom e a mãe telefonista, Vik foi basicamente criado pela avó até imigrar para os Estados Unidos, onde acabou por desenvolver seu trabalho nas artes plásticas.

É possível encontrar obras de Vik Muniz em grandes cidades como Paris, Los Angeles, São Francisco, Madri, Tóquio, Moscou e Londres (na capital da Inglaterra há peças suas tanto no Victoria & Albert Museum quanto no Tate Modern).

No Brasil há trabalhos expostos no MAM de São Paulo e em Minas Gerais, no Museu do Inhotim.

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Autorretrato feito por Vik Muniz com pedaços de papel.

O documentário Lixo extraordinário (Waste Land)

A criação retrata a viagem feita por Vik Muniz da sua segunda casa - os Estados Unidos - para o Brasil. O artista resolve desenvolver um trabalho a partir do Jardim Gramacho, o maior depósito de lixo a seu aberto da América Latina.

O filme foi um sucesso de público e crítica chegando a ser indicado ao Oscar. O documentário recebeu o prêmio do público nos festivais de Sundance e Berlim.

Com quem foi realizado o projeto de Vik Muniz
Cartaz do filme Lixo Extraordinário.

Quem ajudou Vik Muniz nessa empreitada artística foram os catadores, trabalhadores de recolhem material reciclável. Os trabalhadores foram fotografados e as imagens foram reproduzidas em escala gigante, a partir do material coletado no próprio lixão.

O cineasta responsável pelo documentário foi Lucy Walker.

O resultado está disponível na íntegra, trata-se de um belíssimo documentário com 90 minutos de duração:

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