Em direito tributário, é matéria cabível aos decretos

Plenário Virtual

EMENTA:

DIREITO TRIBUTÁRIO. ICMS. OPERAÇÕES INTERESTADUAIS. REGIME DE PAGAMENTO ANTECIPADO SEM SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. DECRETO ESTADUAL. FATO GERADOR DO TRIBUTO. COBRANÇA ANTECIPADA. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.

MANIFESTAÇÃO

Trata-se de recurso extraordinário interposto pelo Estado do Rio Grande do Sul contra acórdão prolatado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, assim ementado:

APELAÇÃO CÍVEL. REEXAME NECESSÁRIO. DIREITO TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ICMS. COBRANÇA ANTECIPADA. OPERAÇÕES INTERESTADUAIS.

PRELIMINAR. CABIMENTO DO MANDAMUS. No caso, tratando-se de lei de efeitos concretos, como os aludidos Decretos, que possibilitam a qualquer momento a autuação dos agentes fiscais, no sentido de promover a exigência antecipada do tributo, legitimado está a utilização do mandado de segurança como remédio apto a discutir a legalidade da exação. Preliminar rejeitada.

MERITO. Não pode o Estado ao exigir o pagamento antecipado da diferença resultante entre as alíquotas interestadual e interna, por meio de Decreto, nos termos do artigo 4º, inciso XIV, da Lei Estadual nº 8.820/89, tratando-se de mercadoria proveniente de outra unidade da federação, o fato gerador do ICMS se dá por ocasião da entrada no estabelecimento do adquirente. Assim descabe ao Estado, através de Decretos (Decretos nºs 39.820/1999, 40.900/01, 41.885/2002, 42.631/2003) realizar alteração do aspecto temporal da hipótese de incidência tributária (fl. 130).

No extraordinário, interposto com base na alínea a do permissivo constitucional, o ente federativo alega que o v. acórdão recorrido acabou por violar, a contrario sensu, o princípio constitucional da reserva legal, ao não identificar a hipótese em litígio como simples fixação de prazo de recolhimento do imposto e, sim, como o aspecto temporal do respectivo fato gerador, concluindo que, na espécie, estar-se-ia a veicular hipótese de exigência do tributo antes mesmo da ocorrência do fato gerador.

Sustenta o recorrente a constitucionalidade da cobrança do ICMS por ocasião da entrada de mercadorias no seu território. Alega, ainda, que não se trata de caso de substituição tributária, nem de exigência da diferença entre as alíquotas interestaduais e a interna, com fundamento nos arts. 150, § 7º, e 155, § 2º, VIII, da CF/88, respectivamente. O caso seria de cobrança antecipada do ICMS devido, via regime normal de tributação, quando do ingresso das mercadorias adquiridas em outro ente da federação no Estado do Rio Grande do Sul

No que se refere à questão da repercussão geral, sustenta que a matéria é relevante tanto do ponto de vista jurídico quanto do econômico, uma vez que, embora o ICMS seja tributo conferido à competência impositiva dos Estados-membros, a circunstância do mesmo qualificar-se como imposto 'plurifásico' ou de 'múltipla incidência' faz com que seus efeitos não se produzam, apenas, nos limites territoriais da entidade tributante, mas se estendam a outras Unidades Federadas (fl. 169).

Da minha perspectiva, a questão, de fato, apresenta densidade constitucional e extrapola os limites subjetivos das partes.

Com efeito, a matéria concernente à antecipação do pagamento do tributo por meio de decreto estadual não é nova, tendo sido objeto de diversas decisões de ambas as Turmas desta Corte, vide o RE nº 294.543/SP-AgR, Relator o Ministro Nelson Jobim, Segunda Turma, DJ 21/9/01; o RE nº 180.224/SP-AgR, Primeira Turma, Relatora a Ministra Ellen Gracie, DJ de 14/6/02; e o RE nº 203.684/SP, Relator o Ministro Ilmar Galvão, DJ de 12/9/97.

Como não há precedente do Plenário, entendo que está a merecer um juízo definitivo desta Corte a questão de saber se a hipótese vertente é de alteração do momento da ocorrência do fato jurídico tributário - como decidiu o v. acórdão recorrido -, ou se, ao revés, a antecipação do prazo de recolhimento do ICMS integra a estrutura normativa do referido tributo.

É mister ressaltar que, tendo em vista a quantidade de causas similares em trâmite em todas as instâncias da Justiça brasileira, o reconhecimento da relevância do tema constitucional aqui deduzido possibilitará ao Plenário deste Supremo Tribunal julgar a matéria sob a égide do instituto da repercussão geral, com todos os benefícios daí decorrentes.

Diante do exposto, manifesto-me pela existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, submetendo-a à apreciação dos demais Ministros desta Corte.

Brasília, 17 de junho de 2011.

Ministro Dias Toffoli

Relator

Documento assinado digitalmente

Introdução, Constituição e Emendas Constitucionais


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O Direito, compreendido como o conjunto normativo representa a vontade política do Estado, o qual se expressa por suas normas. Assim, o estudo das fontes do Direito representa a compreensão da vontade política do Estado e sua efetivação pelos instrumentos normativos editados. Em última instância, a vontade do Estado Democrático do Direito deve coincidir e representar a vontade do Povo. Este é um dos principais fundamentos de nossa República, previsto já no primeiro artigo da Constituição Federal:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...]

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

No estudo do Direito Tributário, a análise das fontes de Direito e da correspondência entre a vontade do Estado e seus instrumentos normativos tem uma relevância especial: o sistema tributário é um mecanismo de restrição de direitos fundamentais do cidadão, especialmente do direito à propriedade. Assim, as formas desta restrição devem ser definidas e limitadas legalmente, para que se garanta o respeito estrito à vontade legítima do Povo e para que se evite abusos do Estado.

Passamos a estudar, portanto, as fontes formais do Direito Tributário. A este respeito, o art. 96 do Código Tributário Nacional apresenta, juntamente com o art. 2º, as espécies legislativas do Direito Tributário:

Art. 2º O sistema tributário nacional é regido pelo disposto na Emenda Constitucional nº 18, de 1º de dezembro de 1965, em leis complementares, em resoluções do Senado Federal e, nos limites das respectivas competências, em leis federais, nas Constituições e em leis estaduais, e em leis municipais.

Art. 96. A expressão "legislação tributária" compreende as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes.

Constituição Federal e Emendas Constitucionais

A Constituição Federal e as Emendas Constitucionais não são mencionadas no rol do Código Tributário Nacional. Assim, questiona-se: a Constituição Federal e as Emendas Constitucionais seriam fontes formais do Direito Tributário?

Parte da doutrina entende que a Constituição Federal não é fonte do Direito Tributário, não por estar ausente do rol legal, até porque algumas disposições da Constituição Federal disciplinam o Sistema Tributário Nacional (arts. 145 a 162). Elas conferem competências aos entes federativos sobre o direito de tributar (art. 150 a 152) e, com isso, determinam normas essenciais de limites e regulamentação ao Direito Tributário. Contudo, a Constituição Federal em si não institui tributos.  A norma constitucional disciplina as espécies de tributos e seus fatos geradores, mas não institui os tributos em si, o que também não faz as Emendas Constitucionais.

A Constituição Federal não deixa de ter importância no Direito Tributário, já que estabelece as bases do Sistema Tributário e de sua compreensão e tem importante eminência normativa, ainda que não seja considera fonte do Direito Tributário.

Leis Complementares


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As Normas Constitucionais não instituem tributos, mas têm o papel importante e fundamental de ditar as regras do Sistema Tributário Nacional. Junto com a Constituição Federal, as Leis Complementares também têm protagonismo para dispor sobre o Sistema Tributário, conforme as competências e limites estabelecidos na própria Constituição.

As Leis Complementares em geral se destacam por um aspecto formal: quórum mais exigente para sua aprovação. Assim, são aprovadas apenas por maioria absoluta das Casas Legislativas. Esse aspecto formal, contudo, não determina superioridade hierárquica das Leis Complementares em relação às Leis Ordinárias. Ambas as espécies normativas se situam em mesmo patamar hierárquico, e têm apenas funções diferentes: há matérias reservadas à Lei Complementar que, pela sua complexidade, as Leis Ordinárias não têm competência para regular. O inverso não se aplica, já que Leis Complementares podem ditar normas sobre matérias passíveis de regulação por Leis Ordinárias.

Em Direito Tributário, a Constituição Federal reserva determinadas funções para as Leis Complementares, de modo que ressaltamos o protagonismo dessa espécie nessa matéria. Cabem, à elas, basicamente, três tarefas, conforme disposição do art. 146 da Constituição Federal:

  • Dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre os entes federativos;
  • Regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;
  • Estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária.

Assim, ao dispor sobre conflitos de competência, as Leis Complementares têm a atribuição de definir os limites dentro dos quais podem atuar os legisladores de cada esfera da federação, na instituição dos Também podem regulamentar as normas constitucionais, oferecendo solução para casos conflituosos entre dispositivos constitucionais, como colisão de princípios e de técnicas interpretativas.

Por fim, a função de estabelecer normas gerais em matéria tributária, tem a importante missão de assegurar uma disciplina minimamente uniforme em âmbito nacional, sendo que a lei complementar nacional submete as legislações editadas por cada ente da federação. Assim, cabe à Lei Complementar definir o arquétipo possível dos diversos impostos, condicionando a legislação ordinária aos seus limites e disposições.

Em Direito Tributário, dada a diferente competência para legislar atribuída a cada ente federativo, é muito importante verificar o ente legislativo responsável por cada tributo. Contudo, as Leis Complementares, ao regularem o Sistema Tributário Nacional, têm abrangência nacional. Isto significa dizer que se aplicam a todo o território nacional, a todos os entes federativos, e não apenas à União.

Neste contexto, é possível questionar a hipótese de Lei Complementar não ditar normas gerais sobre tributos de competência dos Estados, por exemplo, já que estes entes não podem editar normas de abrangência nacional. Neste caso, o Supremo Tribunal Federal aplica o entendimento de que os Estados podem exercer sua competência legislativa suplementar, editando normas gerais para os tributos de sua competência, válidas apenas em seu território.

Para além destas funções, o art. 146-A da Constituição Federaltambém prevê às Leis Complementares a função de estabelecer critérios especiais de tributação para prevenir desequilíbrios de concorrência.

É interessante notar que o próprio Código Tributário Nacional regula normas gerais de Direito Tributário e, portanto, de competência reservada às Leis Complementares, mas foi elaborado e votado como Lei Ordinária, ainda sob a vigência da Constituição Federal de 1946. Tem-se que, a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, o Código Tributário Nacional foi recepcionado com status de Lei Complementar, e não há discussões sobre sua validade formal.

Leis Ordinárias, Medidas Provisórias, Resoluções e Decretos Legislativos


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Leis Ordinárias

As Leis Ordinárias são a fonte por excelência do Direito Tributário. A esta espécie normativa cabe a instituição e majoração de tributos, por força do art. 150, I da Constituição Federal:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

Esta disposição institui o princípio da estrita legalidade tributária: apenas por lei é possível instituir ou majorar tributos de qualquer espécie, qualquer que seja o ente federativo competente. Além desta atribuição fundamental, às Leis Ordinárias também é dado regular sobre todas as matérias não reservadas à disciplina das Leis Complementares. Assim, as Leis Ordinárias têm competência residual.

O art. 97 do Código Tributário Nacional reforça o princípio da estrita legalidade, dispondo sobre matérias que só podem ser disciplinadas por lei em sentido estrito, elucidando disposições da Constituição Federal, como o entendimento do que se considera aumento de tributo:

Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:

I - a instituição de tributos, ou a sua extinção;

II - a majoração de tributos, ou sua redução, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65;

III - a definição do fato gerador da obrigação tributária principal, ressalvado o disposto no inciso I do §3º do artigo 52, e do seu sujeito passivo; (OBSERVAÇÃO: os arts.52 a 62 do CTN foram revogados)

IV - a fixação de alíquota do tributo e da sua base de cálculo, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65;

V - a cominação de penalidades para as ações ou omissões contrárias a seus dispositivos, ou para outras infrações nela definidas;

VI - as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou de dispensa ou redução de penalidades.

§1º Equipara-se à majoração do tributo a modificação da sua base de cálculo, que importe em torná-lo mais oneroso.

§2º Não constitui majoração de tributo, para os fins do disposto no inciso II deste artigo, a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo.

Assim, apesar destas limitações, ainda se assegura ao Poder Executivo a possibilidade de intervenção econômica, pela alteração de alíquotas ou bases de cálculo de impostos, atendidos os limites das alíquotas fixados por resoluções do Senado Federal.

Medida Provisória

As Medidas Provisórias são uma inovação da Constituição Federal, disciplinadas em seu art. 62. Desde sua instituição, foi reconhecido o status de lei ordinária às Medidas Provisórias, que têm vigência imediata desde sua edição pelo Chefe do Poder Executivo, devendo ser aprovadas pelo Congresso Nacional no prazo máximo de 120 dias, sob pena de perda da eficácia.

A respeito de matéria tributária, a Emenda Constitucional nº 32/2002 apaziguou as discussões sobre a possibilidade de que as Medidas Provisórias ditem normas nesse aspecto, com a introdução do §2º ao art. 62 da Constituição Federal:

Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. [...]

§2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada.

Com isto, entende-se que Medidas Provisórias podem instituir ou majorar impostos, desde que atendam ao princípio da anterioridade tributária.

Resoluções e Decretos Legislativos

As Resoluções são normas editadas pelo Congresso Nacional ou pelas respectivas casas a respeito de suas competências exclusivas e privativas, definidas nos arts. 49, 50 e 52 da Constituição Federal. Uma vez editadas não se submetem a veto ou sanção da Presidência da República, e por isso também são chamadas de leis sem sanção.

Em matéria tributária, a principal atribuição se dá às Resoluções do Senado Federal que fixam alíquotas máximas, mínimas ou interestaduais de tributos estaduais, dado que o Senado é justamente a Casa de Representação dos Estados-membros. A própria Constituição Federal prevê esta atribuição acerca de determinados tributos:

  • IPVA – art. 155, §6º, I da Constituição Federal define que o Senado Federal fixará, obrigatoriamente, as alíquotas mínimas;
  • ITCMD – art. 155, §1º, IV da Constituição Federal determina que o Senado fixará, obrigatoriamente, as alíquotas máximas;
  • Art. 155, §2º, IV da Constituição Federal - determina que o Senado fixará, obrigatoriamente, alíquotas aplicáveis às operações interestaduais e de exportação.

Por sua vez, os Decretos Legislativos são as normas editadas pelo Congresso Nacional conforme as competências determinadas pelo art. 49 da Constituição Federal. Apesar de não haver disposição expressa sobre a regulamentação de matéria tributária, esta espécie normativa é útil para dispor sobre tratados internacionais que versem sobre o assunto.

Quais são as fontes materiais do direito tributário?

As fontes materiais são os acontecimentos sobre os quais haverá a incidência tributária, ou seja, seus são fatos geradores. Ex: Quando da fabricação dos produtos industrializados, nascerá a obrigação de pagar o imposto referente a fabricação de tais produtos (imposto sobre produto industrializado - IPI).

O que disciplina o direito tributário?

Direito Tributário é a área do direito responsável por determinar e fiscalizar a arrecadação de tributos, como taxas e impostos. Também chamado de Direito Fiscal, o segmento tem, como principal papel, o combate de possíveis abusos por parte do Fisco e o controle de pagamento dos contribuintes.

Quais são as exceções ao princípio da legalidade no direito tributário?

Exceções ao princípio da legalidade tributária Imposto de Exportação (IE) Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio, Seguro ou Relativas a Títulos, ou Valores Mobiliários (IOF).

Como fonte do Direito Tributário os decretos do Executivo Federal são?

As fontes principais do Direito Tributário são as leis, os tratados e convenções internacionais e os decretos (CTN, art. 96), tendo em vista que as demais normas são elencadas no art. 100 do CTN, sob título de Normas Complementares.