Pensando na sustentabilidade ambiental algumas empresas já se utilizam da logística reversa

Bianca Zanatta, Especial para o Estadão

30 de junho de 2021 | 05h01

  • Logística reversa em pequena empresa inclui criatividade e ajuda do cliente
  • Cuidar do lixo dos outros é mote para empresas em indústria milionária

A prática da logística reversa, de cuidar do lixo dos outros, virou modelo de negócio para algumas empresas. O Brasil perde R$ 14 bilhões por ano com falta de reciclagem de lixo. São 12 milhões de toneladas de resíduos sólidos desperdiçados, como 6 milhões de toneladas de plásticos e 4,7 milhões de papel e papelão, segundo dados da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe).

E, se tem muito lixo no País, isso vira dinheiro na mão de empresas. É o caso da Yesfurbe, plataforma brasileira de compra e venda de smartphones refabricados. Fundada em 2018, a startup tem a missão de incentivar o consumo sustentável por meio do recondicionamento de aparelhos seminovos em boas condições de uso, além de oferecer produtos de alta tecnologia com preços mais acessíveis ao consumidor final.

A empresa também é uma alternativa para pessoas que não sabem o que fazer com um aparelho antigo ou possuem dificuldades na revenda, trocando-o por créditos para adquirir um modelo refabricado ou um novo. Esses processos podem ser realizados tanto pelo e-commerce da marca como em marketplaces e varejistas parceiros.

Danilo Martins, CEO da Yesfurbe, define o modelo como “recommerce”. “Compramos e vendemos celulares usados do mercado e fazemos toda uma logística reversa para trazer esses aparelhos que captamos dos varejistas”, ele conta.

“Temos uma plataforma sistêmica que já é integrada aos nossos principais parceiros de logística. No momento em que é feita a compra de um aparelho novo no varejo - ou seja, o cliente vai até a loja, compra um novo e dá o antigo como forma de pagamento -, a gente compra e faz a coleta (para consertar e vender novamente).”

Numa pegada parecida, a marca de calçados veganos Ahimsa busca fechar o ciclo de vida de seus produtos criando formas de o cliente devolver os sapatos que considera não terem mais usabilidade. Com a iniciativa (RE)cycle, a empresa faz o reaproveitamento dos materiais que já existem ou já foram industrializados antes de buscar novos materiais.

“Basicamente, o cliente nos devolve um produto usado, nós reciclamos ou doamos e ele recebe um crédito para uma nova compra”, resume Gabriel Silva, fundador e CEO. “Assim tiramos um produto do lixo e incentivamos uma nova compra. Economia circular mesmo.”

Para todos

Fazer a logística reversa no ramo de estética, beleza, perfumaria e cosméticos é a premissa da Reciclo Beleza Sustentável, dona de um modelo “para todos” que atende a negócios pequenos, médios ou grandes do ramo. 

“Damos uma destinação ambientalmente adequada às embalagens de todas as marcas por meio dos nossos pontos credenciados e máquinas de coleta, ajudando os clientes a conquistarem mais clientes com um programa de pontos e fidelidade sustentável”, afirma Fábio Roberto da Silva, sócio da empreitada. “Com isso eles passam a ter nosso selo Reciclo Beleza, nosso certificado ambiental e outros benefícios, que ajudam a tornar os negócios mais ágeis, rentáveis e atrativos.”

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Está para sair do papel no segundo semestre também a Loop Green, braço de tecnologias verdes da empresa para cuidar dos resíduos mais difíceis de reciclar do segmento, como esmaltes, batons e brilhos labiais. 

    les serão coletados e levados para a Loop Green, que vai pleitear vaga na Fapesp para desenvolver soluções que os transformem, por exemplo, para uso na mobilidade urbana, como em recapeamento de ciclovias.

    Coleta e reciclagem de cartuchos

    O descarte de cartuchos e outros insumos de impressão pode ser um problema ambiental grave. Consciente disso, a Reis Office, empresa de outsourcing de impressão, começou uma campanha de logística reversa já em 2008, dois anos antes da criação da PNRS.  “Para implantar muitos procedimentos precisamos ser firmes, pois é uma mudança de cultura e isso se dá com a comunicação bem feita, mostrando as necessidades de cuidar do ambiente”, afirma o fundador, José Martinho Reis.

    No início da campanha, eram recolhidos cerca de 5 mil cartuchos por ano. Agora são 25 mil. Em parceria com as fabricantes, a empresa faz a coleta mensalmente e fica responsável pela separação e pelo armazenamento até as empresas credenciadas levarem para o descarte final. 

    São gerados um laudo e um certificado que atestam toda a operação, oferecendo a garantia de que os toners e cartuchos usados serão destinados ao processo de descaracterização, que consiste na desmontagem e aproveitamento dos subprodutos derivados (plástico, metal e pó de toner). “O material é então reciclado, evitando sua transferência ao aterro sanitário e consequentemente a degradação do meio ambiente”, esclarece Reis.

    Papel social e educação ambiental

    Muitas coisas têm que acontecer para que os negócios consigam realizar de fato a logística reversa. Segundo Auri Marçon, presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria do Pet (Abipet), é importante entender que o primeiro passo está na mudança do perfil de consumo.

    “O cerne da logística reversa está em entender que precisa ser uma responsabilidade compartilhada e encadeada envolvendo três pilares, que precisam funcionar em equilíbrio para dar certo: poder público, setor privado e cidadão”, diz o especialista. 

    Ele fala que, apesar de o setor público (municípios) ser responsável pela coleta seletiva, hoje um porcentual muito pequeno das cidades brasileiras a faz. “Acreditamos que não chegue a 20%”, relata. “Então o setor privado recebeu essa incumbência via PNRS - ‘esse filho é seu, precisa dar destinação a isso”, afirma Marçon. E as empresas já têm ciência disso, de acordo com ele. 

    “Apesar de a grande maioria ainda não conseguir fazer a logística reversa, grandes empresas já têm a estratégia equacionada e as pequenas e médias estão caminhando para fazer.”

    Só que nada disso é possível sem educação ambiental. “As pessoas precisam escolher produtos que sejam ambientalmente mais amigáveis, como o pet, por exemplo, que é altamente reciclável, e ter o hábito do descarte adequado”, ele alerta. O outro ponto de destaque, claro, é a melhoria nos sistemas de coleta. 

    “Porque hoje o grande problema é que esse material ainda é enterrado. Então tem que ter coleta pública somada a outras alternativas. Para ter ideia, no caso do pet, de 70% a 75% de tudo que é reciclado hoje vem de fluxos alternativos, como sucateiros, catadores e cooperativas”, aponta o executivo. “É um modelo que o Brasil criou e que gera renda, resolve uma questão social que encaixa muito bem na sustentabilidade.” 

    Marçon destaca que antes o Brasil não tinha parque industrial para atender à demanda de reciclagem, mas que hoje o gargalo está justamente na outra ponta da cadeia. Há de 30% a 40% de ociosidade no parque industrial, que não recebe os recicláveis que tem capacidade para transformar. No caso dos pequenos negócios, portanto, ele acredita que sejam necessários dois focos: papel social e educação ambiental. 

    “Porque essas empresas não conseguem estruturar suas próprias recicladoras, mas conseguem focar na parceria com cooperativas e na comunicação com o consumidor para que as embalagens cheguem à indústria de reciclagem”, explica. “As cooperativas, aliás, são verdadeiros cases de resgate da cidadania. O grau de esforço para manter aquilo de pé é comovente.” 

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    O que significa sustentabilidade em logística reversa?

    A logística reversa e a sustentabilidade tem como relação o descarte correto de resíduos que serão encaminhados para o processo de reciclagem. Ou seja, reintegrando os materiais no ciclo produtivo, transformando-os em matéria-prima, a fim de que se forme um novo produto com as mesmas características.

    Quais são os impactos ambientais da logística reversa?

    A implementação da logística reversa traz uma série de impactos positivos para o meio ambiente, a sociedade e a economia. Ao fazer uma eficiente gestão dos resíduos sólidos, as empresas acabam por diminuir o desperdício de recursos provenientes na natureza.

    Porque hoje as empresas estão preocupadas com a logística reversa e com a sustentabilidade?

    A logística reversa contribui decisivamente para a competitividade empresarial, pois envolve fatores de sustentabilidade, minimizando os impactos dos produtos de pós-consumo no meio ambiente (CORTEZ, 2011, p. 70).

    Qual é a importância da logística reversa para o meio ambiente?

    O processo de logística reversa recolhe e reutiliza os resíduos do processo produtivo e devolve-os para reaproveitamento. Ou, na impossibilidade de reuso, efetua ações para que sejam descartados com o menor impacto possível ao meio ambiente. Tudo isso deve ser feito da maneira mais ágil e menos onerosa possível.