Deixo tudo assim. Sei do incômodo e ela tem razão E se eu fosse o primeiro Ahh tanto faz! E o que não foi não é, Deixo tudo assim, não me acanho em ver Sei do escândalo e eles têm razão. E se eu for o primeiro Ahhh, ora, se não sou eu quem mais vai decidir Ahhh, se o que eu sou é também Vou levando assim. saímos pra caminhar porque eu não tinha grana pra nenhum tipo de programa que não fosse esse nem roupa e nem disposição na real eu nem teria ido se fosse com outra pessoa, mas esse cara parecia interessante, porque ele era bem parecido comigo e eu sou egocêntrico, então parecia a combinação perfeita ou talvez não fosse era cedo demais pra saber era fim de tarde isso pouco importa também mas é bonitinho imaginar um fim de tarde e um casal gay andando e conversando sobre qualquer coisa a pista de caminhada estava meio vazia porque era domingo e ninguém gosta muito de fazer exercícios em domingos ele me contou sobre suas séries favoritas e algumas delas eram as minhas favoritas também ele me contou como saiu do armário e eu também contei e foi legal falar sobre preconceito e ver como esse tipo de coisa aproxima a gente mesmo que até meia-hora atrás fossemos completos desconhecidos no começo o que importa são as coisas em comum pra nos aproximar, só com o tempo vamos nos implicando com as coisas e nos afastamos, é meio que natural isso, ás vezes nos implicamos com as mesmas coisas que achávamos charmosas no inicio agora tinha essa insegurança dizendo que tudo ia acabar mal no meu ouvido era uma voz dentro da minha cabeça e era difícil prestar atenção em qualquer coisa com ela ali prevendo o pior o tempo todo o primeiro encontro foi bom e nem teve beijo foram três horas de conversas ininterruptas e a gente sabia que não era necessário preencher as lacunas de silêncio o tempo todo com frases sem sentido mas mesmo assim as frases vinham e era tudo preenchido sem deixar espaço pro silêncio constrangedor que muitas vezes revela muito mais que as frases ditas eu era oito anos mais velho e mesmo assim não sabia nada da vida porque se tem algo que aprendi com a vida é que quanto mais a gente vive menos a gente sabe todo dia desaprendo algo que tinha certeza que sabia na adolescência eu achava que tinha todas as respostas agora não sei nem quais são as perguntas não nos beijamos e foi o melhor primeiro encontro que já tive em toda minha vida ok, talvez eu esteja romantizando um pouco demais certamente seríamos bons amigos e isso já tava de bom tamanho isso se o ciúme não estragasse tudo o sentimento de posse foi o que fodeu com meu namoro da outra vez, além do fato do meu ex ser um mentiroso compulsivo credo odeio essa coisa de paixão não, cara, não é isso não pode ser eu não queria me apaixonar eu tava bem, eu tava bem na minha com as minhas series e meu gato e a minha ideia fixa de fazer um canal no youtube funcionar até que não funcionasse mais ou eu ficasse completamente louco eu sempre tenho saídas estratégicas e essa do canal foi uma delas uma maneira de fugir da realidade ou um hobbie (que não deixa de ser uma maneira de fugir da realidade) ai eu o adicionei no facebook simplesmente porque ele apareceu nas “pessoas que talvez você conheça” que na real nunca conheço mas gostaria e foi assim alguns likes depois um super like no tinder e uma caminhada ai fomos comer batatas fritas (outro dia eu descobri que fritar batatas pode ser um negócio perigoso, principalmente se você faz isso de cuecas) a batata tava ok e eu coloquei sal demais pois me distrai contando a ele sobre algo que agora nem me lembro e tenho certeza que nem ele as coisas que eu falo não duram mais que três segundos são como esse texto feitas pra acabar como a gente depois fomos na pizzaria eu sempre desajeitado em lugares públicos porque nunca tive um namoro assim antes não que isso seja um namoro mas foi o mais perto que já cheguei de um mesmo tendo namorado aquele escroto por quase um ano e meio era algo novo pra mim ter alguém que me acompanhasse a todos os lugares sem medo ou vergonha e conversasse de tudo e se quisesse pegar na mão pegava e se quisesse beijar beijava isso foi me negado a vida toda eu namorei somente um enrustido ou meus encontros eram somente pra sexo e isso foi se tornando tão comum pra mim que não sabia mais ser de outro jeito simplesmente estava preso naquilo e não sabia como sair e eu acho que não há nada de errado em sexo casual, eu gosto e faço, mas ás vezes eu queria ter a possibilidade de outra coisa pelo menos ter essa opção viver outras experiencias e isso não estava disponível porque as coisas consideradas normais pra casais como noivado e casamento e namorar em parques ou em lanchonetes não era coisa pra gay foi o que me fizeram acreditar gays nem na televisão podiam se beijar, imagina numa praça e eu tinha medo eu não queria envergonhar o cara e também não queria que os outros ouvissem minhas conversas porque eu sou inseguro e me acho burro e desinteressante e não quero que as pessoas pensem de mim o mesmo que eu penso de mim mesmo não sou só um cara gay não é isso que me define como pessoa sim, eu sou gay e me orgulho disso mas não sou só isso assim como um cara hétero é mais do que apenas um cara hétero eu sou além disso eu tenho uma vida cheia de coisas que eu gosto além do fato de eu gostar de beijar homens eu sou um cara gay que sofreu de umas coisas que uma vez o médico do posto de saúde disse que era transtorno de ansiedade e eu acho que isso vinha de anos atrás porque eu lembro que quando tava na quinta série eu suava frio na sala de aula achando que minha mãe ia morrer ou eu ia morrer ou alguém ia morrer em algum lugar do mundo e provavelmente alguém estava morrendo mesmo naquele exato momento em algum lugar do mundo mas o fato é que minhas pernas tremiam e eu só queria chorar e nunca queria ir pra escola era como uma ataque de pânico e eu nunca contei isso a ninguém e eu sempre passei tempo demais sozinho talvez isso tenha me estragado eu passei tempo demais da minha vida sozinho e só sei gostar feito louco o que não é legal não é bonitinho ou romântico é errado e feio e não é certo eu quero gostar calminho suave sem ciúmes ou paranoias ou depender de ninguém pra ser feliz e talvez eu nem esteja gostando de ninguém isso tudo aqui é apenas medo de eu estar gostando ou medo de me entregar e quebrar a cara pela milionésima vez e também não estou namorando a gente tá ficando mas ele disse que não gosta de rótulos odeia não quer colocar um rótulo nisso como a tove lo fala na música cool girl que é uma música inspirada num monólogo de um livro que virou filme e nesse trecho tem uma mensagem feminista bem legal se você for parar pra analisar saímos por quatro dias seguidos e nos beijamos no segundo no terceiro falamos abertamente sobre ereções e masturbação nos beijamos também e no quarto a gente viu as ereções um do outro e foi legal e nos beijamos novamente é claro diversas vezes e eu nem queria que rolasse sexo não por enquanto porque dessa vez eu quero ir com calma não tô dizendo que fazer sexo estragaria tudo ou que sexo seja algo impuro ou sujo sexo é apenas natural mas é que não sei bem e acho que estou me enrolando eu gosto de sexo e sexo é importante e adoro quando rola sexo no primeiro encontro, é até melhor porque assim a gente já sabe se é compatível com a pessoa, porque ás vezes os corpos não se encaixam e um bom sexo deve ser como lego o problema é que a maioria dos meus encontros em toda minha vida foi estritamente sexual e eu já estou farto disso quero ver o que mais um relacionamento pode ter além de sexo porque a parte do sexo estou cansado de saber e eu estava bem sozinho sim, eu estava claro que estava meio deprimido, porque esse é um dos pilares que me fazem ser quem sou e é o que me mantem em pé, como a clarice lispector um dia escreveu “até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. nunca se sabe qual defeito sustenta nosso edifício inteiro” eu parei de tomar a medicação porque ela me deixava como se estivesse dentro de uma nuvem o médico que disse que eu tinha transtorno de ansiedade me passou prozac e depois disso nunca mais procurei outro médico talvez eu devesse procurar um talvez eu devesse ter continuado com o remédio a vida é uma droga e vai continuar sendo uma droga porque a vida é assim mesmo e viver é sofrer, como uma amiga me disse se a gente tem medo de sofrer a gente não vive eu estava bem sim, tirando essas coisas todas que me atormentam relativamente bem não tô dizendo que secretamente eu sempre precisei de alguém do meu lado porque eu sou chato e fico de saco cheio das pessoas com facilidade e não sei exatamente o que estou dizendo eu sei que tô gostando de ter alguém pra beijar e falar sobre minhas coisas não sei se isso quer dizer que estou apaixonado basicamente eu tive quatro encontros seguidos com esse cara e foi legal, ainda não transamos e talvez tudo acabe antes de transarmos mas tudo bem parece que o clima pesou depois do primeiro encontro, como se ele tivesse sido bom demais e tudo que viesse a seguir fosse apenas uma sombra do que foi como se eu tivesse mostrado tudo que eu tenho de melhor logo de cara e não sobrasse nada pra depois como uma banda indie que morre com o segundo álbum eu tenho medo de assusta-lo eu tenho medo de fazer tudo errado eu tenho medo de por estar com tanto medo eu acabe fazendo tudo errado mas provavelmente é isso que vai acontecer a gente vai transar eventualmente eu vou chamar ele pra assistir alguma série interessante aqui em casa a gente vai deitar no meu sofá-cama e depois de uns quinze minutos estaremos se pegando, apertaremos o pause no vídeo e faremos sexo e depois continuaremos assistindo e depois pause e mais sexo e assim até ficarmos exaustos e semi-desidratados e o cheiro de saliva e porra no ar e suor e um pouco de desodorante e o cheiro da torrefação de café que tem no bairro de casa e meu gato miando atrás da porta fechada do quarto mas não precisa ficar triste se acabar esse é um lembrete pra mim mesmo você sempre foi sozinho você sobreviveu até hoje e certamente irá sobreviver mais alguns anos mas tudo tem um fim um romance um filme cult uma novela um seriado bacana uma musica legal um livro genial esse texto e eu e você também |