Filme era uma vez um sonho

Era uma Vez um Sonho” se baseia no livro de memórias de J.D. Vance sobre a época em que ele viveu na região chamada de Cinturão da Ferrugem (onde ficam os estados do nordeste, dos Grandes Lagos e do meio-oeste dos Estados Unidos) em meio a pobreza, vícios e o sonho de quebrar o ciclo de abusos e desventuras que rondava sua família. Ele é considerado, no mínimo, uma obra complicada. Vance por vezes toma suas experiências de vida como retratos absolutos de quem vive na mesma situação em que a sua no passado, e seu relato chegou até mesmo a ser disputado no campo político dos Estados Unidos, com democratas e republicanos competindo pela narrativa exposta no livro lançado em 2016 – mesmo ano em que Donald Trump foi eleito.

De um lado, há a justificativa de que a obra de Vance mostra exatamente o fundo do poço no qual estava a nação norte-americana que elegeu o (agora ex) presidente. Do outro, alguns veem o livro como uma prova de que o chamado “sonho americano” está vivo e todos podem conquistá-lo se batalharem bastante. No entanto, praticamente nada disso é levado em consideração na nova adaptação de “Era uma Vez um Sonho” para a Netflix, com direção de Ron Howard e roteiro de Vanessa Taylor.

No longa, Vance (Gabriel Basso) tenta vencer sua origem humilde para ingressar na prestigiada Universidade de Yale e se formar em Direito, mas vê seu sonho ameaçado quando recebe uma ligação de sua irmã Lindsay (Haley Bennett) contando que sua mãe, Beverly (Amy Adams), teve uma overdose de heroína. No caminho de volta para sua terra natal, Vance relembra sua vida através de três gerações: a de sua mãe, de sua avó Mamaw (Glenn Close) e sua própria e de sua irmã.

Enquanto o livro ainda se dá o direito de trabalhar com as nuances da história de Vance, com o sentimento confuso de sentir orgulho de suas origens ao mesmo tempo em que tenta o tempo todo se desvencilhar delas, a adaptação prefere contar com todas as letras (em vez de demonstrar) em momentos pontuais e breves que pode haver uma contradição na forma de pensar do protagonista. Porém, assim como outros aspectos de “Era uma Vez um Sonho”, nada sai do nível superficial, além da trama ter um sério problema de ritmo em que as cenas de flashback e momento presente intercaladas oscilam em emoção de forma mal planejada.

E é uma tristeza ver atrizes do calibre de Amy Adams e Glenn Close tendo seus talentos escondidos atrás de próteses e perucas que nem boas atuações são capazes de redimir. Adams principalmente, que muda de sotaque a cada cena e deu o azar de interpretar uma personagem tão mal adaptada para as telas que precisa se virar para fazer com que os surtos homéricos dela façam sentido. Isso numa narrativa que se encerra abruptamente em vários momentos e que usa explicações simplistas como muleta para justificar o comportamento errático de Beverly, também tentando explicar de maneira esdrúxula o cenário complexo que o filme tenta incorporar, mas fica com preguiça de aprofundar. Os únicos momentos mais interessantes são protagonizados por Close, que ainda consegue trazer uma humanidade maior à Mamaw.

Falando em inconsistências, Ron Howard mesmo pode ser considerado um diretor que “atira para todos os lados”, mirando sua filmografia em blockbusters, biografias ou histórias reais, tudo junto e misturado, e frequentemente se esquece de dar alguma profundidade ou verdadeira importância ao que quer retratar. Talvez o exemplo mais marcante seja seu longa vencedor do Oscar “Uma Mente Brilhante” que, de certa forma, se vendeu como uma cinebiografia e foi criticado justamente por fantasiar demais a vida de seu protagonista para criar uma narrativa que apenas apela para o dramalhão. A diferença é que o filme sobre o matemático John Nash foi lançado há 19 anos, e Howard segue cometendo os mesmos vacilos.

No fim, o conjunto da obra de “Era uma Vez um Sonho” acaba sendo emocionado demais até para um filme de drama com pretensões inspiradoras e aquele caráter de “isca de Oscar” que tenta passar. As escolhas narrativas são complexas de menos para considerar o filme algum tipo de “estudo de caso” ou instrumento de análise social sobre a pobreza pela qual ficou conhecida a região Appalachia dos Estados Unidos, uma vez que Howard e Vanessa Taylor decidem levar o título em inglês da obra – “Hillbilly Elegy”, traduzido como “elegia caipira” – ao pé da letra e tentam encaixar o máximo de estereótipos sobre os “caipiras” que conseguem lembrar na trama. Na visão de Howard, a tal elegia caipira de Vance se torna um retrato de uma parte ainda negligenciada dos Estados Unidos tão profundo quanto um pires.

Ficção com dramas familiares sempre me chamam atenção. A família é uma instituição poderosa e atua com vigor na vida de qualquer indivíduo. No imaginário cultural sempre existiu a família perfeita com o pai sendo o provedor, a mãe dona de casa, seguindo um roteiro perfeito dos famosos comerciais de margarinas. Mas já faz algum tempo que dramas com famílias chamadas disfuncionais ganham espaço nas telas e na literatura.

Era uma vez um sonho é um filme adaptado do livro Era uma vez um sonho: A história de uma família da classe operária e da crise da sociedade americana, de  J.D. Vance. A partir da autobiografia de Vance, a produção, dirigida por Ron Howard e roteirizada por Vanessa Taylor, retrata a vida de uma família branca de classe média dos EUA, que migrou do interior para uma região do país conhecida como Cinturão de Ferro. 

O filme é narrado pela perspectiva de Vance (Gabriel Basso) e traz cenas da infância e adolescência misturadas às cenas do presente para nos apresentar os dilemas vividos pela família Vance – pobreza, violência doméstica e dependência química. 

Há além de Vance, duas personagens que ganham destaque, a mãe Beverly (Amy Adams) e a avó Bonnie “Mamaw” Vance (Glenn Close). A relação entre Vance e a mãe era bastante instável, isso devido a oscilação de humor e constantes crises de Beverly relacionadas ao abuso de drogas.

Filme era uma vez um sonho

Filme era uma vez um sonho

Filme era uma vez um sonho

É com a Avó que o garoto consegue manter um certo equilíbrio na adolescência e passa a trabalhar e focar nos estudos. Com essa ajuda e direcionamento ele chega a prestigiada Universidade de Yale. Vivendo um sonho, mesmo que com tanto sacrifício para mantê-lo, Vance recebe a notícia de que a mãe teve uma overdose e precisa voltar para ajudar a irmã Lindsay (Haley Bennett). É neste momento que o rapaz se depara com um confronto: família contra seus próprios sonhos e necessidades. Voltar para a família significava perder oportunidades de entrevistas para estágios de verão, o que traria excelentes contatos profissionais e o dinheiro para garantir os próximos semestres em Yale. 

O filme tem uma mensagem interessante, mas não foi muito bem desenvolvido. A personagem de Amy Adams é mais vista como uma desequilibrada sem motivos do que alguém que carrega traumas emocionais. Até o próprio Vance pode ser interpretado como um egoísta que fugiu da realidade e deixou tudo na conta da irmã. 

No final, Vance coloca em prática os ensinamentos da Avó para seguir em frente e fazer diferente: “Nós somos do lugar de onde viemos mas todos os dias escolhemos quem nos tornamos. A minha família não é perfeita mas eles me fizeram ser quem eu sou e me deram oportunidades que nunca tiveram. Meu futuro, seja lá qual for, é o nosso legado compartilhado.”


  • Confira o livro – Era uma vez um sonho: A história de uma família da classe operária e da crise da sociedade americana
  • Achei o fato engraçado – Glenn Close é indicada a “pior” e “melhor” atriz pelo mesmo papel

Filme era uma vez um sonho

Era uma vez um sonho

Classificação JG: 2,8⭐️

Título original: Hillbilly Elegy 

País: EUA

Gênero: Drama

Classificação: 16 anos

Duração: 116 minutos

Onde assistir: Netflix 

Direção: Ron Howard


Baiana, escritora, jornalista e professora. Apaixonada por livros, fotografia, séries, filmes, pôr do sol, olhar pela janela, música e viajar.

O que fala o filme Era uma vez um sonho?

Sinopse. Ex-fuzileiro naval e estudante de Direito, J.D. Vance vê seus sonhos ameaçados pela necessidade de voltar à cidade onde nasceu e lidar com uma crise familiar. Ele embarca numa jornada feita de autoconhecimento e reflexões.

Como termina o filme Era uma vez um sonho?

Mamaw eventualmente incendeia Papaw com gasolina para retribuir seu problema com a bebida e, embora os dois se separem depois, eles permanecem próximos.

Tem o filme Era Uma Vez na Netflix?

Once Upon a Time | Netflix.

Onde assistir Era Uma Vez filme?

Assistir a Era Uma Vez | Disney+