Qual era a intenção de Coubertin com os Jogos Olímpicos?

Jogos olímpicos da era moderna: uma proposta de periodização

Olympic games of modern era: a proposal of periodization

Kátia Rubio

Escola de Educação Física e Esporte, Universidade de São Paulo

Endereço

RESUMO

Os Jogos Olímpicos da Era Moderna foram recriados por Pierre de Coubertin e tiveram sua primeira edição no ano de 1896. Respeitando o calendário grego, no qual foi espelhado, os Jogos de Olímpicos de Verão realizam-se de quatro em quatro anos, período de uma Olimpíada, e atravessaram o século XX sofrendo de perto toda intensa dinâmica de um momento histórico marcado por profundos conflitos sociais de ordem mundial. A partir da análise desses momentos, é possível observar as transformações vividas pelo Movimento Olímpico. A partir de então, pretende-se nesse artigo discutir e caracterizar esses momentos históricos propondo uma periodização para os Jogos Olímpicos. Intenta-se com isso criar parâmetros de análise para os acontecimentos olímpicos a partir de seu contexto histórico-social.

Unitermos: Jogos Olímpicos; Periodização; Esporte; História.

ABSTRACT

The Olympics of the modern age have been recreated by Pierre de Coubertin and its first edition was in 1896. Respecting the Greek calendar, which was mirrored, the Summer Olympic Games are held every four years, during the Olympics, and went through the XX Century were influenced to the dynamics of a historical moment marked by deep social conflicts world order. From the analysis of these moments, it was possible to observe the changes experienced by the Olympic Movement. Thereafter, we intend to discuss in this article and characterize these historical moments proposing a timeline for the Olympics. The intention of this was to create analysis parameters for the Olympic events from their historical and social context.

Uniterms: Olympics; Periodization; Sport; History.

Processes and events, not symbols, are the only substantives, and 'time' is a symbol, not a process event.

Furthermore, 'every change in "space" is a change in "time"; (and) every change in "time" (is) a change in "space"'. (Elias, 1992)1 1 . Processos e eventos, e não símbolos, são apenas substantivos, e 'tempo' é um símbolo, não um processo. Além do mais, 'cada mudança no "espaço" é uma mudança no "tempo"; (e) cada mudança no "tempo" (é) uma mudança no "espaço". .

A necessidade de periodizar

A periodização é um recurso amplamente utilizado pelos estudiosos para facilitar a compreensão histórica da humanidade, uma vez que analisando o passado é possível observar que há porções da história que se distinguem de outras em períodos distintos.

Segundo Wishart (2004), periodizar é parte e parcela da arte de escrever narrativas, tão integral para o processo como identificar e selecionar fatos e organizá-los em uma síntese. É uma estratégia usada para dar formato a narrativa, produzindo uma superestrutura para o progressivo desenvolvimento da interpretação.

Sobre a divisão da história em períodos, Croce (1962) faz sua ressalva sobre a importância de não se perder o todo da história (seu significado) em função das divisões que se propõem. Diz o autor:

Pensar

história é certamente

dividi-la em períodos

, porque pensamento é organismo, dialética, drama e como tal tem seus períodos, seu início, seu meio e seu fim e toda outra pausa ideal que o drama implica e demanda. Mas, estas pausas são ideais e antes de tudo, inseparáveis do pensamento com o qual são únicos, como a sombra é uma com o corpo, o silêncio com o som (p.112). (Grifo do Autor).

A periodização é um instrumento que permite organizar a história dos fatos para situá-los em suas rupturas e descontinuidades.

Embora a interpretação dos fatos históricos seja necessária e desejável não se pode desprezar sua efetiva ocorrência. É possível afirmar que os fatos históricos efetivamente ocorreram. O que se alteram são as interpretações sobre suas causas e as decorrências que vencedores e vencidos puderam colher de sua realização.

Dentro dessa lógica observa-se que a história não é uma sucessão de fatos, mas a articulação do diversos agentes e atores envolvidos na sua realização, impregnando-a de características do momento em que ela se sucede, transparecendo em seus desdobramentos as ideias e ideologias que a subjaz.

Isso leva Santos (1988) a afirmar que é a através do significado particular de cada segmento do tempo que aprendemos o valor de cada manifestação ocorrida num dado momento.

Analisar um fenômeno sociocultural, como os Jogos Olímpicos, que atravessa um período repleto de singularidades como o século XX requer a clareza dos diversos momentos sobre os quais se fala. Da conjuntura pré Primeira Guerra à pós-modernidade muitos são os movimentos implicados na compreensão não só da geopolítica mundial como das distinções e exclusões promovidas pelas diversas crises de identidade geradas pela criação e negação de nações e Estados, bem como das questões próprias do esporte como o amadorismo, a profissionalização ou o "fair play".

Isso levou McComb (2004) a construir uma teoria para analisar e comparar o esporte em diferentes momentos e lugares.

Não há dúvida de que os eventos históricos são ditados pelas ações humanas, que imprimem suas marcas diante da projeção dada àquele que narra o fato ou a ideia que o anima. Daí a função das rupturas e descontinuidades, momento de erupção do novo, capaz de enunciar manifestações latentes que invocam a necessidade da transformação.

Diante da afirmação sobre a materialidade dos eventos e ações Santos (1996) propõe:

Os eventos são também idéias e não apenas fatos. Uma inovação é um caso especial de evento, caracterizado pelo aporte a um dado ponto, no tempo e no espaço, de um dado que nele renova um modo de fazer, de organizar ou de entender a realidade (p.117).

Embora o Movimento Olímpico contemporâneo preze e defenda a continuidade é possível observar claras rupturas ao longo de mais de um século de existência. Essas rupturas podem ser analisadas a partir de muitas ideias, que vieram a se transformar em fatos. Como forma de perpetuar uma tradição institucional e política invoca-se a continuidade da organização e de seus ideais, fortalecendo um imaginário institucional soberano.

Acerca do que a história tem a nos dizer sobre a sociedade contemporânea, Hobsbawm (2001) afirma basear-se em uma combinação entre experiência histórica e perspectiva histórica. Para isso é fundamental o conhecimento sobre o passado e o reconhecimento entre semelhanças e diferenças, para que a abordagem a-histórica, manipuladora, de solução de problemas, que se vale de modelos e dispositivos mecânicos não promova uma distorção sistemática da história para fins irracionais. E vislumbrando os riscos da finalidade da história aponta:

A história como inspiração e ideologia tem uma tendência embutida a se tornar mito de autojustificação. Não existe venda para os olhos mais perigosa que esta, como o demonstra a história das nações e nacionalismos modernos (p.47-8).

Diante da importância dos fatos passados na compreensão da dinâmica presente de ações e eventos a proposta de periodizar vem de encontro a necessidade de rearranjar o tempo.

Assim, para um melhor entendimento do fenômeno esportivo, visto que este pode ser considerado um processo, pois está em constante alteração, faz-se necessário compreender também os momentos históricos com os quais se relaciona, contextualizando-o assim em relação às influências de tais épocas. Em mais de 100 anos de existência, o Movimento Olímpico da Era Moderna também dá mostras de uma relação próxima com a dinâmica da sociedade e, apesar do Comitê Olímpico Internacional (COI) declarar-se apolítico, ele se viu envolvido em situações extra-esportivas que alterou seus rumos e determinou novas concepções.

Contextualização dos Jogos Olímpicos

As condições que levaram o esporte moderno a se desenvolver foram bastante particulares e denunciadoras do lugar e momento histórico em que ocorreram.

Foi, sobretudo, o renascimento do interesse pelos estudos clássicos, fazendo reviver na intelectualidade de então a fascinação que a cultura helênica exercia sobre a cultura europeia, além das descobertas de sítios arqueológicos que permitiam desvendar acontecimentos relacionados aos Jogos Olímpicos da Antiguidade, que levou Pierre de Coubertin a tomar para si a tarefa de organizar uma instituição de caráter internacional com a finalidade de cuidar daquilo que seria uma atividade capaz de transformar a sociedade daquele momento: o esporte.

Tavares (2003) aponta que o estabelecimento do Movimento Olímpico nos idos de 1894 coincide com a criação e proliferação de um amplo espectro de organizações de cunho internacionalista, cujo principal objetivo era a promoção da paz. Isso porque, embora durante o século XIX tivesse ocorrido um grande desenvolvimento das ciências humanas e da produção de ideias, os conflitos ainda eram resolvidos de forma brutal por meio da guerra. As organizações internacionalistas buscavam a resolução de conflitos, tanto de ordem interna como externa, pelo uso da razão e das leis, e não pelas armas. Dentro dessa lógica a competição esportiva era uma forma racionalizada de conflito, sem o uso da violência.

O projeto de restauração dos Jogos Olímpicos como na Grécia Helênica foi apresentado em 25 de novembro de 1892 quando da ocasião do 5° aniversário da União das Sociedades Francesas de Esportes Atléticos, que teve como paraninfo o Barão de Coubertin. Naquela ocasião ele manifestaria seu desejo e intenções com relação os Jogos: "É preciso internacionalizar o esporte. É necessário organizar novos Jogos Olímpicos" (López, 1992, p.21).

A tarefa audaciosa de promover uma competição esportiva de âmbito internacional, espelhada nos Jogos Olímpicos gregos, com caráter educativo e permanente demandava a criação de uma instituição que desse o suporte humano e material para a realização de tal empreitada.

E assim, em junho de 1894, na Sorbonne, em Paris, diante de uma plateia que reunia aproximadamente duas mil pessoas, das quais 79 representavam sociedades esportivas e universidades de 13 nações, teve início o congresso esportivo-cultural, no qual Coubertin apresentou a proposta de recriação dos Jogos Olímpicos.

A ideia inicial, e que posteriormente foi perpetuada, era da celebração de uma competição de caráter internacional, com realização quadrienal, cujos participantes estariam vinculados a representações nacionais.

As modernas Olimpíadas, ou seja, o período em que ocorrem as edições dos Jogos Olímpicos, dividem-se em Jogos de Inverno e de Verão, ocorrem de quatro em quatro anos, como na Antiguidade, alternando-se a cada dois anos entre os Jogos de Verão e os de Inverno. Diferentemente da dificuldade para definição da sede ocorrida nas edições iniciais, na atualidade, a realização das competições é disputada por grandes metrópoles dos cinco continentes, em um processo que demanda alguns anos.

Para os gregos, os Jogos representavam um momento de trégua nas guerras e conflitos de qualquer ordem para que competidores e espectadores pudessem chegar a Olímpia. Ao longo desses 110 anos de competições os Jogos Olímpicos da Era Moderna já sofreram interrupção por causa das duas Grandes Guerras e boicotes promovidos por países de várias partes do continente, sob diversas alegações, indicando que o Movimento Olímpico não está alheio às questões sociais e políticas do mundo contemporâneo como desejava Pierre de Coubertin.

O esporte contemporâneo e o Movimento Olímpico em si são, segundo Ardoino e Brohm (1995), de parte a parte um fato histórico, uma totalidade de processos históricos contraditórios com um desenvolvimento irregular, porém combinado, que conduz a totalizações concretas complexas: as instituições e as práticas e discursos esportivos contemporâneos.

A esta longevidade do esporte e do Movimento Olímpico, composta por tempos distanciados ou por tempos estruturados que são os tempos da produção esportiva, se soma um tempo conjuntural de ciclos, períodos, eras, momentos históricos que permitem periodizar sua história em grandes épocas.

Em seus 110 anos de existência o Movimento Olímpico tem oferecido mostras de uma relação próxima com as transformações políticas e sociais mundiais. Apesar de sua declaração e tendência apolíticas ele se viu envolvido em várias situações extra-esportivas ao longo do século XX que por vezes alterou seus rumos e determinou novas concepções.

Esses ciclos parecem definir os rumos futuros do Movimento em si e de seus partícipes. Propor uma periodização histórica para os Jogos Olímpicos da Era Moderna é uma forma de buscar articular os diferentes momentos e dinâmica desse fenômeno ao longo do século XX.

O objetivo desse trabalho é apresentar uma proposta de periodização histórica para o Movimento Olímpico contemporâneo a partir de fatos que marcaram uma época e possibilitaram a transformação tanto da instituição como do fenômeno olímpico.

Para tanto estão sendo propostas quatro fases que buscam destacar momentos distintos pelos quais passou e tem passado o Movimento Olímpico (Rubio, 2006). Isso se faz necessário para que esse fenômeno não seja tido como estático, uníssono e unívoco, apesar da pouca flexibilidade de suas regras e da difícil mobilidade de seus membros nas instâncias executivas e deliberativas. Embora tido como uma instituição burocrática o COI acompanhou, inegavelmente, a dinâmica histórica e social de todo o século XX, e, portanto, se viu sujeito, mesmo contra a vontade de seus membros, de adequar suas normas aos acontecimentos que o cercaram.

Os quatro grandes momentos identificados são:

Fase de estabelecimento - de Atenas 1896 a Estocolmo 1912;

Fase de afirmação - Antuérpia 1920 a Berlin 1936;

Fase de conflito - de Londres 1948 a Los Angeles 1984;

Fase profissional - de Seul 1988 até os dias atuais.

A fim de estabelecer uma ordem nos acontecimentos da história olímpica contemporânea é apresentado a seguir como e quando se deram os Jogos Olímpicos da Era Moderna e os principais acontecimentos mundiais que seguiram e mudaram seus rumos.

Fase de estabelecimento

Denomina-se fase de estabelecimento dos Jogos Olímpicos o período que compreende os Jogos Olímpicos de Atenas-1896 a Estocolmo-1912 e está marcado pela aceitação da proposta olímpica. Krüger (1999) identificou esse período como "formative years of the IOC". Tida no princípio como uma aventura de nobres excêntricos e aristocratas que requeria uma grande soma de dinheiro e de energia para convencer governos e atletas a correrem diversos pontos do planeta na difusão de uma ideia e de uma prática, os Jogos se viram em alguns momentos confundidos com ideais alheios aos olímpicos, mas necessários para sua sedimentação.

O Olimpismo em seus primórdios era um sonho que foi sendo materializado ao longo de sua realização. No princípio vários episódios de cunho prático e ideológico puseram à prova aquilo que era no princípio um desejo de congraçamento entre os povos, demandando grande esforço na sua realização. Nesse momento os Jogos Olímpicos estavam pautados em uma proposta de esporte restritiva que contemplava apenas e tão somente aos descendentes da aristocracia europeia e norte-americana, com patrimônio suficiente para que não necessitasse se envolver com atividades produtivas, o que lhes retiraria a condição de amadores tão necessária à prática esportiva, no entender dos organizadores e dirigentes esportivos de então (Lico & Lemos, 2007; Zakus, 1992).

Apresentada a ideia durante o 5° aniversário da União das Sociedades Francesas de Sports Atléticos (USFSA), em 1892, somente dois anos depois foi criado o Comitê Olímpico Internacional, tendo como presidente eleito o grego Demetrius Vikelas e como secretário geral Pierre de Coubertin, com a finalidade explícita de organizar o Movimento Olímpico Mundial e realizar os Jogos Olímpicos da Era Moderna. Ficou determinado desde aquele momento que os Jogos seriam realizados a cada quatro anos, o período de uma Olimpíada, em uma cidade escolhida pelo COI.

Embora criados oficialmente por um grupo de estudiosos da Educação em uma das Universidades mais respeitadas do mundo, Coubertin não se iludiu com a receptividade de seus interlocutores que encobria a falta de compreensão da importância do evento sobre o qual estavam discutindo, deliberando e recriando. Chegou a escrever em suas memórias "a platéia aplaudiu e aprovou a proposta, me desejou sucesso, no entanto ninguém compreendeu nada. Era uma incompreensão geral e duraria um longo tempo" (Müller, 2000, p.14).

A proposta inicial era de que a primeira edição dos Jogos Olímpicos ocorresse na cidade de Paris, em 1900, como parte das comemorações da virada do século, durante a realização de uma grande feira internacional. Entretanto, diante da excitação provocada por aquele acontecimento entre os gregos, os Jogos da I Olimpíada foram levados para o berço dos Jogos Olímpicos da Antiguidade, em Atenas na Grécia.

No entender de Salvador (2004) o esporte olímpico deve ser entendido como parte das grandes manifestações políticas do nacionalismo europeu do século XIX. Por isso sua realização como parte das "Exposições Mundiais", que se realizaram em vários países europeus e nos Estados Unidos da América, como mostra dos tempos do industrialismo e do capitalismo, com a organização de grandes parques didáticos do idealismo das nações dominantes e de temáticas sempre mais amplas. Nesses eventos, como no de Paris em 1878 e depois em 1900, foram convocados congressos de diversas especialidades como odontologia, história, matemática, estatística, fotografia. Um congresso sobre educação física, que incluía exibições sobre jogos e esportes, foi considerado nos Jogos Olímpicos de Paris, 1900.

Girginov e Parry (2005) afirmam que a organização dos Jogos de 1896, 1900 e 1904 foi marcada pela insignificância e pelo desprezo de uma ideia que pouco entendiam. Reduzidas a apêndices das "World Exhibition" e da "Louisiana Purchase Exhibition", respectivamente, os Jogos de 1904 duraram vários meses, com pouco público e alguns atletas que não compreendiam a ideia de que estavam disputando os Jogos Olímpicos. Essa condição começou a se transformar em Londres (1908) e Estocolmo (1912) edições com uma organização mais racional, a participação de um grande público expectador e um planejamento mais detalhado do evento.

Durante o período que aqui se denomina fase de estabelecimento os Jogos Olímpicos viveram a materialização de um sonho como a edição de 1896, que mesmo quase não dispondo de investimentos públicos para a construção dos equipamentos necessários para a realização dos Jogos, pôde contar com a ajuda de gregos ilustres como Georgios Averoff que financiou a restauração total do estádio grego de Atenas. A restrição à participação feminina durou apenas na primeira edição dos Jogos e não suportou as pressões dos movimentos de inclusão feminina nas várias esferas da vida social, inclusive no esporte. Mas, foram nas edições de Paris-1900 e Saint Louis-1904 que os Jogos vieram a sofrer os piores reveses de sua história. Isso porque as competições se perderam dentro de outras atividades das Exposições Mundiais, e especificamente, no caso de Saint Louis, sofreu com o racismo manifesto em uma demonstração chamada "Anthropological days", onde os representantes de diversas etnias de diferentes pontos do mundo se enfrentavam em trajes sumários, simulando um espetáculo circense e também na discriminação a atletas negros, burlando a postulados olímpicos como a igualdade entre os participantes dos Jogos (Salvador, 2004).

Em Londres-1908 o grande desafio de Coubertin foi lidar com as exigências dos organizadores ingleses, como a imposição de seu sistema métrico e a convocação apenas de árbitros ingleses. Além disso, a falta de universalização de regras e pontuações para as diversas provas levou competidores e delegações a impetrar inúmeros recursos e apelos contra os resultados promulgados. Todas essas situações demonstravam a fragilidade do Movimento Olímpico, ainda muito recente, e os esforços que seriam necessários para que a ideia dos Jogos Olímpicos não sucumbisse diante da rivalidade política-ideológica que já se manifestava em toda a Europa.

Os Jogos de Estocolmo-1912 marcaram o fechamento desse período, posto que os organizadores se puseram a trabalhar com a antecedência necessária para arrecadar fundos e construir as instalações ideais para as competições. Essa forma de trabalho e de conduta foram os indicadores de organizações futuras, tão desejadas e necessárias a um evento que crescia a cada nova edição. Diante da eclosão da Primeira Grande Guerra os Jogos de 1916 não se realizaram, provocando um salto de oito anos para um novo encontro entre os competidores olímpicos.

Conforme apontam Girginov e Parry (2005) embora as quatro primeiras cidades sede tenham sido votadas pelo Comitê Olímpico Internacional, elas foram nomeadas basicamente por seu valor simbólico. Aparentemente, Atenas foi escolhida por causa de sua contribuição histórica, Paris 1900 foi um tributo ao esforço de Coubertin, Saint Louis em 1904 como uma homenagem ao Novo Mundo e Londres 1908 pela tradição do esporte que legou ao mundo.

Fase de afirmação

Essa fase compreende o período entre os Jogos de Antuérpia 1920 a Berlin 1936.

A Primeira Guerra Mundial marcaria a história dos Jogos Olímpicos pela interrupção de um calendário seguido de maneira exemplar. Os Jogos de 1920 foram abrigados pela cidade de Antuérpia, na Bélgica, alguns meses após o fim da guerra e buscavam resgatar não apenas a periodicidade, mas outros valores que haviam se perdido nos anos de conflito. E assim como já acontecera com Estocolmo, não houve concorrência para sediar os Jogos da VII Olimpíada.

Uma das razões para a escolha dessa sede seria uma homenagem ao país arruinado depois de anos de guerra. Esse talvez tenha sido o motivo para que a Bélgica se recusasse a convidar a Alemanha a participar oficialmente dos Jogos, cabendo ao Comitê Organizador formalizar o convite. Por causa disso a Áustria, Hungria, Bulgária, Polônia e Rússia, países também atingidos pelo conflito, recusaram-se a participar do evento, marcando o primeiro boicote da história dos Jogos Olímpicos.

Criada por Coubertin a bandeira olímpica com os cinco anéis foi hasteada pela primeira vez em cerimônias de abertura dos Jogos Olímpicos. Consta que os anéis nas cores azul, verde, amarela, preta e vermelha representam todos os continentes, uma vez que pelo menos uma dessas cores faz parte de todas as bandeiras nacionais. O Hino Olímpico também foi inaugurado juntamente com o juramento do atleta e dos juízes no qual os participantes prometiam manter o respeito ao regulamento. O "fair-play" estava formalizado.

De acordo com Boulogne (1994) o principal realizador desses Jogos, Henri de Baillet-Latour, deixou em Coubertin a impressão de que já havia um sucessor para a presidência do COI.

Passados 24 anos de seu reinício os Jogos Olímpicos já haviam superado a condição de uma aventura de nobres e aristocratas excêntricos e se convertido em um importante evento internacional. Já era palco de exposição das tensões internacionais e como poucos eventos de sua envergadura sobreviveu ao período entre guerras.

A forte política de alianças que se apresentava no cenário internacional e as restrições impostas por meio do Tratado de Versailles faziam transparecer, na composição dos países convidados ou barrados no encontro olímpico, o jogo de forças entre as nações envolvidas na conjuntura internacional conforme a posição tomada diante de algum conflito. O número de nações participantes do Comitê Olímpico Internacional chegou a ser maior do que a Liga das Nações (Dunning, 1994).

Nesse contexto foram realizados os Jogos de Paris, que representavam para Pierre de Coubertin mais do que a realização quase religiosa do evento que se propusera resgatar e transformar em um patrimônio da humanidade. Representaria seus últimos Jogos como presidente do COI, o reconhecimento internacional de sua importância e a confirmação, em sua própria nação, de que eles seriam mantidos como um evento único.

Ao mesmo tempo que Coubertin desejava encerrar seu mandato frente ao COI era grande o desejo de ver reparados os erros e descasos dos Jogos de 1900 ainda vivos na memória do Barão. Apesar de seu empenho, as autoridades francesas pouco sensibilizadas para o tema olímpico, não agiram com afinco para demonstrar que desta feita os problemas da primeira edição não se repetiriam. Nem o patriotismo, nem a paciência de Coubertin foram demasiadamente fortes para suportar a falta de interesse das autoridades e restando apenas dois anos para a realização dos Jogos, impondo sua autoridade de presidente e consciente da importância que os Jogos Olímpicos já haviam conquistado no cenário internacional, mas desgostoso dessa decisão, resolveu transferir as competições para a cidade de Los Angeles.

O pragmatismo venceu uma tradição ainda incipiente. Embora pouco entusiasmados com aquela celebração, o Comitê Olímpico Francês e a burocracia local, sabedores das proporções que os Jogos haviam conquistado pelo mundo, resolvem tomar as providências necessárias para que os Jogos da VIII Olimpíada pudessem transcorrer com o aparato do qual eles necessitavam.

Conforme Krüger (1999) nessa ocasião Baillet-Latour foi eleito presidente do COI e ao se retirar Coubertin sugeriu a ele uma atenção especial aos países da América do Sul, os quais Baillet-Latour ajudou na organização dos Comitês Olímpicos Nacionais, que receberam o direito formal de indicar um membro cada para participar das instâncias de poder do COI.

Tradicionalmente marcado por dois blocos - anglofóno e francófono - o COI de Baillet-Latour sofreu grandes transformações com a introdução do Comitê Executivo como a instância máxima de decisões da entidade, deixando para trás a forma autocrática de comando de Pierre de Coubertin, e se aproximando das Confederações Internacionais das modalidades esportivas como forma de universalizar o esporte. Foi nesse contexto que se realizaram os Jogos de Amsterdan 1928.

O Movimento Olímpico, e particularmente os Jogos Olímpicos, havia superado a condição de uma instituição e evento para nobres e aristocratas para se converter em um grande fenômeno que exigia dedicação e empenho por parte de seus organizadores. Em seu início já dava mostras da necessidade de infra-estrutura e do empenho dos governantes para a sua realização. Já não era uma festa de poucos e para poucos, mas vinha se convertendo em um grande espetáculo que ganhava o gosto de praticantes do esporte e do público em geral.

Embora todos esses aspectos tivessem sido afirmados nas nove edições anteriores, os Jogos da IX Olimpíada esbarraram nos mesmos argumentos utilizados por Teodósio, no ano de 394, para sua extinção. A rainha Guilhermina da Holanda, uma puritana conservadora, acreditava que o Olimpismo era um reduto do paganismo que precisava ser refreado, antes que tomasse proporções incontroláveis. Por causa disso não concedeu qualquer apoio financeiro aos Jogos e tentou fomentar um sentimento antiolímpico entre seus súditos. Apesar desse esforço a população local se entusiasmou com a possibilidade de sediar uma edição olímpica o que levou sua soberana a reconsiderar essa atitude e apoiar a iniciativa.

A aparente prosperidade vivida ao longo da década de 20 foi seguida pelo colapso da Bolsa de Valores de Nova Iorque, um período de profunda depressão tanto para as nações americanas como europeias e a emergência de regimes totalitários (Hobsbawm, 1995).

O Movimento Olímpico acompanhou de perto essa dinâmica, refletindo na realização dos Jogos Olímpicos a ausência de atletas, por falta de condições econômicas para isso, e a sua utilização para outras finalidades que não a competição. Políticos e governantes já reconheciam a importância e abrangência desse evento. O "crack" da bolsa de Nova Iorque, em 1929, levou a uma profunda crise econômica vivida pelos EUA e grande parte do mundo. Embora as dificuldades fossem inúmeras o sonho olímpico deveria ser realizado, uma vez que até o momento apenas a Primeira Grande Guerra havia sido capaz de impedir a realização dos Jogos. Ou seja, apenas um conflito político de caráter internacional era capaz de inviabilizar a competição, minimizando os efeitos de uma crise econômica.

Los Angeles era candidata à sede dos Jogos Olímpicos desde 1919 e apenas em 1932 pode ver esse desejo realizado. Desde Saint Louis-1904 os Jogos Olímpicos não eram realizados fora de Europa, tendo nesse período acontecido uma guerra de caráter mundial e outra fosse prenunciada.

A Califórnia já abrigava então o principal pólo da indústria cinematográfica do mundo e se destacava como um grande centro de produtores de espetáculos. Com essa mentalidade foram preparados os Jogos Olímpicos de 1932. O Memorial Coliseum, estádio com capacidade para 120 mil espectadores era apenas um dos muitos símbolos daqueles jogos. Foi construída uma Vila Olímpica com a concepção de casas e não de dormitórios, como se fazia até então. O padrão "hollywoodiano" de produzir espetáculos chegava aos Jogos Olímpicos. A cerimônia de abertura foi produzida pelo diretor de cinema Cecil B. De Mille (Lunzenfichter, 2002.)

Embora ocorresse em meio à depressão os Jogos Olímpicos de Los Angeles renderam lucros em torno de um milhão de dólares, graças ao planejamento e as estratégias comerciais criadas pelo presidente do Comitê Olímpico Americano, Avery Brundage, futuro presidente do COI (Dunning, 2001; Krüger, 1999).

Mas, foram os Jogos da XI Olimpíadas os mais discutidos e analisados da história do Movimento Olímpico contemporâneo. A presença de Hitler e a determinação de mostrar ao mundo a perfeição do nazismo renderam muitas teorias e análises a respeito da influência da política e da ideologia no Olimpismo e a flexibilidade com que o Movimento Olímpico lidava com as questões políticas e nacionais (Rubio, 2007).

López (1992) afirma que do ponto de vista olímpico e esportivo os Jogos de Berlin seriam o exemplo de como deveriam ser organizados os demais Jogos Olímpicos. Dirige uma dura crítica àqueles que fizeram uso dessa oportunidade para ter benefícios políticos e ideológicos, mas não tem qualquer dúvida sobre a qualidade daquela competição. E afirma: "A Alemanha nazista podia ser execrável, mas os Jogos Olímpicos que organizaram em Berlin, não" (p.77). Essa é uma dúvida que paira sobre uma grande parcela dos pesquisadores dos estudos olímpicos. Seria possível, de fato, cumprir o ideal de separar Olimpismo com questões nacionais e políticas? Teria o Movimento Olímpico condições de não se envolver, nem se perder nas questões do mundo que mobilizavam exércitos e promoviam a guerra?

Os atritos entre o chefe da nação alemã e o presidente do COI foram constantes. Começou com a tentativa de destituição do judeu Theodore Lewald da chefia do comitê organizador dos jogos, após a edição dos Decretos de Nuremberg, que declaravam serem os judeus sub-humanos. E continuou quando foram encontrados cartazes que ultrajavam as populações judias e negras. Hitler alegou que a Alemanha era ele quem governava. O conde Henri Bailler-Latour respondeu que no momento em que fosse hasteada a bandeira olímpica aquele território passaria a ser Olímpia e sob a égide do Olimpismo seria governada. Hitler concedeu às pressões dos dirigentes do COI, sabedor da importância e abrangência daquele evento. Nenhuma outra máquina de divulgação era capaz de tanta publicidade quanto os Jogos Olímpicos. Acorreram a Berlin aproximadamente três mil jornalistas. Fosse pelo crescente interesse acerca do esporte ou por causa da curiosidade com o que ocorria naqueles dias na Alemanha, os profissionais da imprensa realizaram uma grande cobertura do evento, sendo recepcionados pessoalmente por Joseph Goebbels, o responsável pela área de comunicação e divulgação nazista (López, 1992).

Não há dúvida de que os Jogos de Berlin foram um sucesso de organização e de público, êxito que custou 30 milhões de dólares ao governo, destinados à construção de estádios, ginásios, piscinas e demais instalações. Em troca o público deixou nos cofres dos organizadores algo em torno de 2.800.000 dólares, afirmando o que já se percebera em Los Angeles quatro anos antes. Os Jogos Olímpicos podiam ser altamente rentáveis.

Não se sabe ao certo se os vencedores dos Jogos de 1936 tiraram vantagens políticas substanciais de seus êxitos esportivos, mas o que é certo é que a imagem política de Hitler saiu reforçada no solo alemão, mas também no exterior (Beamish & Ritchie, 2006).

O responsável pelo financiamento deste espetáculo foi um Estado nacional para respaldar sua política interna e externa. Os italianos e os japoneses, entre outros, haviam demonstrado de forma conclusiva que o esporte anglo-saxão, tal como havia evoluído desde a mudança dos séculos, não era patrimônio de nenhuma cultura concreta, senão que, assim como a indústria moderna, se baseava inexoravelmente no uso racional de recursos humanos e o planejamento de longo prazo.

O espetáculo e os símbolos olímpicos estavam presentes, porém, em processo de evolução e reconhecimento, com a evolução do ritual de forma irretocável para a apresentação de Jogos atrativos e aceitáveis. O mundo começava a conhecer uma nova maneira para produzir heróis e de se posicionar diante dos fatos políticos nacionais e internacionais. O Movimento Olímpico que se institucionalizara como apolítico e apartidário já não mais se sustentava como tal depois de Berlin.

Fase de conflito

Se no período que antecedeu a Segunda Guerra Mundial os Jogos Olímpicos se firmaram como um grande evento mundial, capaz de superar as diferenças políticas e sobreviver a elas, a fase posterior à guerra colocaria o Movimento Olímpico frente às dificuldades de um mundo dividido em dois grandes blocos: os países capitalistas e os países socialistas.

As tensões geradas entre esses dois blocos levaram o mundo a viver um período chamado de Guerra Fria, em que o conflito armado em terra foi substituído por um forte jogo de espionagem e de corrida pelo desenvolvimento de tecnologia bélica para o enfrentamento de um possível novo conflito generalizado.

Conforme Hobsbawm (1995) a Guerra Fria foi quase uma extensão da Segunda Guerra Mundial, que teve seu fim com a derrota de alemães, japoneses e italianos e deixou o mundo dividido em dois grandes blocos políticos de poder. O pós-guerra foi marcado por uma reconfiguração de alianças e aproximações políticas, cujo elemento norteador da formação de blocos se deu pela ideologia e os interesses políticos e econômicos subjacentes a ela.

Principais protagonistas da Guerra Fria, Estados Unidos da América (EUA) e União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), aliados durante a Segunda Guerra Mundial, diante da necessidade de união de forças contra um inimigo comum, protagonizaram ao longo da segunda metade do século XX batalhas sem sangue utilizando para isso diferentes recursos para a afirmação de superioridade. O esporte foi um deles.

Em meio a esse quadro os Jogos Olímpicos foram manipulados como mais uma forma de demonstração de poder político e força social. As medalhas passaram a ser contadas como pontos a favor de seus respectivos regimes, afirmando um tipo de superioridade não pretendida pelo Movimento Olímpico.

As competições esportivas tornaram-se uma das manifestações públicas de maior divulgação desse conflito. Grandes nações obviamente deveriam produzir grandes atletas que demonstrariam ao mundo o verdadeiro potencial de construção de domínio de uma ordem mundial binária.

De acordo com López (1992), já em 1948 a política havia ocupado no Olimpismo um protagonismo que não lhe cabia. A condição de isolamento imposta pelos burocratas ingleses que dominavam o Movimento Olímpico à Alemanha e ao Japão, derrotados na guerra, era um indicador de que as questões do mundo político arranhavam a aura independente do Olimpismo. A Alemanha não chegou a ser convidada a participar. Também na condição de derrotado, o Japão chegou a receber convite, mas preferiu não se manifestar quanto a sua presença. A União Soviética, apesar da condição de aliada, não participou porque segundo o relato de Lorde Burghley (depois presidente da Federação Internacional de Atletismo) esse país não contava com Comitê Olímpico estruturado. Ainda assim enviou um grupo de observadores porque a aventura olímpica estava nos planos soviéticos. Os Jogos de Helsinque seriam essa prova.

Em 1948 a então União Soviética participou dos Jogos Olímpicos de Londres na condição de observadora, surgindo em Helsinque 1952 com uma delegação completa conquistando 69 medalhas contra 76 dos Estados Unidos.

Espy (1988) aponta que não foi tarefa fácil para os finlandeses, anfitriões dos Jogos de Helsinque 1952, uma vez que a invasão sofrida pela antiga Rússia, o que levou inclusive ao cancelamento dos Jogos da XII Olimpíada, ainda permanecia viva na memória local. Agora a Finlândia recebia pela primeira vez na história a União Soviética que participou dos Jogos como nação e se apresentou com uma delegação de mais de 300 atletas. Alegando os mais variados motivos para não compartilhar da Vila Olímpica, espaço ocupado pelos países do bloco capitalistas, soviéticos e seus aliados comunistas alojaram-se em uma base militar soviética, em território finlandês, no Mar Báltico. Era apenas o início de muitas hostilidades que ainda estavam por vir, contrariando o ideal olímpico de Pierre de Coubertin de que o Movimento Olímpico fosse apolítico, supra nacional e supra partidário.

Alemanha e Japão voltavam a participar dos Jogos Olímpicos e a edição de Helsinque batia um novo recorde de participações nacionais com 4.925 atletas de 69 nações.

Guttmann (1982) afirma que a partir do final da Segunda Guerra Mundial a esfera esportiva compactuou dos dilemas oriundos da presença de uma nova e forte ideologia socialista. A aristocracia presente no COI esteve dividida entre a retórica da congregação e a efetiva antipatia em relação ao comunismo.

Por sua vez os Jogos de Melbourne 1956 representaram o palco para os conflitos relacionados com a invasão soviética da Hungria, o que levaria Espanha, França e Suíça a se ausentarem dos Jogos. De outro Líbano, Iraque e Egito manifestaram seu repúdio com a atitude israelense e também deixaram de competir. Quando os governantes da China nacionalista souberam que Taiwan participaria na condição de Estado Nacional, também resolveram impedir a presença de seus atletas às vésperas do embarque da delegação, frustrando a expectativa de centenas deles que haviam se preparado para a competição.

Garrigou (2001) afirma que em meio a inúmeros conflitos políticos muitos atletas viram suas carreiras frustradas, impedidos de competir e apresentar suas habilidades publicamente, mais uma consequência da interferência das questões internacionais no mundo olímpico.

As questões relacionadas com a Alemanha, a Coréia e a China tornaram-se um grande problema sem solução para o COI ao longo de várias décadas. No caso da Alemanha a estratégia envolveu, a princípio, a escolha dos atletas por critério numérico. Isso favorecia, obviamente, a Alemanha Ocidental até os Jogos Olímpicos de 1964, quando então os atletas da Alemanha Oriental representaram a maioria da delegação. Estavam dadas as condições para a formação de duas delegações a partir da edição seguinte que ocorreria no México em 1968. No caso da China optou-se por duas delegações desde sempre, embora a China tentasse de diversas maneiras excluir Taiwan dos Jogos Olímpicos (Krüger, 1999).

A fase de conflito não é denominada assim apenas pela co-existência com a Guerra Fria, mas com os diferentes tipos de conflito que existiram ao longo desses anos. A década de 60, na qual ocorreram os Jogos Olímpicos de Roma 1960, Tóquio 1964 e México 1968 é a prova dessas divergências. Se em Tóquio o Japão desejou mostrar ao mundo que havia superado as sequelas da Segunda Guerra, promovendo uma edição dos Jogos repleta de inovações tecnológicas, quatro anos depois era a vez da primeira nação latino-americana mostrar que era capaz dessa proeza. Naquele momento o mundo não se dividia apenas entre capitalistas e socialistas, mas havia também uma discriminação entre ricos e pobres, desenvolvidos e subdesenvolvidos. López (1992) aponta que os países de língua inglesa protestaram diante da possibilidade da celebração olímpica ir parar no terceiro mundo. Já os países fora do circuito do desenvolvimento apoiavam essa possibilidade com o argumento de expansão do Movimento Olímpico e da prática verdadeira de seu ideal.

Não só o México, mas grande parte do mundo, vivia a ebulição de um momento histórico marcado pela invasão da Tchecoslováquia por tanques soviéticos, pelos protestos estudantis em Paris que se espalharam por muitos outros países, pelos anos mais difíceis do regime militar no Brasil e pelo crescimento do movimento racial norte-americano que ganhava projeção mundial a partir da morte de Martin Luther King e da organização dos Panteras Negras. Essas manifestações não passariam desapercebidas pelos Jogos de 1968.

Tommie Smith e John Carlos, dois atletas negros norte-americanos que utilizaram o pódio para protestar contra a discriminação racial sofrida em seu país foram banidos para sempre das competições esportivas. Já a ginasta tcheca, Vera Caslavská, ganhadora de quatro medalhas de ouro e duas de prata, aproveitou o momento da premiação para não cumprimentar suas concorrentes soviéticas como forma de protesto contra a invasão de Praga. Além de não cumprir o protocolo olímpico, imprimiu seu protesto e escapou ilesa da punição sofrida pelos americanos, indicando a parcialidade com que essas questões foram historicamente tratadas (López, 1992).

No mesmo período o COI anulou a restrição à racista África do Sul de ser afastada dos Jogos Olímpicos. Diante da possibilidade da reintegração sul-africana protestos veementes das demais nações africanas, acompanhadas da União Soviética, levaram os dirigentes a rever sua posição e recuar na confirmação do convite.

Os Jogos Olímpicos de Munique representaram um dos principais marcos da Fase de Conflito. Hargreaves (1992) aponta que com os Jogos Olímpicos de 1972 a Alemanha buscava apagar as marcas que os Jogos de Berlin tinham deixado na memória do Ocidente como os Jogos do nazismo. A Alemanha mudara, o mundo havia superado o drama da Segunda Guerra, mas não as diferenças geradas por ela. Uma vez mais a trégua olímpica contemporânea era posta à prova com a invasão da Vila Olímpica de Munique por membros do grupo palestino Setembro Negro, um dos braços armados da Organização para Libertação da Palestina, que exigia a libertação de 250 presos palestinos. No momento inicial da operação de sequestro foram mortos dois membros da delegação israelense e outros nove foram mantidos como reféns e mortos posteriormente, durante a invasão do aeroporto da cidade, em uma ação policial que provocou a morte dos nove atletas, de cinco terroristas, de um piloto e de um policial alemão.

Os desdobramentos da dimensão que o espetáculo olímpico conquistou ao longo do século foram invocados pelos dirigentes do COI quando questionados a respeito da continuidade das competições. E mesmo diante da comoção internacional decidiram por manter as competições após guardar um dia de luto em homenagem aos falecidos no atentado. Não restava dúvidas sobre a lógica que prevalecia sobre a competição olímpicas: nada seria capaz de impedir o maior espetáculo do planeta. Eram muitos os interesses envolvidos em sua realização e as concessões pareciam crescer de maneira proporcional aos investimentos governamentais e privados.

No âmbito internacional as tensões geopolíticas continuavam a interferir nas participações nacionais. A OUA (Organização para a Unidade Africana) posicionou-se contra o convite do COI à recém-independente Rodésia, acusada de racismo. Essa atitude durou até dias antes da abertura dos Jogos quando enfim, a própria Rodésia se retirou dos Jogos dizendo que os acordos firmados não haviam sido respeitados.

Foi exatamente a questão racial que motivou o grande boicote aos Jogos Olímpicos de 1976, em Montreal. Na ocasião, 23 nações africanas deixaram de ir aos Jogos em protesto contra a presença da Nova Zelândia, que havia disputado uma partida de hóquei contra a seleção da África do Sul, banida dos Jogos Olímpicos em virtude do emprego de políticas de segregação racial.

Quatro anos mais tarde, pela primeira vez os Jogos Olímpicos seriam realizados em um país socialista. Lico (2007) aponta que esse fato, se isolado, já seria digno de destaque considerando que no ano de 1980 a Guerra Fria ainda não havia terminado, mas não foi apenas isso que marcou os Jogos de 1980. Processos políticos soviéticos resultariam na invasão do Afeganistão em 23 de dezembro de 1979 e a partir daí uma série de desdobramentos ocorreram com grandes consequências nos Jogos Olímpicos que seriam realizados no meio de 1980. O boicote norte-americano, ensaiado em outras ocasiões, encontrou razões concretas para acontecer e no dia 19 de julho de 1980 aconteceu o desfile de abertura dos Jogos Olímpicos de Moscou, com apenas 81 dos 142 países inicialmente inscritos.

Quatro anos depois aconteceria a revanche.

Alegando falta de segurança para seus atletas, a participação de atletas profissionais e a instalação de mísseis na Europa, 16 países não foram a Los Angeles: União Soviética, Bulgária, Alemanha Oriental, Vietnã, Laos, Mongólia, Afeganistão, Hungria, Polônia, Cuba, Iêmen do Sul, Etiópia, Coréia do Norte, Angola e por fim Líbia. Ainda assim, os Jogos Olímpicos de Los Angeles cresceram em número de participantes chegando a 7.078 atletas de 141 países. Era o recorde absoluto até então.

Apesar da determinação soviética Romênia e Iugoslávia não se furtaram participar, representando um nível mais elevado de competitividade em provas como a ginástica olímpica e o basquete. E finalmente a China comunista, ausente desde 1936, retomou sua participação. Diante da ausência dos principais adversários os atletas norte-americanos ganharam três vezes mais medalhas que o segundo colocado, a Romênia. Anos mais tarde, parte deles seria acusada de conquistar altos níveis de rendimento a custas de substâncias proibidas.

Los Angeles já havia sido escolhida como cidade sede quando os Jogos de Moscou foram realizados. Foi a única cidade a apresentar candidatura, uma vez que muitas candidatas potenciais reviram seus planos e recuaram dessa intenção diante dos prejuízos que Montreal amargara em 1976. O governo bancou a candidatura mesmo sabendo disso e montou um Comitê Organizador com o firme propósito de obter os fundos necessários junto à iniciativa privada para sua realização sem prejuízos para o comitê ou para a comunidade. Inaugurava-se um novo modelo de gerenciamento e organização dos Jogos Olímpicos. O empreendedor foi Peter Ueberroth e levou os Jogos a renderam lucros de 250 milhões de dólares. Foram os primeiros Jogos Olímpicos comercializados da história que isentaram o governo e a cidade de qualquer custo.

Os dois grandes boicotes e a profissionalização, tanto da realização dos Jogos quanto dos atletas, marcam o fim do período de conflito.

Fase do profissionalismo

Os Jogos Olímpicos da Era Moderna atravessaram o século XX e sobreviveram a duas Grandes Guerras, dois boicotes declarados e alguns disfarçados, mas não suportou a força do poder financeiro que prevaleceu sobre o espírito do amadorismo após os Jogos de Los Angeles - 1984.

Entre os vários motivos que favoreceram essa abertura está a falta de entendimento generalizado do que seja a condição amadora.

Guttmann (1992) profetizou o que ocorreria com o esporte a partir do diferente entendimento que os países capitalistas e socialistas tinham sobre o papel desempenhado por seus atletas no cenário olímpico.

A disparidade provocada em algumas modalidades pela utilização de atletas do bloco socialista em disputas olímpicas levou à alteração da regra do futebol nos Jogos de Los Angeles - 1984 quando poucos meses antes da competição a FIFA proibiu a participação nos Jogos Olímpicos de atletas que já haviam disputado alguma Copa de Mundo independente da idade. A questão não era complexa, uma vez que as seleções que disputavam a competição olímpica dispunham de atletas jovens, talentosos, mas com pouca experiência. Quando em disputa com as seleções dos países do bloco socialista a disparidade física ficava evidente, bem como os vários anos a mais de vida e de carreira. O argumento da falta de paridade prevaleceu.

Outro elemento que não pode ser desprezado na transformação dos valores do amadorismo foi o início de transmissão televisiva a partir dos Jogos de Roma. Uma nova ordem comercial se estabeleceu com a entrada da televisão no mundo olímpico. A visibilidade que os atletas ganharam estimulou empresas comerciais a terem suas marcas associadas àqueles seres sobre-humanos capazes de realizações incomuns.

Simons e Jennings (1992) denunciaram esse fato na obra "The lords of rings" informando como o poder econômico minava os ideais olímpicos tão duramente defendidos por Pierre de Coubertin ao longo de sua vida. A questão central dessa investigação era a relação próxima e discutível entre o COI, a FIFA e uma empresa de material esportivo e os diversos negócios proporcionados por essa parceria.

Outro fato que levou à busca da profissionalização não apenas entre os atletas, mas à estrutura do Comitê Olímpico Internacional como um todo, foi o crescente gigantismo dos Jogos Olímpicos. A necessidade de uma ampla infra-estrutura para realização das competições, bem como a acomodação de milhares de atletas, turistas e técnicos de apoio atrelaram a realização dos Jogos à boa vontade governamental dos países no qual eles ocorressem. Essa dinâmica foi mantida até o Jogos de Montreal-1976, capital da província de Quebec, que apresentava a particularidade de ser uma cidade representativa da porção francófona e, portanto, minoritária dentro da Estado canadense. As diferenças entre as comunidades e as rivalidades políticas levaram o governo a advertir os organizadores dos Jogos que nenhum centavo seria destinado a obras para essa finalidade. Embora recebesse 34,5 milhões de dólares pelos direitos de transmissão pela televisão, o governo local amargou um prejuízo de aproximadamente 1,7 bilhão de dólares, transformado em impostos que a comunidade quebecoise pagou até o ano de 2000 (Cardoso, 2000; López, 1992).

Depois dessa experiência era certa a necessidade de buscar novas estratégias para o futuro dos Jogos Olímpicos, que começava a ganhar novos contornos com os boicotes promovidos pelos Estados Unidos e seus aliados em 1980 e, posteriormente, pela União Soviética e países do bloco socialista em 1984 e com a eleição de Juan Antonio Samaranch para a presidência do COI em 1980.

A entrada de grandes empresas no financiamento dos Jogos parecia inevitável diante das necessidades impostas à cidade-sede. Los Angeles-1984 serviu como um laboratório para essa experiência. Naquela ocasião, apesar do boicote, o governo norte-americano não retirou um único centavo dos cofres públicos para a realização de obras. Por sua vez o marketing esportivo mostrava sua razão de existir promovendo a captação de recursos suficientes para cobrir todas as despesas e ainda render lucro a seus organizadores.

Nos Jogos de Seul-1998 atletas e equipes experimentaram ousar sua capacidade de fazer brilhar a marca de seus patrocinadores, mas foram os Jogos Olímpicos de Barcelona-1992 que apresentaram o símbolo da profissionalização do esporte: o time de basquete norte-americano, chamado de "dream team". Originários de um país com uma instituição chamada NBA (National Basketball Association) que promovia um campeonato com 27 times e pagava os mais altos salários do planeta para atletas como Michael Jordan, Magic Johnson e Larry Bird, entre outros, participaram dos Jogos Olímpicos não para ganhar uma medalha de ouro, que ninguém duvidava que fosse deles, mas para divulgar a todo o planeta um grande campeão de vendas, o campeonato norte-americano de basquetebol. Embora tido como o símbolo da profissionalização dos Jogos Olímpicos outras modalidades associadas ao mundo do esporte profissional também foram admitidas pela primeira vez em Barcelona. Foi o caso de ciclistas envolvidos em provas como a volta da França, dona do maior prêmio em dinheiro da modalidade, e dos tenistas melhores colocados no ranking mundial, que deixaram de se hospedar em hotéis luxuosos para se hospedar na vila olímpica.

Vale lembrar que Pierre de Coubertin, no Congresso Olímpico de Praga, em 1925, buscou sintetizar as questões relacionadas ao amadorismo apontando que profissionalismo não era apenas o ato de ter seu desempenho esportivo pago com dinheiro, mas também receber benefícios, como hospedagem em locais por demais luxuosos.

Na lógica interna do esporte contemporâneo especialização e profissionalização são inevitáveis. Desde que a capacidade atlética em uma variedade de esportes tornou-se incompatível com a alta performance a especialização tornou-se inevitável.

Dentre os aspectos mais perversos que a busca de resultados tem proporcionado para o movimento olímpico, o "doping" tem despontado como a questão principal a ser superada no momento contemporâneo.

A origem da utilização do termo "doping" no esporte é contada por Cagigal (1996) como estando relacionado às corridas de cavalos, primeiro esporte em que se utilizou fármaco clandestinamente para conseguir que um determinado cavalo corresse mais lento e perdesse. Hoje este termo designa a ingestão de medicamentos usados por certos atletas para conseguir justamente o contrário: tentar ganhar.

Aquino Neto (2001) afirma que espera-se que uma competição seja pautada pela igualdade de oportunidades, baseada no desinteresse para além da competição em si mesma, onde vence o melhor, aquele que reúne mais competências e quem mais trabalhou para alcançar o resultado. Na atualidade essas expectativas nem sempre são verdadeiras: a utilização de substâncias dopantes e o seu refinamento, que leva à inviabilização de sua detecção, desvirtuam o sentido de igualdade que norteia a competição.

Existem diferentes motivos competindo pelo comportamento do indivíduo, e aquele ao qual for atribuído maior significado passará a influenciar sua atitude. Uma visão que tem prevalecido no esporte é a de que as metas dos atletas se concentram na competição e na conquista de marcas sempre superiores. O corpo deste individuo é considerado somente um instrumento para conseguir estes fins (Rodríguez-Cabello, 1987). Isso vem ao encontro da proposta do esporte atual que privilegia a competição. Quando um atleta tem determinação por vencer a qualquer preço e a instituição e equipe que o cercam compartilham desse espírito, alguns excessos podem ser cometidos, fazendo com que valores éticos sejam preteridos. Assim, a auto-manipulação hormonal mostra-se como um meio eficaz para a superação dos obstáculos que se apresentam (Miah, 2003a, 2003b). Há uma ideia no esporte de alto rendimento a respeito do perfil do atleta que busca substâncias proibidas: envolvido com o objetivo, o primeiro compromisso desse tipo de atleta é consigo mesmo, depois com os demais e por último, com o regulamento, inviabilizando qualquer aplicação do princípio de "fair play" (Calderon, 1999).

Com o fim do amadorismo, o esporte converteu-se em um meio de vida, uma atividade profissional: homens de excepcionais dotes para a luta ou para a corrida passam a receber altas somas financeiras comprometendo-se a realizar determinadas atuações. Buscando responder a essas exigências, nos últimos anos os campeões do esporte passaram a ser transformados em rendosas mercadorias que são vendidas e negociadas em diversos pontos do planeta (Rubio, 2002; Silva & Rubio, 2003; Thomas, Haumont & Levet, 1988).

Os atletas de alto nível, igual aos demais profissionais destacados em suas profissões, permanecem em uma luta constante por sua posição; o que os difere de demais categorias, é a interdependência entre seu rendimento, o qual têm de maximizar em curtos períodos de tempo, e a capacidade de seu corpo, considerando a brevidade de suas carreiras (Garcia Ferrando, Latiesa Rodríguez & Durán González, 1998).

Na transformação da prática da condição amadora para a profissional, não foram apenas os valores nobres e aristocráticos que se perderam. A criação de uma nova ordem olímpica indicava que o mundo do século XX havia passado por grandes e profundas mudanças de ordem prática e moral. O atleta profissional não é apenas aquele que tem ganhos financeiros pelo seu trabalho. Ele é também a representação vitoriosa de marcas e produtos que querem estar vinculados à vitória, à conquista de resultados.

Para Guttmann (1992) o profissional deve ser definido como aquele que recebe uma compensação pecuniária pelo que faz por ter sua vida direcionada para a prática do esporte. Por muito tempo a especialização (codinome da profissionalização) foi o resultado das tensões geradas pela necessidade de disfarçar a condição amadora sob forma de ganhos secundários como bolsas de estudos, apoio governamental e generosidade patronal ao invés de salário.

Considerações finais

A vontade de estudar e melhor compreender os componentes políticos no esporte trouxe destaque natural à fase de conflito, por nela os Jogos Olímpicos terem tomado rumos definitivos no que diz respeito ao alcance e importância em todo o mundo.

Pouco antes do início da fase de conflito, os Jogos já haviam sido usados politicamente de maneira efetiva. Em 1936, nos Jogos Olímpicos de Berlin, o regime nazista usou o esporte e o evento olímpico de maneira efetiva, redobrando os esforços na organização para que tudo saísse perfeito e aqueles fossem lembrados, e avaliados por Pierre de Coubertin, como os Jogos mais bem organizados até aquele momento. Seria o triunfo da Alemanha e o triunfo dos nazistas.

Mais do que a excelência organizacional, nos Jogos de Berlin houve um enorme esforço por parte dos alemães em superar a todos no quadro de medalhas, na tentativa de com isso transmitir a mensagem da superioridade da raça ariana em relação às demais. Antes mesmo do mundo polarizado e dos regimes ideológicos usarem esse artifício para manifestar superioridade, em 1936 isso já havia sido feito, situação que se repetiu ao longo da Guerra Fria e que permanece inalterada até os dias atuais.

As rivalidades internacionais são transportadas para o terreno do esporte olímpico, metaforizando inúmeros conflitos manifestos e latentes, regionais ou internacionais, transformando o resultado expresso no quadro de medalhas em uma prova da superioridade desejada. Essa é uma das muitas evidências da abrangência conquistada pelos Jogos e que os distanciam de seus valores apregoados originalmente.

O esporte de maneira geral e os Jogos Olímpicos na posição do mais importante evento e veículo de manifestação esportiva estiveram presentes no processo de oposição ocorrido durante esse período, funcionando também como palco público para as batalhas entre os sistemas ideológicos de governo. As equipes de ambos os lados disputavam mais do que simplesmente as medalhas, os centésimos ou as partidas. Uma vitória sobre o oponente ideológico carregava maior significado, que ia além dos limites esportivos. Vencer o outro era também mostrar ao mundo inteiro sua vitória. Era a possibilidade de ter batalhas televisionadas, noticiadas e comentadas sem o negativismo que a guerra carrega consigo. Simbolicamente havia uma importância muito grande nesse processo, sobretudo no que diz respeito ao quadro de medalhas, que foi o instrumento utilizado para mensurar com maior precisão a supremacia de uma nação ou de um bloco sobre o outro.

Junto com os recordes, o quadro de medalhas era o instrumento palpável com o qual os diferentes lados dessa batalha reivindicavam sua supremacia.

Nota

  • 1

    . Processos e eventos, e não símbolos, são apenas substantivos, e 'tempo' é um símbolo, não um processo. Além do mais, 'cada mudança no "espaço" é uma mudança no "tempo"; (e) cada mudança no "tempo" (é) uma mudança no "espaço".

  • Endereço

    Kátia Rubio

    Escola de Educação Física e Esporte - USP

    Av. Prof. Mello Moraes, 65

    05508-030 - São Paulo - SP - BRASIL

    e-mail:

  • Recebido para publicação: 28/11/2007

    1a. Revisão: 29/09/2008

    2a. Revisão: 27/08/2009

    Aceito: 23/09/2009

    1 . Processos e eventos, e não símbolos, são apenas substantivos, e 'tempo' é um símbolo, não um processo. Além do mais, 'cada mudança no "espaço" é uma mudança no "tempo"; (e) cada mudança no "tempo" (é) uma mudança no "espaço". Endereço Kátia Rubio Escola de Educação Física e Esporte - USP Av. Prof. Mello Moraes, 65 05508-030 - São Paulo - SP - BRASIL e-mail:

    Qual o principal objetivo das Olimpíadas de acordo com Pierre de Coubertin?

    Considerado o maior evento esportivo do planeta, os Jogos Olímpicos têm como objetivo estimular a competição sadia entre os povos dos cinco continentes. Como já dizia o Barão de Coubertin (Pierre de Coubertin), considerado o fundador dos Jogos Olímpicos da Era Moderna, “o importante não é vencer, mas competir.

    Qual era a intenção de Coubertin ao criar um comitê internacional de Jogos Olímpicos?

    A proposta de Coubertin foi apresentada na União das Sociedades Francesas de Esportes Atléticos (USFSA) em 1892. Nessa proposta, estava a pretensão de criar um comitê olímpico internacional diretamente inspirado nos antigos jogos realizados na cidade de Olímpia.