Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, é o romance fundador do realismo brasileiro. Considerado um dos melhores livros da história da literatura brasileira, a obra influenciou direta ou indiretamente diversos escritores no Brasil e no mundo. Show
ResumoMemórias póstumas de Brás Cubas, em linhas gerais, conta a morte e a vida de Brás Cubas, narrador-personagem que, após seu falecimento, resolve contar suas memórias. No decorrer da narrativa, o leitor conhece:
O pior é que era coxa. Uns olhos tão lúcidos, uma boca tão fresca, uma compostura tão senhoril; e coxa! Esse contraste faria suspeitar que a natureza é às vezes um imenso escárnio. Por que bonita, se coxa? Por que coxa, se bonita? Memórias póstumas de Brás Cubas,
Não pare agora... Tem mais depois da publicidade ;) No final do romance, Brás Cubas resume sua vida como uma sucessão de fracassos, com exceção de um: Não alcancei a celebridade do emplasto, não fui ministro, não fui califa, não conheci o casamento. Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com o suor do meu rosto. Mais; não padeci a morte de D. Plácida, nem a semidemência do Quincas Borba. Somadas umas coisas e outras, qualquer pessoa imaginará que não houve míngua nem sobra, e conseguintemente que saí quite com a vida. E imaginará mal; porque ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas: — Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria. Memórias póstumas de Brás Cubas, Leia também: Dos românticos aos modernos: O essencial da poesia brasileira Contexto históricoO romance Memórias póstumas de Brás Cubas, publicado em 1881, foi produzido em um momento de grandes mudanças sociais no mundo e no Brasil. A Revolução Francesa e a Revolução Industrial produziram, durante o século XVIII e XIX, a ascensão da burguesia e um forte êxodo rural, constituindo cidades cada vez maiores e mais tecnológicas. No Brasil, a cidade do Rio de Janeiro passou por intensa modernização após a chegada da Família Real, em 1808, e a independência do país, em 1822. Cada vez mais populosa, a cidade encheu-se de comerciantes, burocratas, funcionários públicos e outros diversos tipos sociais, que passaram a figurar nas obras de Machado de Assis. A população pobre, composta por escravos e ex-escravos (é importante lembrar que a escravidão foi oficialmente proibida no Brasil em 1888, após séculos de lutas abolicionistas), também ocupou as cidades e as primeiras favelas do Brasil e já era percebida no centro do Rio de Janeiro. Veja, a seguir, um trecho do romance em que o narrador conta de sua infância e sua relação com os escravos dos quais detinha a propriedade: Desde os cinco anos merecera eu a alcunha de 'menino diabo'; e verdadeiramente não era outra coisa; fui dos mais malignos do meu tempo, arguto, indiscreto, traquinas e voluntarioso. Por exemplo, um dia quebrei a cabeça de uma escrava, porque me negara uma colher do doce de coco que estava fazendo, e, não contente com o malefício, deitei um punhado de cinza ao tacho, e, não satisfeito da travessura, fui dizer à minha mãe que a escrava é que estragara o doce 'por pirraça'; e eu tinha apenas seis anos. Prudêncio, um moleque de casa, era o meu cavalo de todos os dias; punha as mãos no chão, recebia um cordel nos queixos, à guisa de freio, eu trepava-lhe ao dorso, com uma varinha na mão, fustigava-o, dava mil voltas a um e outro lado, e ele obedecia — algumas vezes gemendo —, mas obedecia sem dizer palavra, ou, quando muito, um — “ai, nhonhô!” — ao que eu retorquia: — “Cala a boca, besta!” Memórias póstumas de Brás Cubas, Leia também: Poesia de Machado de Assis
Realismo: por que a obra Memórias Póstumas de Brás Cubas é realista?O romance Memórias Póstumas de Brás Cubas é considerado o romance fundador do realismo no Brasil. Isso ocorre, pois o livro apresenta características já abordadas pelo realismo europeu (que tem como marco inicial a obra Madame Bovary, de Gustave Flauber), tais como:
Saiba mais: Realismo Foco narrativoO foco narrativo de Memórias póstumas de Brás Cubas é uma das questões mais interessantes do romance de Machado de Assis. Diferentemente do que ocorria nos romances europeus, em que o narrador era em terceira pessoa e onisciente, na obra de Machado tem-se a presença do narrador em primeira pessoa, ou seja, o narrador é personagem e conta sua própria história. Para além disso, há um elemento ainda mais inovador no enredo: Brás Cubas, antes de começar a escrever suas memórias, morre, ou seja, temos um romance narrado por alguém que já morreu e, depois disso, conta sua história. Veja como o próprio Brás Cubas explica essa situação: Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo. Memórias póstumas de Brás Cubas, O que é o emplasto em Memórias Póstumas de Brás Cubas?Logo no segundo capítulo do romance, Brás Cubas conta que teve uma grande ideia: criar um medicamento capaz de “aliviar a nossa melancolia humana”. A partir dessa iluminação, o narrador passa a sonhar com a glória que receberia pela criação de tão milagroso remédio. Leia, a seguir, o momento em que se conta como nasceu o sonho do emplasto: Com efeito, um dia de manhã, estando a passear na chácara, pendurou-se-me uma ideia no trapézio que eu tinha no cérebro. Uma vez pendurada, entrou a bracejar, a pernear, a fazer as mais arrojadas cabriolas de volatim, que é possível crer. Eu deixei-me estar a contemplá-la. Súbito, deu um grande salto, estendeu os braços e as pernas, até tomar a forma de um X: decifra-me ou devoro-te. Essa ideia era nada menos que a invenção de um medicamento sublime, um emplastro anti-hipocondríaco, destinado a aliviar a nossa melancólica humanidade. Memórias Póstumas de Brás Cubas, Entretanto, no fim do livro, Brás Cubas confessa sua frustração ao não conseguir produzir o mágico remédio. Após sua morte, o narrador relembra o caso: Divino emplasto, tu me darias o primeiro lugar entre os homens, acima da ciência e da riqueza, porque eras a genuína e direta inspiração do Céu. O caso determinou o contrário; e aí vos ficais eternamente hipocondríacos. Memórias Póstumas de Brás Cubas, Como se chama o narrador que conversa com o leitor?Os tipos de narrador são o narrador personagem (em primeira pessoa), que participa da história; o narrador observador (em terceira pessoa), que apenas narra o que vê; e o narrador onisciente (também em terceira pessoa), que tem total conhecimento de personagens e fatos.
Como ocorre o diálogo do narrador com o leitor dos romances de Machado de Assis?Todos os narradores de Machado de Assis têm uma função específica e clara que é o diálogo com o leitor, isto é, o narrador a todo o momento conversa com o leitor numa tentativa de catequizá-lo, de convencê-lo de sua ideologia.
Quando o personagem fala com o leitor?Narrador é aquele que conta a história. Ele pode fazer parte da história, ou apenas contá-la para o leitor. Quando o narrador faz parte da história, isto é, quando também é uma personagem, dizemos que é um narrador em primeira pessoa.
Quando o autor conversa com o leitor?O narrador machadiano, por exemplo, antecipa alguns pensamentos e opiniões dos leitores a fim de questioná-los ou afrontá-los; isso permite a imersão completa do leitor que passa a ser igualmente personagem narradora daquele universo ficcional.
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